VITOR 🎈
EU JÁ TINHA IDO A AVENIDA PAULISTA MILHARES DE VEZES, principalmente porque meu avô trabalhou por um tempo no IGESP que ficava ali perto, mas com Luísa tudo tinha um gostinho diferente.
Ela tinha me arrastado para uma livraria na Brigadeiro, olhando de fora aquele lugar era minúsculo, mas por dentro era enorme com dois andares cheios de estante de livros, o lugar era meio bagunçado e me dava a sensação de que seria esmagado a qualquer instante por todos aqueles livros, além de que só de imaginar a quantidade poeira que tudo aquilo deveria acumular, já atacava a minha rinite, mas nada pagava ver os olhinhos da ruiva brilhando por estar naquele lugar.
Depois do que me pareceu um século, Luísa escolheu dois livros que eu nunca tinha visto, mas ambos tinham as capas e os títulos muito bonitos, um era Céu Sem Estrelas da Íris Figueiredo e o outro era Como Eu Imagino você do Pedro Guerra, eu disse que pagaria pelos dois livros, um seria de aniversário e o outro seria de Natal que já estava chegando, mas Luísa recusou dizendo que não queria presente nenhum e correu (literalmente) para o caixa e os pagou antes que eu pudesse alcançá-la.
Nós andamos pela Paulista por um tempo e decidimos comer alguma coisa no Starbucks. Nós pedimos um lanche de nome esquisito (por que nada naquele lugar tem nome normal?) e eu pedi um expresso de avelã e ela um mocha.
Nos sentamos do lado de fora e esperamos ser chamados. Luísa foleava os seus novos livros ferozmente, eu sorri do seu jeito animado com a leitura, já conseguia vê-la sentada em sua cama lendo um dos dois livros com uma xícara de chá ao seu lado e uma mantinha a cobrindo, enquanto ouvia alguma música do Legião Urbana.
A moça chamou o meu nome e eu fui buscar os nossos pedidos. Me sentei na mesa e Luísa tinha guardado seus livros. Pus seu café e seu pão na sua frente e comecei a comer o meu.
– E então, onde vai passar as festas de fim de ano? – Perguntei tomando um gole do meu café.
– O Natal, eu vou passar com a minha família e o Ano Novo com o Miguel, a Laura, o Igor e as gêmeas. – Respondeu. – E você? Vai passar aonde?
– Com a minha família, ou melhor, com a minha ex-familia. – Falei com certo escárnio na voz. – Vão ser as últimas festas de fim de ano em família, to fazendo isso mais pelos meus irmãos do que pelos meus pais.
– Seu pai vai embora que dia?
– Dia 2, mas hoje, eles vão assinar o divorcio.
Luísa ficou em silencio por tempo e parecia decidir se me dizia algo ou não.
– Você já leu Um Milhão de Finais Felizes? – Perguntou depois de um tempo.
– Não, o que é isso?
– É um livro do autor Vitor Martins, ele fala sobre um garoto gay de 19 anos que saiu do ensino médio, mas não sabe o que fazer da vida, admito que é meio clichezinho, mas tem uma parte que o garoto, Jonas, meio que se ferra e acaba descobrindo o verdadeiro significado de família. – Explicou.
– Parece ser legal, vou procurar pra comprar.
– Se você quiser, eu posso te emprestar.
Eu aceitei a sua sugestão.
– Você sabe que família não é apenas aquela que nós nascemos, certo? – Luísa perguntou pegando na minha mão. – Seus amigos também são a sua família., você ama o Felipe e o Samuel como irmãos, não é? – Eu assenti. – Então, eles são a sua família também, aquela família que nós escolhemos e que nos escolhem, mas isso não muda a intensidade do amor que sentimos.
Eu sorri largo para ela que retribuiu na mesma intensidade. Luísa fazia parte da minha família, mas não iria dizer isso a ela, não queria assusta-la novamente e correr o risco de perde-la.
Depois disso fomos para o apartamento da ruiva e fui embora de lá procurando uma livraria para comprar Um Milhão de Finais Felizes.
