O inicio

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Eu me olhava no espelho, enquanto suspirava pela décima ou quinta vez.

Papai me aconselhou pessoalmente, a me vestir bem para representar a beleza e força do nosso país. Mas como representar algo se suas mãos te entregam a primeira vista? Sendo sincera, eu não parava de tremer, eu tinha ouvido as histórias e aprendido na escola. Meu pai não era nenhum santo, muito menos nossos visitantes.

Eu não dormia bem desde o dia em que foi anunciado, que o Primeiro Ministro da União viria a Cuba. Eu imaginava seus traços estrangeiros, mas por mais que eu tentasse arduamente toda noite, eu acabava falhando. Eu nunca havia visto muitas pessoas estrangeiras perambulando por Cuba, além do mais, eu como filha de Fidel Castro não era mantida solta pelos corredores. Minha educação sempre foi bastante rígida e cada dia que passa, todos ao meu redor parecem se desapontar pelas minhas atitudes.  

Eu tinha apenas dezoito anos, será que eles não podiam esperar até meu próximo aniversário para eu começar com o meu teatro de ser rígida e fria com os empregados? Eu não gostava de ser cruel e não gostava do sistema em que eu vivia.

Depois de alguns minutos, olhei para o presente que eu havia ganhado da esposa de um dos amigos próximos de papai. Era um batom que deixava a boca mais vermelha que o normal, eu não sabia se arriscava, depois de afastar a mão três vezes, acabei pegando o frasco e o abri com cuidado. Lentamente passei meus dedos pela camada cremosa e os levei até os lábios, depois de conferir estar sem nenhum borrado, fui até a porta.

Do lado de fora, Helen minha tutora incrivelmente linda, alta e loira me encarou surpresa e deu um sorriso de lado.

– Achei que iria deixar o frasco criar teias de aranhas. - falou atrevida. Como éramos íntimas a muitos anos, eu deixava ela fazer certos comentários.

– Achei que depois que eu fizesse dezoito, seus comentários apresentariam menos deboche e mais respeito. - falei também dando um sorriso de lado.

Ao nosso redor eu podia observar os guardas fazendo a segurança.

– Seu pai vai ficar entusiasmado, significa que você está crescendo e está deixando de ser... - falou mas se interrompeu antes de pronunciar tal besteira.

– Não sou o que eles dizem, apesar de que as vezes não me comporto como uma mulher crescida. Mas posso afirmar com todas as letras, quando chegar a hora... - parei ao encarar meu pai totalmente fardado e com um semblante sério.

– Se estivesse tão pronta quanto diz, não estaria dando um espetáculo aos nossos guardas. - falou e eu abaixei a cabeça - Pelo o que vejo, a Senhorita não anda fazendo um bom trabalho permitindo tal despeito da minha filha. - se dirigiu agora a Helen.

– Me desculpe Senhor. - falou também com a cabeça baixa.

O medo que sentíamos ali por aquele homem fardado era explicito.

– Depois da reunião de hoje, teremos negócios a tratar. - falou sombrio e eu assenti.

Levantei a cabeça e seu olhar passou pela minha roupa, o sorriso que deu era o mesmo quando minha mãe perguntava se ela estava aprovada.

O homem carrancudo caminhou em passos fortes, enquanto eu endireitava minha postura e tentava reproduzir sua confiança deixando meu nariz em pé.

– Os visitantes estão a dez minutos senhor. - um dos guardas se aproximou e saiu depois dele ter o dispensado com um aceno.

– Pela demora e incompetência desses guardas de transmitirem informações, eles já devem estar a minha espera. - papai rosnou e os três companheiros que eu ironicamente chamava-os de Tios, que o rodiava e nunca abandonavam o posto, instruiu ele a esperar já no saguão principal da ala de reuniões.

Passados dez minutos, um dos guardas entrou fazendo um sinal e anunciando a entrada dos soviéticos.

Olhei para papai e o mesmo me encarou, me instruindo a olhar para frente e manter a postura.

Os homens que entraram na minha visão no seguinte momento, mudariam minha vida de uma forma que eu não poderia esperar, nem em meus piores pesadelos. Se eu achava a carranca de papai séria e feia, ela não se comparava a do grupo a minha frente.

Eles usavam o símbolo da União em braçadeiras, em broches e nos ombros. Suas fardas eram diferentes das nossas, um grande sobretudo os cobria e iam quase até seus coturnos, que de longe eu os podia ver brilhando.

Meu pai abriu um pequeno sorriso e começou a falar uma língua que eu não possuía muito conhecimento sobre. Apesar de ser inocente no assunto, entendi quando a direção foi mudada até mim e não mudei minha postura fazendo um pequeno aceno com a cabeça - eu não sabia como me portar, principalmente quando o líder deles parecia queimar seus olhos sobre mim, sentia minhas bochechas cada vez mais quentes e isso não era bom. Eu não podia demonstrar fraqueza.

Meus olhos procuravam pela minha tutora naquela grande sala, mas tudo o que eu encontrei foi os olhos cor de mel, que por pouco eu não enxergaria por causa do cap, me encarando. Parecia uma ilusão, mas ele havia curvado seus lábios em um pequeno sorriso.

Não, eu tinha certeza! A confusão em meus olhos era implícita, porque segundos depois não havia seriedade ali, mas assim algo como diversão.

Com o diálogo encerrado, eles entraram em uma das salas de reunião, me fazendo soltar um suspiro alto.

Poucos segundos se passaram e a loira estava a minha frente bastante aflita.

– Você não andou estudando o russo andou? - perguntou rápido e eu engoli seco negando com a cabeça.

– É, você não vai gostar do que vira a seguir.

CUBA • JBOnde histórias criam vida. Descubra agora