Acerto de Contas

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 O Hospital Federal de Bonsucesso era uma referência em traumatologia e cirurgia, no estado do Rio de Janeiro. Apesar do aspecto decrépito do seu exterior, contava com um ótimo centro cirúrgico, onde mais de mil pacientes eram operados todos os meses. Ficava na Avenida Brasil, há menos de dois quilômetros do Instituto Evandro Chagas, onde Maximiliano fora internado. Nora foi levada pra lá, devido aos múltiplos ferimentos que apresentava. Parecia que havia sido atropelada por um trator, mas aquilo tudo foi resultado de sua briga com o garoto. Lembrava apenas de alguns flashes do que havia acontecido. A luta, a fuga frenética pelo telhado. Agora estava numa cama, acorrentada pelas mãos e pés. O muleque acabou comigo. Sentia uma dor torácica alucinante ao tentar respirar fundo. A parte de trás da cabeça latejava como se tivesse recebido uma martelada forte. Assim que acordou, verificou se os seus dentes estavam no lugar. Há anos que não tinha arcada dentária. Todos os seus dentes foram substituídos por recipientes, ependorfes, disfarçados que guardavam diversos compostos que usava ao longo de suas missões. A maioria era veneno ou drogas que aumentavam sua capacidade física. Ainda sobraram alguns estoques, pensou, feliz, por não terem descoberto o seu segredo.

Sempre que algum funcionário entrava, seja médico ou enfermeiro, ela fingia estar desacordada. Era o único jeito de encontrar uma brecha para sair daquele lugar. Precisava recuperar as forças. Pelos comentários dos residentes, descobriu que passara por uma cirurgia de abdômen e também por uma drenagem do hematoma cerebral. O tórax doía, provavelmente, por conta das fraturas de esterno e costelas. Teve também um pequeno derrame pleural, causado por uma perfuração do pulmão. Enquanto estivesse desacordada, ninguém a transferiria para uma prisão, de onde seria bem mais difícil escapar. Esperaria o seu corpo se recuperar, talvez por mais uns 3 dias e usaria seu último coquetel de drogas pra fugir dali. Contou, mentalmente, pelos ruídos, que havia cinco agentes vigiando-a, dois na porta e três dentro do quarto. Quase não podia abrir os olhos por conta disso. Mas sabia que poderia se livrar das algemas facilmente. Só tinha que arrumar um jeito de sair dali sem acionar toda a polícia.

Percebeu, após 24 horas, que o número de homens foi reduzido a três, logo que os médicos constataram o seu coma. Ela era muito bem treinada e sabia simular um Glasgow 3, se quisesse. Aquilo tornou o seu plano um pouco mais viável. Apenas um agente na porta e dois dentro do quarto. Eu consigo lidar com isso. Na madrugada do terceiro dia de internação, ela se viu sozinha no quarto. Parecia que os agentes tinham saído por alguns minutos. Estranho. Começou o processo para se livrar da primeira algema. Usou a agulha de aço do escalpe em seu braço como grampo. Parecia que já tinha feito aquilo milhares de vezes na vida. Menos de 30 segundos depois, a primeira algema já estava aberta. As outras seriam mais rápidas. Contudo, o som da maçaneta da porta se abrindo, fez com que a espiã tomasse a sua posição inicial. Não dava pra voltar atrás. Escutou os passos de uma mulher se aproximando. Aqueles saltos eram caros e produziam um som único no chão de vinil. Alguma enfermeira vinha pra conferir a medicação. Infelizmente teria de matá-la.

– Eu sei que está acordada – uma voz feminina afirmou em inglês – Não precisa fingir comigo.

Nora abriu os olhos para ver a linda mulher de pele morena e cabelos lisos ao lado cama. Ela fechou as algemas frouxas em um movimento rápido. A russa não conseguiu impedir a tempo.

– Eu tinha certeza de que você se livraria disso rapidamente. Você é boa agente Zakarov. Eu só não entendo como não conseguiu matar um garoto em coma.

– Ele não estava em coma – respondeu na mesma língua com um sotaque carregado – Estava acordado e muito mais forte que o normal.

– E era por isso que eu havia te mandado. – aproximou-se da agente e começou a fazer carinho em seus cabelos curtos e loiros – te dei a chance de sumir, mesmo após se expor. Agora está presa e entregará a organização inteira.

– Eu nunca entregaria a Organização.

– Eu também acho que não, mas você sabe as regras. – franziu a testa, num ar mais sério ainda – Como você quer fazer isso?

– Eu ainda posso morrer. Desapareço da face da terra e vocês nunca mais vão me ver. – algumas lágrimas caiam de seus olhos.

Lana meneou a cabeça positivamente, pensativa, e aplicou um microadesivo atrás da orelha de Nora, sem que ela percebesse. O veneno liberado era poderoso e o artefato era totalmente absorvido pela pele. A espiã ainda convulsionava quando a agente da Interpol saiu do quarto. Tinha de voltar para a festinha que estava rolando com os três policiais e mais duas garotas de programa num quarto da ala em reforma. Não gostava de ter de usar o seu corpo em missões, mas, desta vez, foi necessário pra conseguir tirar aqueles homens do quarto. E até que não está ruim, pensou ao regressar da sua rápida "saída ao banheiro". 

 

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QUARENTENA - Breve Ensaio de uma Noite InterminávelOnde histórias criam vida. Descubra agora