surpresa

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Aqui vai mais um fato sobre mim: eu odeio voar. Então, para que as horas passem mais suavemente, eu me dopo de antialérgicos, coloco os protetores auriculares e faço o meu melhor para tentar dormir.

Não, na maioria das vezes não funciona.

Mas essa é a tradição e não posso perdê-la.

Tromsø é uma linda cidade no norte da Noruega, relativamente grande, se você é bom em geografia - ao contrário de mim -, verá que no norte do país estão as cidades mais frias. Embora não sejam tão geladas como Groenlândia, por exemplo, mas, hey, nós estamos no Ártico, certo?

E essa época do ano é a ideal pra esquiarmos, algo que eu sempre amei fazer enquanto estive aqui.

A casa de meus avós era igual a de todos os outros, de madeira. Todo ano minha avó costumava pintar o lado de fora, mas nos últimos anos, devido a saúde dos dois, ela manteve um vinho com branco, que combinava muito com o clima da neve e frio. A casa era perto de um teleférico que havia na cidade, se fizéssemos uma pequena caminhada, daria para ver no topo de uma colina uma parte incrível da cidade e bem perto dali, ocorria as luzes da aurora boreal.

Devo confessar que eu não estava tão fluente em norueguês e meus avós conversavam entre si em dinamarquês, o que realmente me deixava com um pouco de dor de cabeça. Mas papai sempre me dizia ao pé do ouvido o que estava acontecendo quando eles não tentavam falar inglês.

Meus primos, Stina e Søren moraram a vida toda ali. Eles eram gêmeos, de cabelo muito loiros e olhos escuros e pele quase albina. Stina fazia faculdade na Polônia, de Artes, enquanto Søren trabalhava com meu tio em sua fábrica de bebidas. Ambos eram fluentes em inglês desde pequenos, o que me ajudava a beça quando estava por lá.

- Olha como está linda! - exclamou Stina ao me ver, eles eram apenas dois anos mais velhos.

- Ei, pequena! Como está? - cumprimentou-me Søren, fazendo cafuné em minha cabeça. Todos eles eram muito altos, o que eu sei que devo ter puxado do meu lado materno a altura... entre muitas outras coisas.

Lá, todos bebiam Aquavit. É como uma vodka, muito gelada, mas, em minha opinião, mais gostosa e fácil de beber. Meu pai diz que é como o chá, na Inglaterra, ou Chimarrão, na América do Sul. Sem contar que é ótimo para se manter aquecido.

Durante o final de semana, eu tentei falar com Olívio algumas vezes, mas ele não respondeu a nenhuma mensagem. Provavelmente era sobre isso que ele dizia quando se referiu a não gostar de retiros.

Eu também não estava gostando nada.

Nós três passamos o final de semana no centro, a vida noturna ali era bem agitada e eu sempre gostei de como eu me sentia segura ali, mesmo quando estava sozinha.

Tínhamos combinado de esquiar dois dias após o Natal, se conseguíssemos sobreviver. Digo isso, porque sempre comíamos demais, passando mal no dia seguinte.

Está aí algo que puxei a minha família paterna, a fome eterna.

Nossa família não era religiosa, entretanto, era algo que fazíamos desde sempre e uma oportunidade de juntarmos a família inteira. E vovó sempre fazia comidas maravilhosas.

No banquete, havia peixes crus e cozidos com batata e legumes, que depois passavam na lenha, para assar.

Na manhã depois do natal, estava tudo muito tranquilo. Stina, Søren e eu estávamos na colina, deitados com nossos casacos grossos de pele que nos protegiam do frio e por baixo também usávamos jaquetas impermeáveis, junto de botas de neve.

Naquela época do ano, o sol não aparecia muito, entardecia cedo e a noite era muito, muito escura.

- Você está parecendo uma rena, trykk! - riu Søren, apontando para mim. Eu sentia o rosto gelado, tinha deixado a touca no quarto. Stina riu.

Meu nome é RonaOnde histórias criam vida. Descubra agora