Estrada

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  Cheguei próximo do parque realmente exausto e querendo apenas cama e descanso. Eu sabia que havia bangalôs na região mais ao norte e pretendia encontrá-los. Yao e Phu dormiam enquanto na estrada precária que eu percorria, tudo era escuridão.

E silêncio.

Não havia internet ali, nem sinal telefônico. Eu dirigia por puro instinto e evitava pensar que quando Pete soubesse que ao invés de sair da cidade, eu praticamente saí do país, ele poderia me devorar vivo em fúria suprema.

Suspirei e contornei mais uma curva quando vi uma placa quase escondida pela floresta que cercava ambos os lados da estrada rústica, o aviso de animais silvestres.

Quase ri sozinho.

Eu estava em área imensa e selvagem há horas. Aquela placa deveria estar a quilômetros anterior ao ponto em que eu estava...

Continuei dirigindo e dirigindo em horas que pareciam se arrastar por dias. O tanque que eu enchi de novo no último posto com pessoas, foi ainda em área tailandesa e por isso me preocupava o tanque estar batendo quase no vazio e eu ainda não ter saído da área de floresta fechada. Já era para ter chegando no vilarejo que beirava o parque de área protegida... Já era para ter chegado lá a muito tempo...

Mas tudo o que via ainda era floresta e floresta em uma estrada que parecia não ter fim.

Acabei encostando quando a madrugada ameaçava ser iluminada pelas primeiras sombras da manhã e suspirei, saindo do carro para respirar um pouco e tentar algum sinal mesmo que eu soubesse que não haveria nenhum.

Ergui o celular como um tolo perdido e acabei pisando na mata lateral e sentindo... Meu corpo resfriar absurdamente e em segundos.

Ergui os olhos com um péssimo pressentimento e vi a loira dos meus sonhos pós coma vestida toda de branco e descalça a poucos metros de mim. Ela não disse nada, nem eu. Ficamos nos encarando até que ela me deu as costas...

E meus pés a seguiram contra a minha vontade.

Que merda era aquela!?

Eu quis esbravejar, mas não consegui e depois de certo tempo me vi saindo em um espaço mais aberto e diante de um portal de ruínas bem conservadas com marcas únicas que eu já tinha visto em algum lugar.

Olhei ao redor com mais atenção e por fim vi ao longe os edifícios antigos... De Angkor.

— Impossível!

— Você dirigiu até aqui, meu lorde – A assombração de branco finalmente falou comigo parando ao meu lado e olhando para o mesmo arco – Em outro mundo, em dias passados, sua primeira neta que ainda nascerá, morreu diante desse portão. Ela se transformou em chuva e foi levada pelo poder universal que atravessa os mundos até uma nova casa – E nisso ela me olhou fixa – Não sou a bruxa que conheceu naquele dia, eu sou um espírito que ainda vaga por esse mundo se desfragmentando em alivio por poder voltar a me libertar e renascer. Em minha última vida me chamavam de Dama. Em minha última vida... Eu também morri em água e estou aqui para lhe proteger na primeira de infinitas vezes. Eu renascerei como sua filha, meu senhor, e você me chamará de Maria. Eu que morri em água, renascerei de um homem e trarei a vida a chuva que regará esse mundo. Eu serei um dos seus mais infalíveis escudos.

— Impossível!

Disse entre os dentes me afastando dela que não se moveu. Eu vi o corpo dela direito e percebi que era translúcido, e ficava ainda mais etéreo com o dia nascendo à nossas costas...

— Eu estou me fundindo aos poucos a alma dela, em breve seremos uno – Ela se voltou para mim e sorriu – Você a amará e ela a você como nada nem ninguém antes ou depois se atou nesse mundo. Será um laço de pai e filha inexplicável. Sentirá, quando sentir. Eu lhe trouxe até aqui, porque aqui terminou para todos nós, e começará para todos nós. Eu queria que soubesse... Que mesmo que não acredite em magia, ela acredita em você e você, meu senhor, foi o escolhido para protegê-la nesse mundo e guardá-la.

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