Andar de cima

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O barulho do grilo cantando lá fora, não ajudava muito meus olhos fecharem. De novo. Ultimamente eu estava dormindo pior que gente com insônia.
Bufei baixinho, olhando Arya com o travesseiro na cara, já dormindo, parecia não se incomodar com barulhos de brilhos irritantes.
Fitei o teto branco da sala, e o firmei na lâmpada apagada, passando a examinar a mesma sem interesse. O relógio marcava uma e três da manhã. Todo mundo dormia, se eu não tentasse também, na escola eu seria uma zumbi com olheiras. E quarta feira tinha o santo baile.
Me virei para o lado, suspirando, e Fechei os olhos, contrariada. Eu já não podia esperar ajuda de Kate, ela era traidora. Agora fazia sentido... A Kate vivia me falando que Alyce era do bem, Taylor era do mau. Ela vivia falando para eu confiar em Alyce. E quase morri por isso. Mas eu não me toquei. Droga.
Cocei os olhos, já começando a pegar no sono. Eu já estava quase dormindo, com um barulho me acordou de prontidão. Abri os olhos, olhando para os lados. Tudo continuava do mesmo lugar. Do mesmo jeito.
Ia começar a tentar dormir de novo, quando dessa vez, ouvi claramente. Alguém tocava a campanhia da casa, o portão principal, lá do jardim. Franzi a testa. Quem estava ali aquela hora da madrugada?
Levantei, tropeçando na coberta jogada de Arya, indo olhar pelo olho mágico. Mas... O olho mágico mostrava o portão vazio. Não tinha ninguém ali.
Emiti um protesto de surpresa baixinho.
- ...Sam? O que se ta fazendo ai, maluca? Vai dormir! - Ouvi a voz entrecortada pelo sono de Arya. Me virei para ela levemente, ainda com os olhos pregados no olho mágico.
- É que... A campanhia lá de fora tinha tocado... Eu ouvi. Você não? - Ergui uma sobrancelha, me virando para ela.
- Não, demente - Disse, com mau humor, querendo dormir, puxando a coberta para cima do rosto. Parei, atônita. Naquele dia tinha sido a mesma coisa... O telefone tocava, agora a campanhia. Mas em nenhum lugar, tinha pessoas ali. O que seria depois, algum maníaco atravessando a janela e me matando com um machado?
E é engraçado... Só eu ouço isso. Arya continua a dormir, e tem sono leve, acorda por qualquer coisa, mas não ouviu isso.
Voltei lentamente para o sofá, não resistindo de me colocar de joelhos em cima do mesmo e afastar levemente a cortina a janela. Nada. A rua estava vazia, completamente.
Remexi os dedos nervosamente, voltando a me deitar, mais inquieta que antes.
***
- Ela descobriu, senhora. Me desculpe. - A fantasma no canto da sala se mantinha de cabeça baixa, olhando os pés. Alyce trincou os dentes, apertando os dedos em volta do cabo de uma faca.... Suja de sangue.
- SUA IMBECIL! - Ela chiou, com ódio, fazendo Kate se encolher um pouco - EU DEVERIA SABER. VOCÊ NÃO TRABALHARIA DIREITO, JÁ FOI AMIGA DELA UMA VEZ. - A mesma continuou, cerrando os punhos.
- Mas senhora, ela não descobriu sozinha, teve ajuda! - Ergueu um poucos os olhos, dizendo com um fio de voz. Alyce parou um pouco, sua respiração pesada pela irritação se fazia ouvir pela sala.
- Quem ajudou? - Perguntou, virando minimamente a cabeça para a entidade.
- Uma garota. Da escola. Amiga dos fantasmas bons e ruins. Avisou. Disse que eu era traidora. - Respondeu.
- E porque VOCÊ NÃO DESMENTIU? - A mulher berrou, dando a impressão de que os vidros das janelas iriam se partir ao meio.
- Eu... Eu não poderia, a garota tem amigos do outro lado... Tem amigos, ajudam ela. O Pianista é amigo dela, ele... Ele é o mais...
- ELE NÃO É NADA ALÉM DE UMA CRIANÇA MISERÁVEL QUE EU DEVIA TER MANTIDO VIVO. - Rosnou, jogando a faca no chão, que emitiu um barulho metálico ao tocar o solo. - SERIA CASTIGO MELHOR. - Completando, levantou da confortável poltrona que sentava, grudando as mãos em uma mesa de madeira, quebrando as unhas ao arranhar a mesma de ódio. Kate abaixou a cabeça de novo. 
Na mesa, inúmeras fotos de um menininho que brincava com caminhões de brinquedo, teclas e instrumentos para bebês, estavam distribuídas livremente. Júnior. Os mesmos olhos cor de mármore, um tanto traquinas, sorria e olhava para a câmera as vezes. Na maioria das outras vezes, olhava para um ponto mais além, com uma expressão mais séria, como se quisesse levantar e correr.
Kate sabia, ele era o fantasma mais poderoso daquela escola. Não importava que fosse só uma criança, tinha raiva suficiente acumulada.
Alyce negava. Aquele fantasma era o único que conseguia fazer os olhos daquela mulher mudar, de cruéis e sedentos, para relutantes.
- Como chama essa garota? - A mulher perguntou, trincando os dentes e olhando para as fotos. Algumas marcadas com círculos vermelhos. Outras, o bebê estava com mais alguém do seu lado, mas o rosto estava riscado.
- Agatha, senhora. - Kate respondeu.
- Ótimo. Agora vá embora. E só volte dessa vez, quando pegar essa garota. - Mandou.
- Mas minhas senhora, Agatha é muito...
- É UMA HUMANA! E VOCÊ É UMA FANTASMA! NÃO SABE DOMAR UM HUMANO?! - Berrou, se virando com violência. A outra quase sumiu.
- Eu... Não consigo medir forças com Júnior, minha senhora. - Respondeu, a voz quase sumindo. Alyce gritou, pegando a faca do chão e cravando na mesa, em cima de uma foto do rosto do bebê, furiosa, fazendo Kate sumir completamente, assutada.
Ali ao lado, a irmã de Rachel olhava a tudo, presa dos pés a cabeça em uma cadeira, horrorizada, não se atrevendo a grunhir contra a fita que prendia sua boca.
****
Era de manhã. Samantha só conseguiu dormir depois das duas da manhã, o que não era favorável para alguém que tinha que estudar depois e ir ainda de manhã ajudar a diretora que precisava.
Arya acordou com humor melhor, e nem lembrava do que tinha acontecido no meio da madrugada, tão esquecida que ela era. Os pais da garota chegariam de noite, e ela teria que ir para a casa deles, e não parecia tão feliz com isso. Samantha também não, queria que a garota continuasse ali.
Ela se levantou, se arrumando e logo descendo para a sala, se despedindo da mãe de Lolla que estava ali, vagamente.
Saiu. Finalmente fazia algum sol naquela cidade.
¶Samantha¶

Franzi a testa para as decorações do baile, que já se faziam visíveis fora da escola, Imagina dentro.
Subi as escada com pequenos saltinhos, entrando na escola.

Tem alguém aí? - Volume 2Onde histórias criam vida. Descubra agora