Capítulo 06: Razões

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Nova York, Paraíso

Apesar de ser feita de um metal desconhecido por mim, à armadura que Lana e eu usávamos era extremamente leve e permitia uma mobilidade inesperada. Eu me movimentava quase como se estivesse usando as roupas de treino – camiseta e calça de moletom. Lana, também, estava conseguindo lutar, apesar de que seus golpes estavam mais duros e ela não usava seus poderes. Talvez, por causa do metal, a eletricidade ficava mais difícil de controlar.

Trocamos socos e chutes; pulávamos de um lado para o outro, a armadura batendo e chacoalhando ao nosso arredor. Era um pouco estranho o barulho, como se eu estivesse com milhares de moedas nos bolsos e elas chocassem-se umas com as outras enquanto caminhava. Finalmente, depois e quase duas horas de treinamento, nós paramos para descansar.

O esconderijo dos Heartless ficava em Staten Island, praticamente no centro dela. Para chegar até o subsolo, onde estávamos, eles precisavam entrar em uma casa nos subúrbios e descer um elevador que ficava escondido atrás de uma parede no porão. E o que mais precisava naquele momento, era ver a luz, tomar um vento e sair daquele lugar tão fundo no subsolo.

Eu tirei a armadura e a deixei sobre minha cama em meu alojamento, para que não ficasse com cheiro de suor. Então, fui para o elevador, que subiu até o porão. Uma vez que estava do lado de fora, eu sentei no gramado e observei a movimentação na rua. Ainda estávamos na hora do almoço, então não havia muitas pessoas ali, pois elas deviam estar trabalhando em seus empregos dos sonhos em algum lugar por aí.

Contudo, vi algumas almas que estavam na forma de crianças brincando em seus quintais. Era impossível deduzir se elas eram almas Nascidas no Paraíso – ou seja, crianças ou bebês que morreram na Terra antes de saberem o que é o bem e o mal – ou se eram almas que tinham morrido há muito tempo, mas decidiram ficar naquela forma para se divertirem. De um jeito ou de outro, era legal assistir; fazia lembrar-me de casa.

Meus pensamentos flutuavam como se estivessem no oceano, indo de um lado para o outro. Pensei em Lana e nossos dias juntos, pensei em Elena e no Colégio, pensei na minha morte e nas pessoas que tinha conhecido desde então: Týr, Thais, George, Abraão, Sara, as pessoas em Roma, Solomon e sua tripulação. E agora, todos os Heartless que me acolheram e me aceitaram como um deles.

Pensei nas batalhas e nos Filhos do Abismo, e como eles tinham mudado o Paraíso, trazido dor e destruição à perfeição que era aquele lugar, mesmo que eu tenha culpa parcial em alguma dessas mudanças. Pensei na Morte e em como ela vinha planejando aquela destruição desde tempos imemoráveis. Odiei-o com toda minha força, mas logo eu já não odiava mais; algo naquele mundo não deixava que as emoções ruins tomassem conta de você por muito tempo.

Tudo isso resignava na decisão que eu tinha de fazer. Eu havia feito um acordo com a Morte e troquei minha vida pela a de Elena. No começo, eu sabia que estava fazendo o que a Morte mandava para tentar descobrir uma forma de voltar para ela, isso, até eu imaginar que ela estava seguindo em frente com a vida e que ver um namorado morto de volta à vida não seria a melhor coisa para seu psicológico.

Aos poucos, parei de pensar nisso e na promessa, mas ainda continuei seguindo com minha jornada e cumprir meu acordo com a Morte, pois, de fato, eu tinha trocado minha vida pela dela, independentemente do que ela escolhesse fazer. Tudo mudou quando a reencontrei quase três meses antes. Ela não apenas havia feito o possível para me ter de volta, como havia se transformado; caminhado em um caminho verdadeiramente sombrio de magia e sangue, e ela pagou por isso com sua própria vida, ou melhor, ela não estava morta, estava em um estado muito pior: em coma, incapaz de ver o mundo ao seu redor ou seguir em frente para o Paraíso.

Ali, no lugar mais improvável do mundo, eu tive uma ideia que não tinha me ocorrido antes: o Reino dos Sonhos. Sim, Elena estava em coma, ou seja, ela dormia. Talvez eu pudesse ser capaz de vê-la uma última vez; conversar com ela, o que com certeza ajudaria em minha decisão de: continuar lutando pela Morte, mesmo sem saber quais são as intenções dela, ou desistir, já que o outro lado da barganha – a vida de Elena – não mais existia.

Afterlife: HeartlessOnde histórias criam vida. Descubra agora