Capítulo 45 🌙

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VITOR 🎈

MINUTOS DEPOIS, A AMBULÂNCIA DO SANTA MÔNICA CHEGOU e eu fui o escolhido para ir com a Luísa. Foram feitas as mesmas perguntas de antes e algumas a mais, falei para a paramédica colocar todos os gastos da ruiva na conta do meu avô.

Os meninos foram logo atrás da ambulância avisando os nossos amigos a mudança de hospital.

Quando chegamos, Luísa foi levada de mim mais uma vez, fiquei na recepção cuidando da papelada, enquanto médicos e enfermeiros corriam para socorrê-la. Logo os meus amigos chegaram e se sentaram junto a mim na sala de espera.

Diferente do hospital público, o Santa Mônica estava menos movimentado, havia alguns pacientes circulando pelos corredores, mas nenhum deles estava deitado em uma maca no meio do caminho.

Por que a diferença de classes é tão brusca?

– Acompanhante de Luísa Cardoso? – O médico chamou e nós corremos até ele.

– Desculpa, mas só posso liberar apenas um acompanhante. – Avisou o médico.

Novamente eu fui o escolhido do grupo e acompanhei o médico até o seu consultório.

O dia estava quente, mas aquela sala parecia uma ilha do ártico. Me sentei na cadeira em frente ao médico e esperei que começasse a falar. Ele observava os exames feitos e o laudo mandado pelo hospital público, enquanto escrevia em uma ficha com o nome de Luísa.

– Eu sou o Dr. Marcio, estarei acompanhando o caso da sua namorada enquanto estiver aqui. – O médico falou concentrado nos exames.

Meu dever era corrigi-lo e dizer que eu e Luísa não namorávamos, mas não o fiz, deixei que pensasse que éramos um casal, porque... Bem, eu não sei o porquê, mas a ideia de ter a ruiva como minha amante me pareceu fantástica.

– De acordo com o laudo médico enviado, ela sofreu arranhões profundos na panturrilha direita, uma parada cardíaca de nem um minuto, ingestão e inalação de água e está com uma leve hipoxemia, ou seja, a taxa de oxigênio em seu sangue está baixa. – Dr. Marcio prosseguiu. – Mas conseguiram controlar a maioria dos fatores, ela é fumante?

Dr. Marcio colocou um raio-x do pulmão em uma placa de luz e analisou.

– Sim, mas não sei há quanto tempo. – Respondi tentando decifrar a imagem na placa de luz.

– Está vendo essas manchas aqui? – Perguntou circulando com a caneta umas manchinhas. – Isto é graças ao cigarro, dificilmente irão sair, mas se ela parar de fumar agora, não irão aparecer mais.

– Ela está tentando parar.

– Ótimo, irei libera-la para o quarto, já que só precisamos esperar que ela acorde para fazermos mais exames e aí sim, se estiver tudo bem, irei mandá-la para casa.

Eu concordei e me levantei apertando a mão do médico que me observou com atenção por alguns segundos.

– Eu acho que te conheço de algum lugar. – Dr. Marcio comentou, enquanto caminhávamos pelo corredor. – Você já se consultou comigo ou é famoso ou algo assim?

Praticamente todos os funcionários de todos os hospitais tinham uma leve noção do meu rosto, eu sempre era obrigado a ir a eventos médicos ou em premiações ou coisas do tipo, então sempre havia no mínimo uma foto minha em cada filial, isso era constrangedor porque sempre me diziam "Acho que já te vi em algum lugar" e eu sempre sorria sem graça para a pessoa e respondia "É porque sou neto do Michel Borges" ou "eu sou o filho do meio da Beatriz Borges Guimarães e do Rogério Guimarães."

Sim, as pessoas me perguntavam qual dos três filhos eu era.

– Eu sou neto do Michel Borges. – Falei cabisbaixo tentando não chamar a atenção de mais ninguém.

