Capítulo 63 🌙

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LUÍSA 🌻

SABE QUANDO VOCÊ SENTE QUE O SEU MUNDO ESTÁ PRESTES A DESABAR?

E sabe quando a tal luz do fim do turno parece finalmente brilhar para você?

Mas você já teve esses dois sentimentos ao mesmo tempo?

Se sim, então você sabe exatamente como eu me sentia naquele momento.

Eu estava em um misto de emoção, me sentia feliz por saber que a minha irmã estava enfim se cuidando, que estava bem e em boas mãos que a ajudariam a superar essa merda que ela estava vivendo. Mas também estava triste por ter chegado a esse ponto, ao ponto de não controlar o vício, de não controlar a si própria, sei que naquele dia, lá no apartamento da Barra Funda, em que discutimos e eu esbofeteei seu rosto, não estava batendo na Mirela, estava batendo no demônio dentro dela.

– O que? – Foi a única coisa que consegui dizer.

A minha mente trabalhava rápido, mas o meu corpo não conseguia acompanhar os meus pensamentos. Eu tinha tantas perguntas martelando na minha cabeça, tantas dúvidas, tantas inseguranças, tanto medo e preocupação.

– A Mirela está internada em uma clínica de reabilitação. – Clara repetiu.

– Como?... Por quê?

Que perguntas geniais, Luísa, parabéns.

– Bem, depois daquele dia em que você foi embora, o papai ficou arrasado e ligou pra faculdade da Mirela, depois ficou resmungando pelos cantos e passou praticamente o dia inteiro sentado naquela poltrona velha dele, sempre que eu perguntava o porquê de ele estar ali, só dizia que estava esperando a Mirela e que teria uma conversa muito séria com ela. Achei melhor que o Davi não ouvisse a tal discussão porque nós já tínhamos ouvido a sua com o papai, então sugeri que ele levasse a Laika pra dar uma volta, ele concordou e saiu com a cachorra. Minutos depois, a Mirela chegou e a treta começou, eles gritaram um com o outro por quase uma hora, o papai descobriu que a Mirela não fazia faculdade nenhuma e que todo o dinheiro que ele dava pra ela pagar a mensalidade era torrado em droga, depois disso ela passou a noite inteira fora de casa, enquanto eu e o papai fazíamos a mala dela, até então, achei que ele só a expulsaria de casa, como fez com você, mas no outro dia cedo, ele a enfiou dentro do carro e a levou pra clínica. – Clara explicou com a voz embargada.

Algumas lágrimas teimavam em escorrer pelo o meu rosto, a tristeza era grande, mas a sensação de que tudo estava certo era maior ainda.

Clara me abraçou e ficamos assim por um tempo, enquanto as duas choravam em silêncio.

– É minha culpa. – Eu disse baixo contra o pescoço da minha irmã.

– É claro que não é. – Clara me consolou.

– É, sim, eu sabia que a Mirela se drogava, descobri há uns três anos, mas não contei nada a ninguém, não fiz nada pra tentar impedi-la, na verdade, eu a ajudava, sempre dando dinheiro, só pra ela não contar que eu era garota de programa.

– Lu, olha pra mim. – Clara pediu e eu levantei o meu olhar, ela limpou as minhas lágrimas com os seus dedos delicados e beijou a ponta do meu nariz, igual eu fazia com ela quando era menor. – Eu fui em varias visitas e a Mirela me disse que sim, você tentou pará-la, mas ela que não quis, você negou dinheiro a ela e isso é uma puta ajuda, Lu, não se martirize por algo que você não pôde impedir.

– Mas ela é a minha irmãzinha, assim como você e o Davi também, sou responsável por vocês.

