Camila demorou para se recuperar de todos aqueles choques. Quando finalmente ficou cara a cara com Max, o mundo resolveu desmoronar. Era difícil entender o que estava acontecendo ali. De repente as pessoas começaram a atacar umas as outras e uma explosão fez tudo e todos irem pelos ares. Após o estrondo, viu uma perna humana, ou parte dela, no capo do carro. Estava flamejante, como se alguém tivesse colocado álcool e tacado fogo. Seu coração apertou na mesma hora. Aquilo era muito diferente das partes mortas que vira nas aulas de anatomia. Era real. Aquela perna foi de alguém que estava vivo há poucos segundos.
Alguma alma piedosa apagou o fogo e retirou o membro da sua linha de visão. Ela ficou agradecida por isso, mas ainda não conseguia se mexer. O cenário a sua frente era mais horrível que qualquer um que a sua mente pudesse criar. Tal como a pintura que viu de Londres queimando no século XVII, a Ponte brilhava. A fumaça começava a ficar densa e não dava pra enxergar com precisão além de alguns poucos metros. Não conseguia encontrar Max. Será que ele está bem? Pensou, com o coração mais apertado ainda. Aliviou-se ao se lembrar de sua performance contra as criaturas bizarras. Ele realmente sabia lutar e era muito forte. Mais forte que o normal. Com certeza teria sobrevivido aquela explosão. Mas e se ele estiver ferido? Começava a duvidar dos seus próprios pensamentos. As mãos começaram a se mexer e ela já podia sentir o calor que irradiava do lado de fora. Ouviu um estampido, que parecia um tiro, bem perto de onde estavam. Lembrou do rapaz no banco de trás e se virou para falar com ele:
— Jesus — fez uma expressão de espanto quando não viu o colega de faculdade.
— oi — uma voz abafada respondeu e ela viu que ele estava abaixado do espaço entre o banco da frente e o de trás.
— Sai daí — puxou-o pela camiseta — o Max está lá fora.
— Eu sei — esbugalhou os olhos com medo — e ele parecia a porra de um super herói.
— Precisamos ver se ele está bem.— mais dois tiros puderam ser ouvidos.
— Você tá maluca? — fez uma expressão de incredulidade, franzindo a testa — tem zumbis... lá fora — gritou a primeira parte e sussurrou a segunda ao perceber que poderia atrair atenção indesejada.
— Eu preciso ir lá — Camila respondeu meneando a cabeça — preciso que venha comigo, senão eu não consigo.
— Eu não posso — soltou fracamente, quase inaudível.
— o que? — A menina não havia realmente entendido o que havia saído da boca do rapaz.
— Eu me mijei — confessou alto, mas fechou os olhos de vergonha, arrependido por ter gritado — eu estava apertado há um tempão, então acabou escapando na hora da explosão.
— Jesus — a menina fez força para não rir e se sentiu mal por ter tido vontade naquele momento inoportuno — Você acha mesmo que isso é mais importante que a vida do Max?
Antes que ele pudesse responder, Camila já saía do carro. Viu Max sendo trazido, carregado pelo homem que dirigia o carro. Ele estava todo sujo de sangue. A garota paralisou no meio do caminho. Não pode ser. Um arrepio gelou a sua espinha. Ele estava morto? Não era possível. Ele é muito forte. O homem passou direto por ela, com pressa, como se a garota não estivesse ali. Pôde ver o corpo mole, a pele azulada e os olhos fechados de Max. Não... Não... Virou-se e viu o homem ajeitar o rapaz no chão, ao lado do carro.
— Jesus — ouviu-o gritar pro garoto que ainda estava sentado no banco de trás — ajuda ele. O Coração tá batendo fraquinho, mas ele não tá respirando.
O amigo saiu do carro imediatamente e encostou o ouvido no peito de Max. Camila queria ajudar, mas não conseguia se mover.
— Tá com o pulmão colapsado — arregalou os olhos — me dá uma faca, qualquer coisa que fure.
O homem entrou no carro e entregou algo para Jesus. Uma espécie de canivete. O jovem ficou segurando por alguns segundos, como que revisando o que faria. Levantou a blusa de Max e expôs seu tórax. Mediu o espaço correto e perfurou a costela do amigo. Pode-se ouvir um barulho de ar saindo. No mesmo instante, ele voltou fazer movimentos de respiração. Camila suspirou, aliviada, enquanto jesus improvisava um curativo com um adesivo automotivo e um cartão de crédito. Agora tudo ficaria bem?
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QUARENTENA - Breve Ensaio de uma Noite Interminável
Science FictionDo outro lado do mundo, uma doença que transforma seres humanos em canibais ferozes percorre um sangrento caminho ao encontro do jovem Maximiliano, um brilhante estudante de medicina, que tenta sobreviver no limite da lei. Seria ele capaz de conter...