A terra vermelha sob os dedos; o tom escarlate afiado do trabalho. Escravo como quem não conhece a si mesmo, outrora com um fio de esperança em números sortidos ou campos de soja. Escravos do hoje e do amanhã, da fome que consome datas festivas; lugares esquecidos por deuses seguem parados no tempo. Crianças sem nome vendidas ao léu, suas mães nem ao menos tinham direito sobre seus corpos. Choram ao ver os filhos sofrendo de fome, sem amparo, sem a conquista da vida que tantos nomes defendem, alheios à realidade. Corpos massacrados pela guerra; Iêmen nunca mais foi mencionado pois agora é natal e os produtos novos chegaram às lojas. Famílias platinadas passeiam no shopping apreciando vitrines; tênis de camurça bordô vindos das pequenas mãos dos escravos sem mãe. De crianças sem amor e natal. Natal não é nada para quem não tem a chance de ser nada além de mão de obra barata.
Deitadas num berço de ouro roubado, estão as criaturas prateadas, altivas e maliciosas, jorrando ácido aos rubros que sustentam sua pirâmide construída em sangue de odor metálico. Sem conhecer a miséria, pouco poderiam compreender sobre a cesta básica para uma família sem o mínimo para viver. Do pão e circo temos a televisão e nada além da generosidade dos deuses prateados, que em toda sua glória, doam brinquedos e chocolates às crianças. Salvam a si mesmos da maldade do mundo, se petrificam como monumentos a serem admirados por tamanha bondade. Realizam sonhos plásticos e açucarados, efêmeros. O vinte e seis chega e a fome e os furos pútridos nas paredes de madeira seguem atormentando o proletário, ao se levantarem, vermelhos como a aurora, para mais um dia de escravidão da nova era.
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ŞiirTextos desocupados de dores com sabor de açúcar, amores ácidos e borboletas amarelas.