– Não, você não é responsável por nós, nós três já temos mais de 18 anos, não precisamos de ninguém pra cuidar da gente, tudo bem, você é a mais velha e sei que tem esse extinto protetor, mas nós tomamos a decisão que a nossa consciência acha a melhor, nós fazemos coisas erradas e está tudo, faz parte do amadurecimento, você está aqui para nos orientar caso precisemos de você e pode ter certeza de que nós vamos te procurar, você é a melhor irmã do mundo, eu não pediria por nenhuma outra porque, como eu já disse, você é o meu orgulho.

Eu a abracei de novo e encaixei a minha cabeça em seu ombro, respirando fundo, deixando que o seu perfume doce me invadisse. Clara, a segunda irmã que sempre me preocupei mais, talvez por ser a mais nova e eu sempre querer preservar a sua inocência, talvez por que querer que ela sempre fosse a minha garotinha, mas na minha frente não havia mais aquela menininha tímida, na minha frente estava uma mulher formada e independente e eu estava orgulhosa por isso.

– Nós vamos ficar bem, não é? – Perguntei ainda com voz de choro.

– Nós vamos ficar bem, nós sempre ficamos bem.

🌻🎈

VITOR 🎈

Ir ou não ir?

Descer ou não do carro?

Falar ou não com ela?

Eu batucava os meus dedos no ritmo de Thunder no volante (mas ja tinha sido There for you, Galway Girl, Same Old Love, All Night, entre outras tantas músicas da minha playlist) com essas perguntas me rodeando, mas ainda não tinha decidido se ia ou não procurá-la.

Eu estava estacionado em frente ao Paradise, pessoas entravam e saíam do sex clube, algumas acompanhadas, outras sozinhas, mas não tinha visto quem eu queria, apesar que achei muito engraçado ver o meu tio Carlos, um dos maiores heteros escrotos da minha família, sair bêbado, beijando e abraçando um cara que suspeitei ser um garoto de programa, Vicente ia amar essa cena.

Tinha decidido que iria conservar com a Luísa, ela me ignorava sempre por mensagem, mas se eu pedisse por um programa, ela não poderia negar, não é?

Juntei o pouco de coragem que tinha e desci do carro. Enfiei minhas mãos no bolso da blusa de moletom, fazia um frio de matar em São Paulo no último mês de inverno (graças a Deus já estava acabando esse inferno), caminhei até a entrada do Paradise e entrei no estabelecimento. Dentro do sex clube fazia calor graças ao aquecedor, então pude tirar a minha toca e o meu cachecol, andei pelo longo corredor colorido pelas luzes de neon e me encostei no balcão da recepção.

A mocinha com o crachá escrito Sabrina sorriu para mim do outro lado e perguntou em que poderia me ajudar.

– Estou procurando pela Luísa Cardoso, gostaria saber se ela está aqui dentro ou na rua. – Falei.

Sabrina mexeu um pouco no computador e voltou a sua atenção para mim.

– Desculpa, senhor, mas a Luísa Cardoso não trabalha mais aqui.

Um misto de confusão, tristeza e alegria me atingiu, eu estava feliz por Luísa ter se livrado daquele lugar, triste por não saber como iria procura-la agora e confuso em como isso tinha acontecido.

– Você tem certeza? – Perguntei me inclinando no balcão para poder olhar o computador.

– Absoluta, ela saiu já faz três meses. – Sabrina disse. – Mas temos outras garotas aqui, o senhor pode se interessar por outra.

– Não, obrigado, o meu caso só pode ser resolvido com a Luísa. – Falei deixando que a recepcionista pensasse o que quisesse. – Obrigado pela ajuda.

Sai do sex clube me perguntando como eu iria falar com a Luísa agora, se eu fosse até a sua casa, nem ela e nem o Miguel me deixariam subir, a única solução que eu tinha encontrado era ir até o Paradise, mas agora eu me encontrava no escuro novamente, não adiantava mandar mensagens, ela não me respondia, não adiantava ligar, ela não me atendia, eu estava com as mãos atadas e o coração entre elas.

O que eu faria agora?

– Vitor?

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