Capitulo XLVI: Quando você olha para mim

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Quando você olha para mim do jeito que olha agora, eu percebo o quanto eu me afogo, o quanto não queria que esse olhar fosse direcionado para mim nesse momento. Quando você olha para mim do jeito que olha, percebo minha afetividade caindo aos pedaços e destroçando você e em nós, uniformemente. Quando você olha para mim do jeito que olha agora, eu percebo que nem o amor é o suficiente quando eu me aproximo e te afasto em uma dança perfeita. Na dança, eu me aproximo e vejo a sujeira que eu fiz no chão, os cacos de vidro, as tintas derramadas, todos os pincéis quebrados. Na aproximação, eu vejo você me olhar no desdém e cada vez a buraco fundo desce dentro de mim até atravessar o que eu sou.

Quando você olha para mim, eu rebobino todas as melhores táticas para me aproximar e não te fazer lembrar dos cacos que cortam meu pé. Eu penso na melhor forma de te fazer lembrar do meu toque, do meu sorriso para você, lembrar do beijo só nosso, da minha risada alta com seu jeito besta, com cada pedido de água que você me fazia e eu me levantava logo para buscar para você, coisa que nunca faria por ninguém no mundo. Eu te daria cada batata frita minha se você sentisse fome e toda a água do planeta caso sentisse sede. Eu te daria todo afeto do mundo para te esquentar e amenizar teu olhar indecifrável na minha direção. Você me deu seu livro favorito e eu olho para ele toda vez que eu choro por nós. Eu me lembro de cada abraço e nada nunca será tão forte quanto isso. Eu sinto cada memória bonita arder no meu peito e eu juro que faria tudo para que fosse a única coisa que ardesse no seu peito.

Quando você me olha, eu percebo o caos que eu sou, alguém que não merece o amor de ninguém quando deixa cacos no chão e tintas presas na parede. Eu sei que eu sou atualmente a pior versão de mim nos seus olhos, entretanto no mundo mental que a gente construiu com os nossos melhores sonhos, eu sei que você conheceu versões boas de mim e que não estão afogadas nos cacos, na tinta e nos pincéis. Amor, eu ainda sou aquela que te fez amar o amor de novo. Eu ainda sou a mesma pessoa que ama fazer cafuné em você, que fala com voz de criança as vezes, que chora por tudo e com as suas palavras bonitas e intensas, aquela que te abraçou forte milhares de vezes, que te olhou dormir e te olhou comer milhares de vezes, da maneira mais lenta que só tu come. Eu ainda sou, Vitória, aquela que te vê como amor da vida e que escuta Liniker lembrando do nós que escrevi em tantos poemas.

Mesmo quando você me olha, eu sei que no fundo do seu olho preto que eu ainda tô em algum lugar dentro de você, no meio dos cacos que se me deixar, eu vou recolher. No meio das tintas que irei transformar em uma bela pintura. Eu ainda sinto, um tanto de tantos por você e toda vez que encostar seu ouvido no meu coração, tentando escutar minhas batidas, eu sei que você vai saber.

Você é desenhada com cores escuras. Em livros de poesias e contos quentes. Escrita em preto, azul e vinho. Desenhada em ruas cheias de curvas, intensas e que só permitem veículos em alta velocidade. Desenhada por quinhentas mãos, diferentes contextos e que te fizeram uma mistura, uma mistura misteriosa que torna cada segundo um desenho e uma arte distinta.  Tu bateu muito tempo na esquina e explodiu em mim, no meu corpo, no meu coração e na minha mente. É a inspiração das minhas principais histórias e a protagonista dos sonhos favoritos. Você se desenhou por cima da minha escrita e permanece sendo minha musa, todos os dias. Só me deixa, por favor, continuar sendo a artista que te pinta em cores escuras.

Um dia, você vai lembrar dos meus poemas sobre nós. (2018)Onde histórias criam vida. Descubra agora