Capítulo 41: Rak'okë

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Nova Jerusalém, Paraíso

Miguel entrou na sala fitando o anjo que, até minutos antes, era um ser sem cérebro próprio. Ele estava deitado com as costas para cima, de modo que seus ferimentos não reabrissem. Os dois cortes um pouco abaixo de cada ombro estavam pretos devido à cauterização pelo Fogo Negro. Adnakiel e sua equipe ainda faziam alguns feitiços, como que para manter o anjo vivo. O querubim estranhou, considerando que todo o processo com Gadreel era para impedir a morte dele.

– Qaspiel. – Miguel disse tentando chamar a atenção do paciente. – Está me ouvindo?

– Sim. – Ele conseguiu dizer; sua voz não mais do que um sussurro. – Tem algo que precisa saber: um demônio. Há um demônio no Paraíso. Ele estava trabalhando com Amsharg. Ele fez isso comigo, Rafael e os outros.

– Isso é impossível. Nós saberíamos se um demônio... Você sabe como ele entrou no Paraíso?

– Um corvo. – Em seguida, ele voltou a dormir.

Miguel conhecia muitos e muitos segredos dos sete mundos, por isso, soube sem problemas de qual corvo o anjo falara especificamente. Era o mesmo corvo que Noé havia trazido na arca; o primeiro pássaro a ser enviado em busca de terra firme, mas também o que nunca voltou. Ele era capaz de viajar pelos mundos e, por causa da guerra, havia trazido um demônio e nenhum dos anjos fora capaz de detectar.

– Chame Lael. Tenho uma nova missão para ele.

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Sexto Círculo do Inferno, a Cidade de Dite

Inferno

A troca de guarda na torre norte aconteceu no meio da tarde – mesmo que o sol nunca se punha no Inferno, Nathanael conseguia medir o tempo instintivamente. Usando um feitiço de invisibilidade, eles voaram e derrubaram o guarda que acabara de entrar em serviço; Sabrina, sem pestanejar, usou a Arte para tirar todas as informações sobre a localização de Phillip dentro do calabouço. O guarda disse tudo. Então, Nathanael usou um dos feitiços mais sombrios da Magia Celestial, e controlou o guarda, de modo que ele ficasse de pé para aparentar fazer seu serviço.

Outra vez invisíveis, eles entraram no castelo através de uma janela no andar mais alto. Uma vez lá dentro, Nathanael desfez o feitiço. Se por um acaso encontrassem com Vráchos, precisaria de toda sua força para tirá-los de lá vivos.

Caminharam o mais silenciosamente possível. Desceram diversos andares, sempre evitando guardas que passavam e, ao mesmo tempo, usando a menor quantidade de feitiços possível. O castelo tinha um estranho tom de vinho, como se as pedras que o formavam tivesse tomado sol na praia e estavam queimadas. Todas as portas eram claras, numa madeira de origem desconhecida a Nathanael – não conseguia se lembrar do nome de nenhuma que existia no Inferno. Nas paredes, quadros, espelhos e cortinas nas janelas dava certo aconchego ao local, enquanto as armaduras de vários formatos diferentes assustavam qualquer alma que ousasse entrar.

Enfim, atingiram a porta das masmorras. Era gigantesca, com quase cinco metros de altura; maior que o próprio Vráchos. Nathanael encostou o ouvido nela, mas a madeira era grossa demais para ele identificar qualquer som que poderia vir do outro lado. Teve que usar um feitiço. Nada ouviu.

A dupla entrou, fechando a porta atrás de si. Tentaram fazer menos barulho possível, mas uma porta daquele tamanho era impossível de não se ouvir. Nathanael calculou que tinham menos de dez minutos até que alguém fosse investigar.

A maioria das celas estava vazia de prisioneiros, apenas seus esqueletos jaziam no lugar, demonstrando que elas eram usadas de tempos em tempos. Nathanael viu alguns demônios, que estavam fracos demais para reagir ao anjo diante deles. Encontraram Phillip em uma cela na metade do corredor. Ele estava extremamente magro, de tal forma que Nathanael podia ver suas costelas e a bacia quase como se não houvesse pele.

Afterlife: HeartlessOnde histórias criam vida. Descubra agora