Eu acabei passando o final de semana na casa deles, Eliza estava muito chateada e ficamos jogando e conversando.
- Quem precisa de um namorado?! - falava ela, vez ou outra. Dessa vez, enchendo a boca de pipoca enquanto assistíamos - ou tentávamos - um filme.
- Você falou que sua escola é um pouco ruim... mas você deve ter alguém lá. Não é? - perguntei, esperançosa, pois lembrava que quando eu estudava na escola pública as coisas realmente não estavam legais e só quem falava comigo era o 13. O nome dele era Horácio e todo mundo o chamava de 13, pois coincidentemente, era seu número da lista de presença.
Não que ele fosse ruim ou algo do tipo. Ele definitivamente tinha um IMC muito acima do esperado - e saudável - para nossa idade, usualmente estava com cabelos oleosos, tinha asma e uma tremenda baixo auto estima. Eu tinha dó dele.
A escola pode ser uma enorme ferramenta de aprendizado da vida. O ruim é que você tem que sobreviver ela.
- Eu tenho a Bridget. - resmungou ela. - Ela não se importa com a opinião dos outros, sabe? A mãe dele se divorciou e está com um cara 16 anos mais novo. - ela riu - Foi um tremendo bafafá na época e ela realmente se isolou. E o irmão mais novo dela é gay. O Brandon. Minha nossa, ele é demais! - ela se animou, começando a falar sobre eles e que iam ao shopping e fazer bobeiras juntos.
- Puxa... eu realmente preciso ir pra casa. - ri, olhando o relógio. Fábio tinha mandado algumas mensagens e eu me sentia mal em responde-lo ali.
- Obrigada. - agradeceu Eliza, me abraçando quando eu já estava saindo. - Você é a melhor irmã. Promete que será sempre minha amiga? Promete? Prometa! - ela me esmagou, com aquele corpinho pequeno e a voz ainda mais fina.
- Aí! - ri. - Eu prometo, prometo!
- Ok. Agora deixa ela em paz, psico. - disse Olívio, brincando e bagunçando o cabelo da irmã. - Vem, eu te levo. - ele abriu a porta pra mim e fomos em silencio até o carro.
- Estou acabada. - bocejei, me esticando no banco durante o caminho.
- Difícil. - disse. - Eu não sei se ainda te agradeci...
- Pelo que? - suspirei, com a cabeça virada pra ele mas de olhos fechados.
- Você sabe. - respondeu, eu abri apenas um olho, ele me entreolhou.
- Tá na conta.
Ele me ajudou a carregar a pequena mala de roupa suja até a porta do meu apartamento quando chegamos.
- Te vejo depois? - sorriu, me dando um beijo no rosto e acariciando meu cabelo.
- Eh, não sei. - ri. - Talvez.
A porta abriu, papai estava usando um avental e estava de bermuda, seu cabelo enorme num coque sujo de farinha no topo de sua cabeça, sua barba estava branca.
- Pai?!
- Ahá! Achei mesmo que fosse você. - sorriu, estendendo a mão para Olívio. - Você deve ser o irmão mais velho da Eliza, né? - meu pai nos entreolhou, ainda sorrindo.
- Sim, senhor. Prazer, Olívio. - ele apertou a mão de meu pai, mesmo estando suja de farinha.
- Er... pai, o que está acontecendo?
- Entrem, entrem. Cadê a Eliza? - indagou meu pai, olhando pra fora da porta.
- Ela não veio, quis ficar lá. - respondi, depressa. Meu pai fechou a porta atrás de nós.
- Bom, então ela não vai conseguir provar minhas deliciosas troxas de camarão, não é? - disse, colocando as mãos na cintura com a testa franzida. - Seu irmão está na Aline, pensei em fazer a janta mas estou com um probleminha... - o "probleminha" era que as "deliciosas troxas de camarão" não eram troxas, na verdade, não eram nada ainda. Apenas um monte de farinha, ovos e sei lá o que espalhados no balcão.
