CAPÍTULO 23 - Cervejação

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Felipe.

Eu não tenho certeza de como cheguei em casa ou se bati o carro ao longo do caminho, eu só sei que quando me dei conta do que estava fazendo, eu estava parado no meio da minha sala, rodeado de ideias de matérias e layouts de páginas grudadas em minhas paredes.

A verdade é que fazia tanto tempo que eu estava naquele ritmo insano de editorial que eu não conseguia me lembrar o que eu costumava fazer quando não estava trabalhando.

De verdade, eu sempre fazia uma viagem ou passava um tempo com minha família, mas eu não me sentia no clima de nenhuma das duas opções, afinal o que eu faria em um lugar diferente se eu não sabia se teria emprego em um mês? Ou o que eu falaria para minha família quando me perguntassem do trabalho?

Eu me sentei no chão e coloquei minha cabeça entre minhas mãos, tentando entender como eu havia parado naquela situação. Como a Geórgia poderia sequer pensar aquilo de mim?

Peguei meu celular algumas vezes para pedir demissão e aceitar a outra vaga, mas sempre que eu via aqueles números no chamador, minhas mãos voltavam a tremer incontrolavelmente e eu tinha que desistir.

Eu só queria ser uma pessoa um pouco mais filha da mãe com os outros para realmente ter feito o que havia sido acusado, mas eu não era. Eu não era nem mesmo quando havia sido expulso do meu local de trabalho.

Respirei fundo e larguei meu corpo no chão, olhando a pintura ao redor do meu pequeno lustre descascar e o meu celular começar uma sinfonia de ligações em looping.

Naquele momento eu não queria falar com ninguém.

No entanto, pelo jeito eu não teria paz nenhuma, então apenas desliguei o aparelho até ter um pequeno silêncio contemplativo.

Um mês.

Eu poderia escrever um livro, aprender a tricotar, tocar flauta e até mesmo começar e terminar uma nova faculdade. Eram trinta dias para rodar um apartamento de cinquenta metros quadrados. Pelo menos minha sacada tinha uma vista bonita.

Droga, eu precisaria controlar meu consumo de Eugências, senão na primeira semana meu fígado iria falhar e os sinais do alcoolismo apareceriam.

Eu poderia começar e parar de fumar.

Deus, se eu quisesse poderia até...

Meu interfone tocou e eu tinha certeza que era o Seu Jairo para reclamar que eu estacionei mal o meu carro e estava impedindo a saída da sua motoca.

Eu esperei que ele se cansasse de reclamar comigo, porém assim que o interfone parou de tocar, ele apenas voltou. Aparentemente o Seu Jairo estava com muita vontade de sair com a sua máquina de aquecimento global portátil, porque ele me ligou logo em seguida. E depois. E depois.

Depois de mais de dez minutos que eu estava tentando focar em elevar o meu espírito, a ira dentro de mim venceu e eu berrei contra o aparelho:

— Passa por cima do carro, porra! — eu estourei e me arrependi logo em seguida, pois eu gostava daquele bom senhor e apenas a ideia que eu proferi uma palavra tão baixa para uma alma tão boa me fez sentir um arrependimento amargo e cruel — eu sinto muito, eu já vou descer e...

— Só libera a entrada, Fê! — Malu me pediu e eu parei onde estava, encarando os números desgastados do meu interfone.

— Eu... não estou em um dos meus melhores momentos agora — confessei com toda a coragem que eu consegui — e eu não quero falar sobre hoje.

— Não precisa falar. Eu trouxe a minha máscara de blueberry, a Camila comprou um engradado com doze Eugências de um tal de Mautavo e a gente trouxe o seu filme preferido — ela continuou falando, sua voz um pouco mais aguda do que o normal.

Amor em Revisão (Concluído).Onde histórias criam vida. Descubra agora