Perante à vista de outros, eu era um homem frio e calculista; incrivelmente desprezível, e, sem um pingo que seja de amor ao próximo. Retratado - merecedoramente - 99,9% das vezes com um cubo de gelo no lugar de coração, e trejeitos impenetráveis. O que em termos não era de um todo mentira. Como eu sempre costumo dizer: melhor agir com a razão, com a lógica, e, com fatos, do que com a emoção. Diferentemente dos outros seres humanos.
Entretanto, algo em mim havia mudado. Já não era Sherlock Holmes, o sociopata altamente funcional que tanto fazia questão de mostrar ser, e, isso ficou claro para mim nesses últimos três meses que me vi sozinho na 221B da Baker Street.
Tudo agora estava terrivelmente confuso, nem a morfina e metanfetamina conseguiam fazer entender o que de fato estava acontecendo comigo. Mas ao longe um par de olhos verdes sempre apareciam na confusão de meu palácio mental.Sinto o calor de duas mãos segurarem meu rosto, e ouço aquela voz que me salvará do abismo inúmeras vezes. Como um sopro de vida abro meus olhos com ansiedade e lhe vejo... O rosto de John Watson à centímetros de distância do meu, seu hálito quente próximo demais de minha face, e seu perfume - aquele cheiro próprio que só John Watson tem - chega em ondas severas até meu olfato. Forço meus olhos se a manterem abertos, porque seria inaceitável perder qualquer segundo olhando para ele.
John parecia preocupado, estava com os olhos marejados, e o lábio inferior tremendo levemente nas laterais. Seus cabelos louros estavam mais grisalhos, e seus olhos tinham um ar extremamente cansado. Parecia triste, e eu faria qualquer coisa ao meu alcance para tirar aquela tristeza de seu semblante.
-Sherlock, me ajude a lhe colocar na banheira. -Ele diz próximo demais de meu ouvido esquerdo, e entendo então que estava nu em sua frente. Obviamente que meu estado de abstinência era tão grande que isso era um mero detalhe para mim, mas conhecendo John Watson como eu conhecia, sem dúvidas aquilo estava sendo deveras constrangedor para ele.
-John, fique olhando para meus olhos... -Digo reunindo toda a força que conseguia, para ajudar John a me levar até a banheira sem maiores danos para ele. Sustento o olhar de Watson, sem ao menos piscar, e fora ali que encontrei forças, naquele mar de águas verdes.
Não lembro de muita coisa, só fragmentos de passos pela casa, e mãos massageando meus cabelos molhados. Sinto meu corpo cair em algo deliciosamente aconchegante, e tudo foi engolido pela escuridão.
Era um lugar diferente, fisicamente impossível de existir, demorei alguns segundos para entender que era um sonho, pelo tanto de luz e névoa que consistia o ambiente. Eu flutuava no alto de uma colina, conseguia ver ao longe um trem à vapor, vindo preguiçosamente por trilhos igualmente flutuantes, algo em mim insistia em ir até o trem, porque lá estavam as respostas para algumas perguntas que eu nem ao menos sabia quais eram.
Começo então a pular de nuvem em nuvem indo em direção as respostas que estavam naquele trem vermelho, era torturante, pelo fato de saber que aquilo tudo era impossível, mas a curiosidade me tomava para si e eu nunca fui de deixar pontas soltas.
Sigo pulando entre nuvens, até enfim ficar a poucos metros do trem. Meu coração rapidamente começa a palpitar com uma ansiedade ilógica... Pois estavam ali, no terceiro vagão daquele trem vermelho, as repostas que eu procurava, mesmo não sabendo quais eram as perguntas. Assim que toco minha mão na porta do vagão, ela se abre tão facilmente que mal percebo meus movimentos... Assim que a porta se vê devidamente aberta, vejo então, um par de olhos verdes, tão escuros que se camuflavam com o papel de parede florestal do vagão.-John... O que faz aqui?
-Você sabe Sherlock... Só preciso que me responda uma pergunta...
E um barulho inesperado me trás de volta à realidade e isso me deixa absurdamente Frustrado e confuso. Não era possível que nunca descobriria qual seria a tal pergunta, nem mesmo se voltasse ao meu palácio mental.
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Aprendendo a Amar (Em Revisão)
FanfictionApós a Morte de Mary, John Watson decidiu que se afastar de Sherlock Holmes era a unica forma de seguir sua vida. Porém, a vida é surpreendente.