– Sério? Que legal. – Dr. Marcio disse e eu sabia que ele estava mentindo, as pessoas sempre achavam um saco eu ser o neto do dono de toda aquela merda, porque sempre achavam que eu iria ou desmerecê-los ou me achar superior, mal sabiam eles que isso estava muito longe do meu feitio. – E você é filho de qual dos filhos? Da Beatriz ou da Benício?

– Eu sou o filho do meio da Beatriz.

– Ah, sim, claro, você se parece muito com ela, quero dizer, vocês têm os mesmos olhos. – Dr. Marcio disse e estendeu sua mão para mim novamente. – Será um prazer cuidar da namorada de um dos netos do dono.

Eu apertei a sua mão e de novo, não o corrigi.

🎈

Depois que Luísa já estava alocada em um dos quartos, o médico liberou nós 5 para subirmos e ficarmos com ela.

Eu ainda acho que ele só permitiu isso por eu ser quem sou e ficou com medo de que se não fizesse algo do meu grado, mandaria o meu avô demiti-lo.

Mas isso nunca aconteceria.

Eu conhecia as regras e exigências do hospital, não iria descontar o meu descontentamento em um funcionário que só estava fazendo o seu trabalho.

– Vocês podem ficar aqui, mas não podem deixá-la sozinha. – Dr. Marcio nos orientou. – Tem que ficar pelo menos uma pessoa com ela. Vocês têm uma ideia de quanto tempo ela está desacordada?

– Um pouco mais de 12 horas, acho. – Miguel respondeu ao médico, enquanto olhava as horas em seu celular. – Eu chamei o SAMU um pouco depois das 11h00m.

– Certo, não quero ser pessimista, mas rezem para que ela acorde antes de completar 48 horas, porque aí sim teremos um problema. – O doutor disse.

Nós assentimos e nos ajeitamos no apartamento. Miguel e Samuel se ajeitaram no sofá azul de dois lugares que parecia extremamente desconfortável; Laura se sentou na poltrona reclinável e ligou a televisão em um filme brasileiro; Clara arrastou uma cadeira de metal para perto da sua irmã; e eu me joguei contra a outra cadeira desconfortável.

A última fala do Dr. Marcio me perturbava.

Rezem para que ela acorde antes de completar 48 horas, porque aí sim teremos um problema.

Que tipo de problema? Ele queria dizer que Luísa poderia morrer se não acordasse nas próximas 36 horas? Ou que ela poderia entrar em coma?

Todas as opções me pareciam assustadoras, porque em todos eu nunca mais poderia conversar com a ruiva, nunca mais poderia ouvi-la tirar sarro dos meus gostos ou das minhas roupas, nunca mais poderia toca-la, nunca mais poderia ver aquele sorriso que tanto amava.

Naquela madrugada em um hospital em Caraguatatuba, longe da minha casa, eu fiz uma coisa que não fazia há muito tempo: eu orei.

Pedi para o Deus, fosse lá onde estivesse, fosse lá como fosse, fosse lá o seu nome, para que ajudasse Luísa, para que a salvasse naquela noite, para que lhe desse mais uma chance.

Pedi para todos os santos, orixás, guias, espíritos do bem e qualquer outro ser espiritual para que ajudassem a garota que eu amava.

Uma vez, enquanto conversávamos, perguntei para a Luísa qual era a última coisa que ela fazia antes de dormir, sua resposta foi uma oração.

Durante aquela conversa e naquela madrugada no hospital, eu me senti péssimo, porque nunca me lembrava de agradecer a Deus ou a Oxalá ou a Ala ou a Geová ou ao Universo ou qualquer outra coisa cósmica que nos guia por aquele dia, pela chance de recomeçar, pelo o que eu tinha e o que eu não tinha, pelo o que eu tinha conquistado, pelos bons momentos vividos e pelos maus que nos trazem um aprendizado, mas nunca se é tarde para começar.

Antes que percebesse, já tinha caído em um sono profundo, sonhando com a ruiva.

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