VI

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Quando cheguei à escola na manhã da sexta-feira ele me esperava no portão e me abraçou desajeitado, demonstrando que queria muito mais do que encontros furtivos em cinemas após a aula. A diferença de um ano entre nós era indiferente e apesar de franzino, ele tinha músculos firmes e era cheio de atitude. Nos beijamos e quando consegui abrir os olhos, reparei que muitas pessoas ao redor nos fitavam entorpecidos. A diretora Ana passou nos convidando a deixar o namoro para outra hora ou terminaríamos atrasados para o primeiro horário e mesmo estando envergonhada, não senti tom de reprovação. Respirei aliviada ao mesmo tempo em que ele agarrou a minha mão e subimos as escadas. Já perto de entrarmos na sala, senti aquele perfume doce e exagerado que anunciava que a Sabrina estava por perto e quando olhei para trás, ela já estava se aproximando pondo a mão sobre o ombro do Caíque.

- Ora, ora... Mas olha só quem está de namoradinho!

Ele não se intimidou com a ironia dela.

- Meu nome é Caíque e você deve ser a Sabrina, a tal que estava aprontando no estacionamento qualquer dia desses...

- Você tem a língua muito afiada, cunhadinho! Olha... Até que você não é de se jogar fora. Não sei o que pode ter visto nessa sem-graça da minha irmãzinha, mas é um prazer em te conhecer...

- Não preciso te conhecer para perceber que alguém como você não tem a capacidade de enxergar a beleza de outra pessoa além desses rabiscos coloridos e mal pintados que aparecem diante do seu espelho.

- Pelo seu tom já entendi a defensiva, mas nem vou gastar meus neurônios para entender esse dialeto de nerd maluco que você está desenrolando.

E eu, me sentindo fortalecida pela presença dele, interferi:

- E nem poderia, não é Sabrina? Isso te obrigaria a pensar e você não está acostumada a fazer esse tipo de esforço.

Ele apertou minha mão me dando ainda mais força.

- Idiotas. Os dois. Ainda bem que não sou obrigada a suportar nenhum de vocês na minha vida. Logo eu saio de casa e nem para a sua cara eu vou ter que olhar mais.

- Vai dar o golpe da barriga em alguém, Sabrina? Não, porque como você não trabalha, essa seria a única forma de você ganhar sua independência. O que na verdade é um grande engano, mas prefiro deixar você se entender com a sua estupidez. Até já estou com pena do coitado do Juarez.

- Está se sentindo porreta só porque tem ganhado uns trocados aparecendo em meia dúzia de folhetins e tem um namoradinho para te suportar... Afff. Daqui a pouco isso acaba e você volta a ser a Brisa boba e solitária de sempre.

- Já chega!!!

A diretora Ana chegou bem no momento crucial do nosso primeiro embate real após anos de humilhações.

- Sabrina, que eu saiba você já não é mais aluna dessa escola.

- Pronto. Agora que chegou a protetora da coitadinha é que ela vai ficar ainda mais cheia de ousadia.

- Não te dei uma suspensão por desacato enquanto podia. Acho bom você se retirar e evitar o desconforto de eu convidar seus pais para ter uma conversinha que foi adiada por muitos anos.

- Como a senhora mesma disse, já não estudo mais nessa escola. Vai falar o que para meus pais? Que vai me expulsar daqui? Que medinho!!!

- Como você deve saber, o estacionamento da minha escola também é meu e já que você vem fazendo uso dele para seus furtivos encontros, tenho o direito de mostrar umas imagens que andei arquivando para quem eu bem quiser e entender. Se estivesse no seu lugar com certeza estaria com "medinho"...

Adeus, tempestadeOnde histórias criam vida. Descubra agora