Condenado

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  Não vi as aulas passarem, na verdade, mas senti todo o tempo o olhar silencioso e reflexivo de Pete sobre mim. Sentávamos lado a lado e ele era o único que se aproximava, ninguém arriscaria a tanto.

Eu sabia que ele era sensível o suficiente para saber que eu não estava a fim de conversa e que o melhor era me deixar quieto, ainda assim, eu sabia que ele ardia para falar comigo e ser de alguma ajuda. Pete sempre se preocupava demais com as pessoas que ele considerava próximas e eu estava naquele círculo a tempo demais para desvincular agora.

Os anos que passamos longe aparentemente não mudou em nada aquilo.

Eu ia fazer algum comentário espirituoso se estive no clima, acontece que não era o caso.

Quando o sinal bateu, eu me ergui e ele segurou meu punho rapidamente:

— Não vá. Não sei o que pretende fazer, mas não faça, Tin.

Eu o encarei firme e levemente surpreso.

Ele devia ter juntado muita coragem para agir daquele modo. Nos olhos dele explodia preocupação.

— Não vou fazer nada ilegal, Pete. Eu voltei com o Can, vamos sair.

Ele me soltou, mas era como se não fizesse. Havia uma nevoa sombria ao seu redor:

— Eu ando tendo sonhos estranhos com você. Estou preocupado.

— Sonhos estranhos... – Repeti irritado. Que ótimo, Pete também andava flertando com o sobrenatural? – Já me falaram sobre Tarot ontem e agora você com sonhos. É para rir?

— Tin.

Ele me encarou ainda mais firme e eu suspirei assentindo de leve e instintivamente dando um tapinha de leve na cabeça dele:

— Respira e vai relaxar com o seu trogloditinha, ok? E pare de assistir filmes de terror, isso está afetando seu cérebro.

— O nome dele é Ae, Tin.

Pete finalmente riu baixinho e eu relaxei. Ótimo, já bastava eu em clima de problemático, não queria ele também naquele humor.

— Claro, claro, seu programa tailandês tem um nome, grande fato.

— Por favor, não faça nada imprudente.

— Sinto que estou ouvindo minha esposa nesse momento.

Era para ter soado cínico, mas soou irritado mesmo. Pete riu mais alto, e para nossa sorte a sala já estava vazia.

— Se eu fosse sua esposa, Tin, você estaria em grandes problemas.

— Oh, é mesmo! – Estreitei os olhos, Pete soltando as garras, hein!? – Seu trogloditinha sabe sobre isso? Pobre John.

Troquei por um nome genérico americano de propósito, mas Pete sabia que eu ia fazer algo do tipo e balançou a cabeça suave:

— Não faça nada imprudente, por favor.

Ele repetiu ignorando minha ironia e eu saí da sala rolando os olhos.

O que ele estava pensando? Sonhos? Sério?

Dirigi até o Campus do Can e sai do carro para esperar ele do lado de fora e ao mesmo tempo tomar ar e relaxar o meu humor. Eu não podia ir à casa dele naquele clima, não era assim que eu queria encontrar minha sogra.

Não estava nos meus planos parecer assustador e sim um simpático aluno genial do IC.

E então eu o vi vir em minha direção e notei surpreendentemente que aquele Can... Caminhava completamente seguro de si e do entorno.

TinOnde histórias criam vida. Descubra agora