🎈🌻
LUÍSA 🌻
Dia de Natal era sempre a mesma coisa, toda a minha família na casa da minha avó, sentados em uma mesa quilométrica com os meus primos e tios gritando para passar a maionese.
Aquele ano não foi diferente. A casa da minha avó ficava no coração da Mooca e era enorme com quatro quartos, uma cozinha que parecia de restaurante, a sala era do tamanho do meu apartamento inteiro e o quintal era maior ainda.
A mesa enorme estava no centro do quintal com quase todas as comidas em cima da mesma, quase porque o pernil estava terminando de assar. Tinha várias cadeiras em volta da mesa, já que minha avó tinha tido 5 filhos e cada um deles teve pelo menos dois filhos, então isso dava um total de mais de 20 pessoas.
– A senhora não quer ajuda vó? – Perguntei entrando na cozinha.
– Claro que não, Luísa, pode ir lá fora com os seus primos que eu me viro aqui. – Ela disse pegando o pernil de dentro do forno.
– Mas vó...
– Nada de "mas", vai logo antes que eu pegue o rolo de macarrão. – Me ameaçou de forma brincalhona.
– Até parece que você não conhece a Dona Dolores, Lu, ela nunca quer ajuda. – Meu tio Paulo disse e eu sai para o quintal novamente, sorrindo.
Minhas priminhas corriam de um lado para o outro brincando de pega-pega, três primos adolescentes ficavam encarando a tela do celular jogando alguma coisa entre eles, os adultos estavam sentados a mesa conversando sobre como tinha sido o ano deles, afinal aquele era um dos únicos três dias do ano inteiro que a família estava inteira reunida, os outros dois era a Páscoa e o dia das mães.
Eu me sentei entre o Davi e a Clara e eles riam de algum mico que o meu tio Otávio tinha pagado naquele último semestre (para variar). Logo o meu tio Paulo saiu da cozinha carregando o pernil e o colocou sobre a mesa, minha avó vinha carregando os refrigerantes. As mães foram atrás de suas crianças para comer, enquanto os pais obrigavam seus flihos a largarem seus celulares e se sentarem a mesa com o resto da família.
Quando todos já estavam sentado começou a típica gritaria do:
– Me passa a maionese!
– Quem está com o frango?
– Meu garfo caiu, alguém tem um sobrando?
– Vai ter o que de sobremesa?
E assim seguia com as milhares de histórias já ouvidas centenas de vezes, mas que todo ano pareciam inéditas.
Eram por esses motivos e muitos outros que eu amava o Natal.
Podia ser as mesmas comidas todos os anos, as mesmas sobremesas, as mesmas piadas, as mesmas histórias, as mesmas pessoas, mas cada ano era único e nada era melhor do que estar com a minha família.
🌻🎈
VITOR 🎈
O Natal tinha sido aquela chatice de todo ano: eu, meus irmãos, meu avô e meus pais comendo comidas de origem francesa e portuguesa que eram as antecedências da minha família.
Eu sabia que o Ano Novo não seria diferente. Só estava ali, naquela casa porque era a última festa em família e sabia o quão isso era importante para o Vicente.
Meus pais se ignoravam e eu os ignorava, dava atenção apenas para os meus irmãos e meu avô que contava suas histórias da época que ainda trabalhava como médico, não eram tão legais quanto as do meu outro avô, o Afonso, mas era bom mesmo assim passar um tempo com o meu avô Michel.
Vicente estava desconfortável ao meu lado, sorria forçado, falava apenas quando lhe perguntavam alguma coisa e mexia a perna para cima e para baixo o tempo todo.
Fui ao lavabo e quando sai de lá, encontrei com o meu irmão caçula mordendo a ponta do dedo e me encarando com um olhar meio pidão.
– A gente pode conversar?

VOCÊ ESTÁ LENDO
EntreVidas 🌙
JugendliteraturLuísa é uma garota de programa que odeia o que faz, ela entrou nessa vida pela necessidade, todos os dias espera se livrar do emprego, até que descobre que há algo muito errado com o clube em que trabalha. Vitor tem o emprego perfeito, a família per...