Uma Nova Esperança

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A situação do paciente era cada vez pior. Carlos já havia autorizado a equipe da Nefrologia a realizar a hemodiálise, mas parecia que nada funcionaria. O fígado estava praticamente morto e precisava ser transplantado o quanto antes se quisessem ter uma chance de salvar o rapaz. O neurocirurgião de plantão se recusou a drenar o hematoma por causa do risco de sangramento. Após muita barganha e algumas bolsas de plasma fresco, o jovem foi finalmente submetido ao esvaziamento do hematoma que comprimia seu cérebro. Agora só faltava um fígado novo para que a luta pela vida ficasse um pouco mais equilibrada.

Já eram quase 18 horas quando recebeu a informação de que o pai do garoto estava ali pra visitá-lo. Uma notícia inesperada mas que trouxe um pouco de esperança ao professor. Se ele fosse compatível, poderia doar parte de seu fígado para o filho. Caminhou rapidamente da sua sala para o setor de isolamento, passando pelas enfermarias e laboratórios. Queria abordar o homem e colher os exames preparatórios o quanto antes. Se tudo desse certo, seria possível realizar uma cirurgia no dia seguinte. Chegou à saleta do isolamento, que estava com as luzes apagadas, mas conseguia ver a silhueta observando o paciente pelo vidro.

— Olá — Disse enquanto acendia a luz. Chamou a atenção do homem vestido com farda azul da polícia estadual. Pelas listras, deduziu ser um terceiro sargento — Sou o Doutor Carlos, chefe da infectologia aqui do Evandro Chagas. Estou coordenando os cuidados com o seu filho. — Estendeu a mão para cumprimentá-lo.

— Prazer — retribuiu o cumprimento — Álvaro Rodrigues. Sou o pai do Maximiliano. Ele está muito mal né? — seu rosto era de medo e sofrimento.

— Maximiliano — Levantou as sobrancelhas em sinal perplexidade. Recebeu o nome do moribundo, até então sem identidade, com certa surpresa. Tinha imaginado algum nome mais jovial, como Pedro ou Rafael — Sim. O Maximiliano está muito mal. Drenamos o sangue que comprimia o cérebro e realizamos uma hemodiálise para tentar diminuir a sobrecarga renal, que o fígado, ou falta de um, vem causando. Mas o que parece é que sem um fígado novo, nossos esforços serão em vão.

— Eu posso doar? — Álvaro perguntou com esperança nos olhos — Isso vai salvar o meu filho?

— Eu não posso te prometer nada, mas se existe uma chance do seu filho sobreviver, e ela envolve um transplante. Teríamos que fazer os exames e atestar a compatibilidade dos seus órgãos. Geralmente pais e filhos são compatíveis. Temos que definir se o senhor tem condições de passar por uma cirurgia desse porte.

— Tudo bem — assentiu com a cabeça — eu quero dar isso pro meu filho. Quero tentar tudo o que for possível.

— Ótimo. — o professor sorriu — Podemos começar os exames imediatamente.

Depois de passar a noite em claro, colhendo exames e respondendo a longos questionários, Álvaro finalmente se sentou ao lado do filho, quando os primeiros raios de sol começavam a bater na janela do quarto isolado. O risco biológico já havia sido descartado, mas o professor decidiu manter Max naquele quarto, pois, segundo ele, até mesmo a transferência de leitos poderia representar um risco para a sua frágil vida. O policial segurava a mão do jovem. Sua face estava inchada e os olhos vermelhos de tanto chorar.

— Eu queria ter te ligado. Pra te pedir desculpas e tentar concertar as coisas entre nós. Eu sei que deveria ter te apoiado quando passou pro vestibular. Foi um grande feito. O primeiro Rodrigues a fazer uma faculdade. Mas eu só conseguia enxergar uma outra pessoa me abandonando, sabe? Eu tô tentando me ajeitar. Parei de beber. Larguei as drogas. Conheci até uma moça na Reunião do AA. — sorriu levemente — ela tem me ajudado. Nós temos nos ajudado né. Ela tem uma filhinha de 6 anos. Você ia adorar a Jéssica. Sei que gosta de crianças. Eu queria muito que você me visse agora. Que você voltasse pra minha vida. — Soluçou com lágrimas caindo pelo rosto — Me desculpa por tudo meu filho. Desculpa o teu pai idiota. Eu preciso que você volte. Preciso que sobreviva e possa me perdoar — O choro forte interrompeu o monólogo. Álvaro não tinha mais condições de falar.

O sargento apenas apertou a mão do filho, tentando transmitir o máximo de sentimento naquele gesto. Se pudesse trocar de lugar com ele, certamento o faria. Para a sua surpresa, após alguns segundos, a mão do rapaz pareceu retribuir o gesto. Apertou de volta com toda a força que tinha. Quase quebrou a mão de Álvaro. Que só teve tempo de se livrar num solavanco. Sua respiração ficou mais rápida com o susto. O caos se instaurou naquele quarto. Os monitores estavam apitando loucamente. Será que eu fiz alguma coisa errada? Max começou a convulsionar.

A equipe médica chegou quase imediatamente. Álvaro chorava no canto do quarto, como um bebê.

— Calma — O professor se aproximou do homem em prantos — foi só uma convulsão. Já aconteceu outras vezes. Quer dizer que o cérebro ainda funciona.

— Ele apertou a minha mão — falou desesperadamente — apertou a minha mão.

— Deve ter sido um espasmo muscular — Carlos respondeu — ele está em coma profundo. Os exames saíram e o senhor é compatível. Precisamos te preparar pra cirurgia.

— Ele apertou minha mão ... Ele apertou minha mão — o homem sussurrava enquanto era levado para o seu próprio quarto.

 Ele apertou minha mão — o homem sussurrava enquanto era levado para o seu próprio quarto

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QUARENTENA - Breve Ensaio de uma Noite InterminávelOnde histórias criam vida. Descubra agora