acordada

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Eu não lembro de quando fui dormir, sei que ao acordar, verifiquei que minhas unhas ainda estavam rosa. O que significava que eu não deveria ter dormido tanto tempo.

Olívio dormia desajeitado na poltrona ao meu lado, tinha uma enfermeira no quarto, que olhava minha ficha e escrevia algo. Ela sorriu para mim ao me ver acordada e se retirou do quarto.

Eu estiquei minha mão, tocando o cabelo de Olívio, que acordou assustado.

- Desculpa. - pedi, ele olhou no relógio e suspirou, aliviado.

- Você dormiu 9 horas e 13 minutos. - ele sorriu, me dando um beijo na bochecha.

- Que dia é hoje?

- 27 de abril. - abril?!

- Abril?! Puta que pariu! Abril? - o bip bip perdia o ritmo, soando acelerado. Olívio acariciou meus ombros.

- Shh... shh. Se acalma!

- Estamos... estamos quase em maio. E.. e a escola? Meu Deus... meu aniversário! - eu comecei a chorar, sentindo um grande peso em meu peito e minha garganta fechando. Ele me abraçou, com o cheiro cítrico e de menta.

- Relaxa, meu amor. - ele sentou ao meu lado. - Seu colégio sabe o que está acontecendo. Você já estava com as notas mais altas, não tem com quê se preocupar, está bem? Nós só queremos te ver bem...

- Eu quero ir embora daqui... por favor. - disse, ainda choramingando, ele juntou as sobrancelhas, beijando minha testa.

Olívio chamou a Dra Alvez, que apareceu alguns minutos depois com um largo sorriso.

- Olha só! - ela sorriu, pegando minha ficha. - Como está se sentindo, querida?

- Com dor na bunda. - respondi, irritada. Olívio pareceu se desculpar com o olhar para a doutora, que riu.

- O que acha de darmos uma volta, uh?

- Ela pode?

- Eu posso? - indagamos em coro.

- Sim. Com cuidado.

Eles me ajudaram a levantar, o soro já não estava mais em meu braço, o que ajudou bastante. Olívio ajeitou seu braço em minha cintura, segurando o longo roupão de hospital, enquanto nos três saíamos da sala.

Minhas pernas estavam um pouco rígidas, tinha vários hematomas como pequenas bolas roxas, eu olhei no espelho do corredor, parando ao ver meu reflexo.

Meu cabelo, tão preto e liso estava todo emaranhado, meu rosto era de um pálido arroxeado, meus olhos estavam mais claros do que nunca. Eu parecia muito mais magra, havia hematomas em meu pescoço, iguais aos da minha perna, que ardiam um pouco ao tocar. Meu braço, antes engessado, tinha uma grande cicatriz atrás, perto do cotovelo. Olívio beijou meu rosto, com um sorriso muito preocupado.

- Está se sentindo bem?

- Eu... não parece comigo. - suspirei, triste vendo meu reflexo.

- Não vá colocar besteira na cabeça, Rona. - pediu ele, me afastando do espelho.

Nós retornamos ao quarto, com uma Dra Alvez muito orgulhosa de si mesma.

- Ótimo, muito bom. Sente-se tonta? Com dor de cabeça ou enjoada?

Eu sentei na poltrona onde, aparentemente, vinha sendo a cama de meus hóspedes. Eu olhei minhas mãos, meus dedos finos, pálidos e de unhas rosadas.

- Estou bem. Posso comer algo? Quando eu vou embora?

Olívio sentou no braço da poltrona, ao meu lado.

- Bom, vamos acompanhar hoje e amanhã? É bom que se manteve acordada e conseguiu descansar em um tempo bem razoável mas só para termos certeza que está bem para ir para casa. - ela escrevia na prancha. - Quanto sua alimentação, está livre, querida. - ela sorriu. - Pode comer o que quiser, mas seja cautelosa, não vai querer sobrecarregar seu organismo que está bem debilitado aí dentro, ok? Vou deixá-los sozinhos, passo a noite pra vermos como está. O banheiro é aqui. Agora que está se sentindo melhor, pode tomar seu banho sozinha, está bem? - ela se despediu, saindo do quarto e fechando a porta delicadamente.

