Hermíone, rainha de Epiro, gritava com o grupo de atores que estava a sua frente.
– Sem música, sem música.
Ela estava deitada em um leito, e de lá observava o casal de atores que representava o romance de Cupido com a bela Psique. Ao fundo, um grupo de músicos esperava para que a rainha permitisse sua participação.
Hermíone olhava fixamente para o casal de atores, mas não a via. Ela via a si mesma com Tértulo, num mundo onde o destino havia unido os dois para sempre. Hermíone saboreava "Tértulo" quando a peça terminou e os atores e músicos se uniram num coro uníssono. "Odeio música" Hermíone pensava. "Odeio música, poesia, e todas as artes que minha mãe amava. " Nisto suas escravas, e entre elas, Gláucia, a escrava "educada para servir na corte de Epiro "entravam pela porta.
– Podem se retirar – Gláucia dizia para o grupo de artistas – a princesa precisa se preparar para as cerimônias desta tarde –e, enquanto os músicos e atores saiam ela se dirigia num tom reverente a rainha – Majestade, vejo que os deuses ordenam suas bênçãos sobre este dia.
– Não é verdade, Gláucia. Ainda não me sinto bem. Foi apenas o grupo de atores que me distraiu.
– Penso que não foi apenas isto majestade. Este grupo de atores não é suficiente belo para atrair sua admiração. Eles cantam mal, e estão a ponto de perderem a liderança da procissão de Dionísio.
– É por isso que gosto deles. Não gosto de representações com músicas. Gosto apenas com falas, assim as representações são mais realistas.
– Majestade, não posso entende-la, já vivemos num mundo onde falamos sem música, isto é comum e sem atrativos. Mas, nas representações, as músicas e poesias nos elevam a um novo mundo, o mundo dos deuses.
Hermíone recusou-se a responder.
– Saia, Gláucia. Quero apenas Trífone preparando meu banho.
– Como desejar, Majestade.
Quando a rainha ficou apenas com a companhia de Trífone explicou.
– Não quero tomar banho, Trífone. Não vou a este sacrifício.
– Majestade, precisa ir. O rei ordenou que todas insistissem com você, precisa ir ao sacrifício da tarde. Hoje é um dia festivo. E, o povo vai valorizar muito se você for.
– Nunca vou ser a rainha que o povo de Epiro deseja. – Hermíone falava com voz de choro – Odeio esta pressão. Não sou uma piedosa, nunca vou ser.
Em sua mente a rainha gritava frases que não tinha coragem de dizer com a boca: "Odeio os deuses, odeio todos eles. Nenhum deles se lembrou dos meus pedidos. Juro que nunca mais peço nada a nenhum deles, nenhum pequeno pedido. Dependo só de mim mesma. "
Hermíone fitou os olhos de Trífone. Sem palavras a escrava dizia que todo o seu escândalo era um exagero. Mas, Hermíone não conseguia parar de chorar. A simples ideia de sacrifícios trazia muitas memórias para Hermíone. Não conseguia olhar para o sacrifício e lembrar o quando ela havia esperado dos deuses, e o quando eles haviam falhado com ela. Não conseguia olhar para Neoptoleno, sem esquecer que ele havia conspirado com sua mãe. No fundo, sabia que Neoptoleno não era tão ruim como ela imaginou. E que, se casou com ela sem saber sobre como sua a mãe a havia lhe pressionado. Ainda assim, ela não conseguia perdoa-lo. E, não queria estar perto dele.
– Odeio os deuses – ela dizia num sussurro que surgia em meio às lágrimas.
– Rainha Hermíone, não fale assim com os deuses – eles ainda podem ouvir você e realizar o que você deseja.
VOCÊ ESTÁ LENDO
A Herdeira de Tróia: a dimensão oculta do poder
Fantasia"... 4 homens, 4 mulheres, 4 caminhos para o poder: força, astúcia, sedução ..." Tróia está em ruínas e Páris morto, mas Helena encontra forças e relembra o que aprendeu com o amor. Ao voltar para casa ela enfrentará o rancor de sua filha Hermío...