Epílogo

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Eu não diria, há seis meses, que haveria alguma chance de eu me sentir verdadeiramente feliz nessa vida.

Logo depois de me recuperar do acidente eu fui para a Bahia visitar meus pais e a minha amiga querida, a diretora Ana. Eu queria esperar o final do ano, mas eles estavam preocupados e eu precisava encerrar algumas pendências na minha vida, inclusive com a Sabrina. Muitos anos se passaram e apesar de todo o mal que ela me causou, venho aprendendo, aos trancos e barrancos, que o que não me mata, me fortalece. Que ela me machucou muito e que foi cruel, mas o que ela fez é de responsabilidade, única e exclusiva, dela. A mim, cabe compreender que tudo o que eu vivi foi essencial para que eu me tornasse a mulher que sou hoje.

Não posso dizer que superei todos os traumas, mas atropelei a maioria deles e alguns acabei deixando no cantinho do esquecimento, ao invés de tentar resolve-los. Ainda preciso de um tempo e sei que, inevitavelmente, posso voltar a viver situações que me lancem de ponta-cabeça para lembranças indesejadas, mas elas também fazem parte dessa confusão que eu sou e quem quiser que tente me explicar... ou entender. Estou aprendendo a respeitar cada versão de mim mesma. Quem sabe um dia não resolvo encarar de frente? Uma coisa de cada vez...

O John está saindo com o doutor que cuidou de mim na emergência do hospital. Fiquei fula da vida quando descobri que ele me usou para se aproximar do moço, mas no final das contas, eles chegaram à conclusão de que já se conheciam de anos atrás. Aqueles pegas no auge do furor alcoólico que nos dão uma terrível ressaca moral, além de amnésia no dia seguinte, por não lembrarmos nem como chegamos em casa. Estão juntos e de vez em quando sou forçada a deixá-los dormir no tapete da sala por não terem condição de dirigir até o cafofo que eles já estão dividindo. Para quem evitou escancarar a porta do armário, até que ele foi bem rapidinho. De vez em quando lança umas indiretas para mim, mas me faço de doida e finjo que não entendi... aí fica tudo bem.

No escritório eu passei a dar preferência aos casos que envolviam mulheres vulneráveis e já planejava começar a estudar psicologia para auxiliar no trabalho que pretendia desenvolver com elas. Queria resgatar aquela promessa que fiz para mim mesma, de ser como a diretora Ana, que foi a primeira pessoa no mundo a me fazer enxergar que eu pertencia a mim e essa era a razão primordial de eu ser única e valorosa diante da vida.

Para mim ainda é difícil acreditar que tenho total condição de estar bem, comigo, sozinha, independentemente de ter o Caleb ao meu lado. Com ele eu me sinto segura, amada, desejada...

Venho compreendendo um pouco mais do caminho que ele escolheu percorrer para curar as mazelas do seu passado e, apesar de estar 101% envolvida, ainda não me sinto confiante de que será efetivo comigo. Sei que não é o "correto", se é que existe certo e errado para questões sentimentais, mas só o que me importa nesse momento é saber que juntos somos muito mais fortes.

A minha chegada inesperada também causou um abalo na sua estrutura emocional. Acho que ele andava muito convicto de que jamais se apaixonaria por alguém e aí caio eu, que nem um raio, bem sobre a cabeça dele. Às vezes ele se declara e admite suas fragilidades, muito raramente para ser bem sincera, porque no dia a dia ele sempre tenta me confortar e cuidar de tudo para que eu esteja feliz.

E sim, nós estamos dividindo o meu apê, apertadinho e aconchegante. Chegamos a cogitar ir para um lugar maior, mas para nós três ainda dava e o Tofu estava tão ambientado, que não achei justo mudarmos tão depressa. Quem sabe um dia? Ele vem falando de filhos, de ter uma grande família e até arranjar uma namorada para o Tofu para ver se ele dá uma trégua na possessividade comigo, mas ainda não estou preparada para dividi-lo com uma gata. Por enquanto a dona do pedaço sou eu.

Sinto que tudo está chegando para o seu devido lugar. As nuvens se afastaram e as borboletas fazem a festa no meu coração. Me sinto pronta para alçar voo na busca da Brisa serena e calma, leve e linda, despida de qualquer desgosto e, se algum dia eles voltarem, sei que dentro de mim, existe uma força suprema capaz de me fazer superar. De preferência com meu delegado gostoso me conduzindo pelos caminhos da aceitação, do amor e do prazer...

Fim

Adeus, tempestadeOnde histórias criam vida. Descubra agora