- Eu quero batata frita e milkshake. - disse, assim que ela saiu, Olívio riu.

- Eu já pedi para Eliza trazer antes mesmo de ela ir embora! - disse ele, me ajudando a levantar.

Ele ficou comigo enquanto escovava os dentes e tomava banho, me ajudando a lavar o cabelo, eu reconheci o cheiro cítrico de Olívio no shampoo. Meu coração ficou apertado, eu lhe dei um beijo, molhando seu rosto.

- Você ficou todo esse tempo aqui?

- Claro. Aonde mais eu iria? - ele sorriu, me ajudando a prender a toalha no cabelo.

Mais de quatro semanas dormindo na poltrona, comendo comidas requentadas ou de hospital. Eu o abracei quando terminamos de me secar. Eu o senti fungar, com o nariz congestionado. Suas lágrimas quentes caíam em meu ombro.

- Você não sabe o quanto eu agradeço por ter estado com cinto de segurança, Rona. - ele secou seu rosto com as costas da mão, passando as pontas de seus dedos na fina cicatriz transversal em meu peito.

Quando Eliza chegou, disse que era hora das garotas, se Olívio podia "fazer alguma coisa de homem pra lá". Olívio se despediu, depois de comermos as fritas e terminarmos o milkshake enorme.

- Quer um spoiler? - disse Eliza depois de alguns minutos, enquanto cortava meu cabelo (e muito bem!).

- Não é sobre uma garota que sofre um acidente e perde um pouco da memória, né? - ela riu.

- Não! Ok... Olívio tinha comprado passagens para passar o spring break em Paris! Sabia disso? Ele estava querendo comemorar seus dezoito anos lá. - eu suspirei, meu aniversário tinha sido no mês anterior e eu não pude comemorar meus dezoito anos de idade. - Ei! Paris! Tá prestando atenção?

- Oi... sim. Estou.

- Pois ontem enquanto a princesa adormecida está bem aí, ouvi ele falando com a cia sobre reagendar os bilhetes. Acho que alguém vai viajar em breve. - disse, animada.

- Ei, será que eu mandei minha aplicação para a faculdade?

- Não. Mas Olívio já se encarregou disso. Quero dizer, papai quem se encarregou. Já está tudo resolvido também. - ela penteava meu cabelo, que agora estava um pouco abaixo do ombro, seco e liso.

- Seu pai?

- Sim... não se preocupe. Meu pai queria muito ajudar. Acontece que naquela noite, Olívio passou em casa rapidamente e papai discutiu com ele.

- Discutiu? Sobre o que?

- Ah... sei lá, coisas que não importam agora. - ela tirava o esmalte de minhas unhas.

- Sobre o que? - insisti, ela revirou os olhos.

- Provavelmente dinheiro, não sei. Eu ouvi papai reclamar que não queria um filho pobre trabalhando como chefe. - senti meu coração apertar e um nó na garganta. - Ei... relaxa, tá? Muita coisa mudou. Papai quis pagar toda sua despesa hospitalar, ajudou Olívio junto do seu pai a arrumar um lugar para que Olívio possa abrir um restaurante perto do apartamento onde irão morar lá.

- O apartamento... lá. Já tá fechado?

- Você não lembra? Acho que foi na mesma semana que se mudou. Enfim...

Eu juntei minhas mãos, segurando nas mãos dela.

- E como você está? Está bem? - perguntei, ela me olhou, com seu brilho dócil e jovial mas com alguma tristeza.

- Estou triste que ficarei sozinha, Ron...

- Ei, você sempre pode ir nos visitar. - sorri, jogando o cabelo dela pra trás. Ela me abraçou.

- Ainda bem que a gente não perdeu você. - disse, ao me soltar.

Nós passamos a noite assistindo filmes, como fazíamos quando eu dormia em sua casa, pintando e repintando nossas unhas, até a hora de dormir, em que dividimos a mesma cama.

Meu nome é RonaOnde histórias criam vida. Descubra agora