Capítulo 6 - Intacto?

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O corte feito por Rick marcaria Lankher por toda sua vida.

Fora no pescoço. No momento em que a lâmina tocara o pescoço de Sonia, a mulher emitira um berro tão forte que por um momento todos congelaram. Gritos abafados ecoaram, e Lankher não tinha certeza se eram dele ou dos homens que o observavam. Sonia engasgava, ansiando ar, mas encontrando apenas seu sangue. Todos da arquibancada aplaudiam, e Rick sorria para eles.

— Sim, sim, obrigado. Onde está o próximo, o menininho órfão?

Suas palavras cortavam o ar para Lankher. Seu corpo queimava, mas ele suava frio. Sua dor se resumia ao calor infernal de Ozit e ao corpo de sua mãe, tentando de forma agonizante respirar. Não conseguia olhar; virou o rosto, e percebeu que chorava. Descobriu, assim, a única diferença entre os sabores do suor e de lágrimas: ambos eram salgados, mas apenas o choro tinha sabor de derrota.

Se tivesse precedido o ataque de Rick, poderia ter salvado sua mãe. Pensar assim deixava-o ainda pior. Ao menos o legado ainda estava lá. É sua chance de obter nosso reino de volta, dissera ela. Será que lhe traria uma forma de escapar de lá? Não importava. O que importava era fugir, como Sonia lhe dissera.

— Ei, ele está com uma adaga! — Rammet gritara para todos, e Lankher percebera que seria agora ou nunca.

Desembainhou sua adaga da bainha preta, que agora não pesava mais, sentindo todos os seus ossos ardendo em sua raiva. Pôs em prática seu treinamento com Guinn, da forma mais aterrorizante que podia. Virou-se tacitamente, investindo contra a lança de Gunter. Com o peso do bronze, a lança de madeira partira-se em duas com um rebentar bem alto. Lankher pegou a ponta da lança, e a penetrou no peito dele. O som da lança era engraçado para ele, mas o berro que o seguia tirava toda a graça.

Gunter caiu, fazendo o castelo explodir.

— Matem ele! O menino não pode escapar! — O som da voz de Rick se espalhou por todo o lugar, acima do alvoroço que os nobres iniciavam. O Tronet vemelho tornava sua voz retumbante. Flechas dançavam pelo local, e, estranhamente, nenhuma atingia Lankher. Ou ele que não as sentia, cortantes e mortais? — Meu irmão!

Rammet abraçou o corpo morto de Gunter, largando suas armas. Lankher descobrira, então, que eles eram sim irmãos, não apenas sósias. Uma pequena alegria lhe surgiu no peito. Desceu as escadas por ente os convidados, sua nova lâmina pendendo ao seu lado. Conseguia sentir todos os corpos em redor, de forma sufocante, e isso apenas o impulsionava a ir mais depessa.

Arqueiros bloqueavam a passagem para o terceiro andar, mas o garoto localizara uma minúscula porta à direita do castelo. Inconsequentemente, empurrou-a violentamente. Nesse momento pensava no fato de que nunca mais poderia ver sua mãe de novo, e quase parou, mas os gritos dolentes que ecoavam em sua cabeça o fizeram prosseguir.

Ele se encontrava numa sala de armas. Era curta, o teto era alto até se fundir às cinco torres do topo, e sobre a outra porta, do outro lado, estava escrita a palavra guerra em Ergyrah, o que não animou o garoto.

Havia vários machados de combate numa mesa escura. Nessa mesa, uma nota relatava: guerra dos anões — bem-sucedida. Do outro lado, outra mesa coberta de flechas relembrava: guerra das sombras malsucedida. E nesse ritmo se seguia; várias armas de guerras anteriores que poderiam ser reutilizadas, e muitas dicas bélicas para uma batalha melhor. Havia até bebidas e fluidos duvidosos.

Na Era Maldita era permitido o uso de magias básicas e experimentos simples, o que já era muito difícil de se fazer. Mas muitos tinham vocação à magia negra, os mais poderosos (como os Selia), e isso era proibido. Havia muitos magos, mas, com a Revolução, muitos morreram, mutilados e escorchados. Magia não era brincadeira; na maioria das vezes eram feitos pactos com Misteriosos para se ter mais poder, e o preço dos pactos...

1 - Terra de Sombras - A Revolta de OzitOnde histórias criam vida. Descubra agora