o que aconteceu

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- Olá, querida. Hm... alguém estava comendo lasanha de berinjela! - ela sorriu ao entrar no quarto, senti meu estômago roncar de fome. Ela se aproximou de mim, com seu sorriso tranquilizante. - Dor de cabeça?

- Só um pouco...

- Náuseas ou ânsia de vômito? - eu respondi negativamente com a cabeça. - Certo. Vou lhe explicar o que aconteceu, está bem? - o silêncio na sala era quase paupável. - Você bateu sua cabeça bem forte, provavelmente, na porta do carro. O que causou um trauma cranioencefálico... uma concussão. - completou ao ver minha cara de quem não estava entendendo nada. - E, às vezes, quando se bate a cabeça do jeito que você bateu, nossas células cerebrais são danificadas. Não dá pra saber muito bem como vai ser até a pessoa acordar... você está acompanhando?

- Sim.. - todos entreolhavam a doutora e eu, apreensivos. - Mas eu me sinto bem... minha bunda dói. - Eliza riu.

- É normal, já que está há muito tempo deitada, terá que ser cautelosa por enquanto.

- Eu... eu já posso ir pra casa? - senti meu rosto esquentar e meus olhos encheram de lágrimas, Olívio veio ao meu lado, segurando em minha mão.

- Receio que ainda não, querida. É importante acompanharmos quanto tempo você fica... bom, dormindo. - ela pareceu escolher as palavras com muito cuidado, olhando para meu pai e Olívio. - Eu vou deixá-la com sua família para que possam conversar, mas antes preciso só dar uma palavrinha, está bem? - papai e Olívio acompanharam-na para fora do quarto.

Eliza estava ao meu lado, sentada na beira da cama.

- Você está linda... - sorri, pegando nas pontas de seu cabelo castanho, que costumava ser rosa. Ela sorriu, acariciando meu braço.

- Estou muito feliz que está aqui, Ron... quero dizer, quero que fique bem.

- Você não vai chorar, vai? - sussurrei, enquanto minha garganta ainda ardia, ela riu, jogando o cabelo pro lado.

- Não seja sonsa! - riu, me dando um beijo na bochecha. Ela estava realmente mudada, parecia uma jovem mulher.

Olívio e papai entraram no quarto.

- Estou com fome. - anunciei, assim que entraram. - Olívio sorriu, mexendo em seu cabelo e por uns instantes ele voltou a ser o Olívio que eu lembrava.

- Olívio pediu para que trouxessem seu jantar. - papai acariciou minha mão, que não estava mais engessada e Eliza deu espaço para que Olívio sentasse ao meu lado.

- O que foi? Está tudo bem... e você? Está bem? - minha voz ainda saía esquisita, falhada. - Você também se machucou? - perguntei ao Olívio, que me olhou em silêncio, preocupado.

- Você se lembra que falei sobre o show beneficente?

- Sim, disse que fomos ao show.

- Não, meu amor... você foi. - corrigiu-me, acariciando as costas de minha mão. Eu tentei lembrar, sentindo um incômodo na cabeça.

- E o que aconteceu? Me conta.

- Eu tinha acabado de virar a esquina quando vi Fábio fechando a porta do carro com você lá. Achei que tivesse esquecido que eu ia te buscar e... - eu notei que ele ficava mais nervoso. Eliza estava sentada no fundo do quarto, com as mãos entrelaças e olhando pro chão, papai tinha linhas de expressão na testa, preocupado. - ele viu que eu estava logo atrás e eu estava tentando te ligar e.. você atendeu e parecia muito diferente, sua voz estava... não parecia você e ele jogou seu celular pela janela... foi, foi tudo muito rápido. - suas mãos estavam cerradas, sua testa franzida. Eu não lembrava de absolutamente nada.

- Fábio... Fábio me drogou? É isso? Tem certeza que foi ele? Será que eu não...

- Foi ele. - interrompeu-me, ríspido. - O sonífero estava no quarto dele, revistaram a casa dele depois de... de tudo. - ele segurou minha mão, firme.

Eu tentava assimilar tudo que acabara de escutar, não fazia sentido. Fábio não faria isso.

- Ele estava fazendo terapia há uns anos. Foi por isso que os pais se divorciaram. - Eliza falava no fundo. Olívio e papai não pareciam surpresos, o que diz que eles já deveriam saber. - Ele tinha transtorno de personalidade com traços de sociopatia. Ele tomava o remédio para ajudar a dormir... - ela ainda encarava o chão.

Alguém bateu na porta e Olívio se adiantou para abri-la, era alguém da equipe do hospital com um carrinho que logo encheu o quarto com um cheiro maravilhoso.

Era salmão defumado, com batatas e vagem assado. Meu estômago roncava e, enquanto eu comia, todos ficavam em silêncio e eu processava tudo que tinha acabado de escutar.

- Então... Fábio... - comecei, tomando meu suco de laranja em uma só golada. - O que ele queria? Alguém sabe?

- Nem ele devia saber... - disse Olívio, ainda sentado ao meu lado.

- Acho que depois do divórcio ele deve ter se apegado em você... sei lá. - suspirou em lamento, Eliza.

- E... onde ele está? Ele também se machucou? - perguntei, tentando imaginar Fábio fazendo tudo aquilo.

- Sim. - respondeu Olívio. - Mas... você não precisa se preocupar com ele.

- Não estou preocupada. - respondi, séria. - Onde ele está?

- Ele... - Eliza falava baixo. - Ele teve morte cerebral faz duas semanas. - uma água fria parecia ser jogada em meu corpo, com diversos cubos de gelo.

Eu lembrei de quando íamos ao shopping, quando cantávamos gritando em seu carro quando ele nos dava carona depois da escola, como se sentia mal com sua mãe sozinha.

Machuca ver que as pessoas que a gente acha que conhece, são pessoas que nós passamos a não reconhecer.

E eu não sentia raiva dele enquanto as lágrimas caíam em meu rosto.

Meu nome é RonaOnde histórias criam vida. Descubra agora