XVIII

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Assim que cheguei no aeroporto fui recepcionada por uma mulher lindíssima. Ela nem precisava se apresentar para mim porque assim que botei os pés para fora do desembarque, a identifiquei como sendo a minha "tutora".

- Brisa! Brisa! Aqui!!

Ela pulava com os braços para cima e eu acenei indo em sua direção.

- Sou a Liza. Vou acompanhar você nesse início e te ajudar no processo de adaptação. Na próxima semana você já tem marcado um nutricionista, dermatologista, cabeleireiro, maquiador e fotógrafo para fazer um book novo. Tudo o que precisamos para te deixar pronta para encarar as grandes seleções. Você já está matriculada também em uma academia de ginástica e curso de inglês. Começa na segunda-feira.

- Olá, Liza! Será que a gente pode ir um pouco mais devagar? Não consegui assimilar quase nada do que você disse.

- Não tem problema. Você terá uma agenda com todos os seus compromissos e como estamos em época de férias escolares, a casa está cheia de meninas novas como você. Quero dizer, novatas. Porque no quesito idade você é a mais velha da turma.

Já não gostei daquele assanhaço de informações e do preconceito por conta da minha idade, mas só o que eu pensava é que aquele sacrifício duraria no máximo seis meses, já que logo completaria a maioridade e ficaria por minha conta e risco. Claro que não dividi essa informação com mais ninguém, mas ia aproveitar esse tempo para esquematizar os próximos passos.

Sonho meu que eu teria tempo sobrando para alguma coisa. Eles, o povo da agência, decidiam tudo por mim. Da roupa mais adequada para o meu tipo de corpo até o que eu podia comer todos os dias. Tenho hora para tudo e se eu chegar em casa após às 22h sem estar trabalhando, pago uma multa e recebo notificações. Logo de cara eles decidiram que eu precisava perder três quilos. Passei fome por um tempo e depois o meu corpo começou a se adaptar a pouca quantidade de comida. Já era magra, mas eles queriam me ver pele e osso. Um cabideiro perdia para mim. Não posso negar que nas fotos o resultado era incrível, mas diante do espelho eu me sentia feia e sem energia, apesar do consumo de todos os suplementos vitamínicos receitados para suprir as necessidades diárias do meu corpo.

Fiz inúmeros trabalhos e recebia muito bem por cada um deles.

Das outras sete meninas da casa, apenas a Joyce pensava como eu. Quem diria que logo eu, a mocinha certinha da Bahia, seria a maior contestadora e transgressora do grupo? E não era por ser a mais velha, não. Era porque eu não admitia determinadas situações e as outras meninas eram extremamente submissas. Ok, ok... Eu sei onde me meti e sabia que elas estavam fazendo a coisa certa, mas isso não me contagiava nem um pouquinho.

Enquanto elas folheavam publicações de fofoca, eu me entregava aos clássicos da literatura. Enquanto elas falavam do corte da moda eu falava sobre os lançamentos da tecnologia. Enquanto algumas delas eram capazes de dar o rabo por uma capa de revista, eu evitava qualquer tipo de envolvimento mais íntimo com clientes exatamente para dar limites às investidas que eu sabia que aconteciam por debaixo do pano... Ou por cima dos sofás.

Comprei um aparelho celular para poder ser encontrada com mais facilidade. No início meus pais quase me enlouqueceram, mas depois de um mês, passamos a nos falar basicamente a cada dois ou três dias. Estava tudo acontecendo da forma que deveria e apesar do excesso de controle, eu estava conseguindo administrar o stress. Queria sair de casa para ter liberdade e terminei me mudando para uma prisão com carcereira e tudo mais.

Falava constantemente com o Giorgio, mas os assuntos eram sempre superficiais. Ele dizia que sentia saudades das nossas conversas. Ahãm... Sei! Que qualquer hora apareceria para me ver e que queria saber tudo o que estava rolando, apesar de sua conta bancária estar vendo os números, resultado do sucesso que estava fazendo na carreira.

Cerca de quatro meses após a minha chegada, recebi um telefonema diferente dele. Um Giorgio tenso estava do outro lado da linha e eu estranhei:

- Onde você está agora?

- Em casa.

- Você voltou para casa?

- Não Giorgio. Estou na minha casa aqui em São Paulo.

- Porra! Que susto você me deu.

- E não abandona a boca suja... O que aconteceu? Você me parece aflito.

- Quero te ver. Eu preciso te ver.

- Mas assim, do nada?

- Agora.

- Vai mandar um jatinho me buscar ou espera que eu me teletransporte até você?

- Eu estou aqui no hotel em que nós nos hospedamos daquela vez.

- Você veio para cá e só agora você me diz? Você sabe que não posso sair assim sem me explicar. Sem falar que você está do outro lado da cidade e já são quase 20h.

- E se eu for até você?

- Hoje não dá, Giorgio. Você sabe como as coisas funcionam por aqui. Quando você vai embora?

- Amanhã às 15h.

- Vou até você logo cedo.

- E o que você vai dizer aí?

- Deixe comigo. Tenho uma aliada que com certeza vai adorar me ajudar a quebrar algumas regras!

   
Passei a noite acordada confabulando com a Joyce. Não entrei em detalhes de quem era o cara que eu me encontraria, mas sabia que assim que eu confiasse nela o segredo de que teria um encontro, seu coração romântico faria de tudo para me ajudar. Não podia deixar que as outras meninas sonhassem sobre o meu encontro. Muitas delas estava ali só esperando um deslize para poder esquentar a minha cama e faltava tão pouco para eu sair dali que não me custava ter cautela.

Na manhã seguinte, às 8h em ponto eu deixei um bilhete informando que estava indo caminhar no Parque Ibirapuera e que o celular tinha descarregado. Não teria como ser achada e não pretendia voltar tarde. Peguei o metrô e economizei tempo e muita grana.  Precisava conversar com o Giorgio sobre a forma que ele gasta o dinheiro dele com transporte nas suas estadas em Sampa, isso sem contar com o detalhe que ele fica num hotel caríssimo e que é longe de tudo.

Durante o percurso eu fiquei lembrando dos momentos que vivemos juntos. Fora o incidente com o Juarez, não tive nenhum tipo de envolvimento com o sexo oposto e isso só alimentava a minha expectativa do que poderia rolar entre nós. Dividia o quarto com quatro garotas e nem no banheiro eu conseguia ficar sozinha para ter um pouco de privacidade. Já sentia o meu corpo dar os primeiros sinais pela aproximação com aquele homem que me fazia perder o medo e a razão, mas ele estava esquisito e eu não podia simplesmente deixar para lá o fato de que ele nunca me procurou depois que voltamos para casa. Não procurou para ficarmos juntos, se é que me entende.

- O Giorgio está me esperando. Não sei qual o quarto...

- Ele está no 310 e a senhorita deve ser a Brisa.

- Exato. Obrigada.

Subi com o coração quase saltando pela boca. Apertei a campainha e aguardei. Ele apareceu coberto apenas por uma toalha passada pela cintura e me puxou para dentro imprensando-me contra a porta.

- Não estava aguentando de saudade de você!

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Capítulo extra só para aumentar a vontade de chegar a segunda-feira!!
⭐️

Adeus, tempestadeOnde histórias criam vida. Descubra agora