Lurdes teria uma convulsão com essa cena.
- Senhor Kerstin, eu.. - começou Olívio, vendo a cena.
- Ah, que é isso!? Pode me chamar de Haakon, garoto. - ele deu leves palmadas no ombro de Olívio que fez um "au" inaudível.
- Bom, Haakon, eu entendo de massa! Posso te ajudar. - ofereceu-se.
- Um chef! Será mais rápido, com certeza! - papai bateu novamente no ombro de Olívio, com um grande sorriso.
Olívio fazia as massas, enquanto papai colocava o recheio e eu as fritava.
- Cuidado, agora, Ron. Senão queima. - me alertava toda vez que eu colocava-as na panela.
Nós nos sentamos na mesa juntos para comer, papai ofereceu suco e refrigerante; "você não pode beber, vai dirigir" e papai só tomava vodka da América.
- O que acha de jogarmos umas cartas, uh? - sugeriu papai enquanto nós limpávamos a mesa e colocávamos a louça na lavadora.
- Pai, não. Olívio precisa ir, está super tarde.. - comecei dizendo, Olívio deveria estar ali a contragosto mas só tinha educação demais para recusar ou se mandar.
- Mas eu adoro baralho! - retrucou Olívio, juntando as sobrancelhas. Nós nos entreolhamos, ele com um sorriso divertido.
- Viu, só? Bobagem! É bom ter um rapaz aqui de vez em quando. - ele frisou o "de vez em quando".
Papai ensinou Olívio um jogo de cartas que sempre joga com meu irmão e, mesmo nunca tendo jogado antes, Olivio ainda conseguia ganhar dele. Notei que papai já estava emburrado.
"Melhor deixar ele ganhar alguma lol" mandei para Olívio, torcendo para que seu celular estivesse sem som. Estava. Ele leu a mensagem, segurando o riso.
"Ok"
- E então... você cuida de tudo para seu pai, não é? - começou papai, numa nova rodada.
- Sim. Hoje diria que meu pai apenas caça os talentos e eu cuido do resto. Ele, claro, também lida com muita parte burocrática de contratos...
- Bom, e no futuro? Continuará com os negócios para ele? - perguntou meu pai, animado com a partida.
- Não sei.. acho que não. Gostaria de morar na Dinamarca ou Bélgica. - essa era nova.
- Interessante... - disse papai, pensativo.
- Você sabia que esses países tem os melhores salários para professores? - ele me olhou, sorrindo.
- Puxa! Olha, Ron, que curioso. Rona quer ser professora. - anunciou meu pai.
- É uma profissão incrível. Quem sabe a gente não acaba se encontrando, né? - disse, casualmente, terminando de comer.
Olívio ainda ficou em casa, ajudando a guardar a louça. "É o mínimo que posso fazer para retribuir", disse, quando meu pai agradeceu.
- Eu acompanho você até o portão. - anunciei, quando ele se despediu de meu pai.
- Foi muito bom lhe conhecer, volte quando quiser. - despediu-se papai já indo para seu quarto.
- Seu pai gostou de mim. - gabou-se Olívio quando chegamos no portão.
- Espera ele saber que você namoraria a filha dele. - ri, erguendo as sobrancelhas em seguida. Ele sorriu.
- Namoraria?
- Não. Quer dizer... um dia, talvez? Não sei. - gaguejei, nervosa, enrolando a ponta do meu cabelo. Ele riu alto.
- Eu acho que namora sim. - sussurrou, fazendo os pelos de meu pescoço arrepiar e mil borboletas voarem em minha barriga.
- Boa noite. - sorri, desajeitada.
- Boa noite. - despediu-se ele, dando um beijo na minha mão e indo até o carro.
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Meu nome é Rona
RomanceEla, de classe média alta que vai ter sua vida mudada após o início do seu último ano no ensino médio. Com novas amizades, novas oportunidades e descobertas sobre ela mesma pela frente.... Em qual estrada ela vai parar?