Capítulo VI

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Não ria de mim, Scarlett! - Censuro-a, tentando dar um fim a suas gargalhadas, enquanto puxo-a pela rua até onde deixamos o carro. Ela me ignora totalmente.

Estou mortificada. Enquanto não chegar a casa, onde estarei segura dentro de quatro paredes, e onde ninguém possa ver meu estado de higiene, eu não vou sossegar. Não consigo parar de pensar se deveria voltar lá e pagar a força pelo que fiz, não importando o que o cara diga. Eu estou muito tentada a ideia, mas quando penso que estarei à vista dos olhares de todas aquelas pessoas novamente, essa ideia me parece a pior de todas.

Apresso mais o passo.

Estou indo para casa tomar um banho quente, enquanto o rapaz do restaurante está recolhendo cacos de vidro do chão, e mais tarde será demitido... Muito educado de sua parte, Madeline. Minha consciência estala cada vez mais alto para mim, me censurando severamente. Isso é pior do que a vergonha. Sinto-me mal por ele. Muito mal. Envergonhada, não por ter caído na frente de todo mundo e quebrado metade da vidraçaria do restaurante, mas, sim, por aceitar o que o idiota do garçom queria. Ele não entende que vai se prejudicar? Que ele irá perder o emprego, e não eu? O que ele tem na cabeça? Sorvete ao invés de um cérebro?

Por todo lugar minha pele está grudenta. Há chocolate, morango, baunilha, pistache, limão, flocos... Só falta uma cereja na minha cabeça para completar todo o meu estado "doce".

─ Você devia ter visto sua cara. - Scarlett fala após sua crise de risos.

Você devia ter me ajudado. - Rebato.

─ O cara da bandeja fez isso por mim.

O cara da bandeja vai estar encrencado por mim! - Eu soo culpada.

─ Foi ele quem não quis que você pagasse.

─ Eu sei. E isso é errado, Scarlett. - Ah, por favor. Não me diga que minha irmã está do lado dele.

─ Quantas vezes na vida isso pode acontecer? Ele te livrou de pagar tudo aquilo. Apenas finja que não aconteceu. Na verdade ele foi um príncipe fazendo isso. - Um príncipe? É. Ela está do lado do inimigo.

─ Deus, que tipo de educação eu te dei? - Murmuro para ninguém em especial.

Não voltarei mais lá para evitar mais remorso e culpa, além da vergonha. Se ele quer assumir sozinho a culpa por tudo, bom, o problema agora é dele. Eu tentei consertar meu erro. Ele que se fez de difícil.

Como se tudo não pudesse ficar melhor, um grande estrondo vem do céu, seguido por um raio. Olho para cima, amaldiçoando a mãe natureza por querer me dar um banho - não que eu não precise de um. E Ela, como se pudesse estucar minhas preces, faz com que um pé d'água, com gotas do tamanho das minhas mãos caiam sobre nós.

─ Eu amo a sorte que tenho... - Balbucio.

Começo a correr pelas ruas com Scarlett, tomando cuidado para não cair de novo. Ao contrário de mim, ela está se divertindo; pula nas poças de água acumuladas pelo caminho e solta algumas gargalhadas.

Alguns instantes depois chegamos ao carro. Mas já estamos encharcadas demais para tentar se proteger da chuva. Procuro minhas chaves na bolsa com mais calma do que devia. Destranco o carro e Sky entra no segundo seguinte. Eu permaneço mais alguns instantes do lado de fora, e levanto o rosto para o céu, respirando fundo o cheiro de terra molhada que começa a banhar o ar. Não sei por quanto tempo fico assim, mas a sensação é muito boa.

Jogo-me no banco do motorista, depois que Scarlett bate no vidro, me despertando do devaneio. Ligo os para-brisas, que quase não dão conta do recado, e sigo em direção a casa.

Entre Lobos & Flores - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora