A recepção na casa da tia foi muito acolhedora. Karen foi recebida efusivamente pela tia, que queria saber todas as novidades, e depois de uma longa conversa, Karen subiu ao seu quarto para descansar.
Estava tão exausta da viagem que nem prestou atenção ao quarto, jogou as malas ali mesmo no chão, revirou em busca de uma roupa confortável, e entrou no toalete para um banho relaxante.
Karen parecia uma criança emocionada ao olhar a luxuosa banheira, que a tia fazia questão de manter em todos os quartos... a muito que só tomava banho com água tirada do poço com balde, ou quando muito, em um chuveiro com água gelada, e aquilo era um regalo que nem em seus sonhos pensava experimentar.
Karen ligou a água e começou a preparar um relaxante banho de espuma. Enquanto esperava a banheira encher, ficou embasbacada com o gigantesco espelho a sua frente.
Ao olhar sua imagem refletida, só então reparou o quanto estava abatida. Sua pele, geralmente dourada, estava agora de um tom ocre, e seus olhos, rodeado de olheiras profundas, tinha um ar sombrio.
Karen desligou a torneira, despejou na banheira sais de banho perfumados, depois entrou na água, deixando que a espuma perfumada envolvesse seu corpo cansado e dolorido. A sensação era tão boa, que Karen acabou pegando no sono ali mesmo.
Uma forte pancada em sua cabeça a fez acordar. Não estava mais no banheiro luxuoso da mansão, estava encolhida num canto sujo de um barraco, junto de um garotinho, e os dois se encolhiam e choravam assustados.
Um homem assustador a agarrou pelos cabelos e a arremessou contra uma parede. Sua visão escureceu por instantes, ainda assim viu quando o garotinho pulou sobre o homem, que o agarrou e começou a torturá-lo com a ponta de um cigarro aceso.
O homem ria malignamente, enquanto o garoto tentava resistir. Karen começou a chorar histericamente, então percebeu que o vulto do homem crescia diante de si. Aquelas mãos horrendas agarraram seu pescoço e começaram a sufocá-la.
Karen tentava puxar o ar para seus pulmões, mas uma ardência descia por suas vias respiratórias, atingindo em cheio o seu peito. Tentou se debater, mas sentiu suas forças se esvaindo, e seus movimentos eram agora leves espasmos de um agonizante.
Não sentia mais nenhum cheiro, nenhum som, era como se seus sentidos tivessem sido arrancados de si. Abriu os olhos, e sua visão estava turva, como se estivesse dentro de um aquário. Tentou respirar, e nova ardência invadiu seus pulmões, então percebeu enfim o que estava acontecendo, e reunindo seus últimos resquícios de forças, deu um impulso, pulando pra fora daquele aquário psicodélico.
Com o coração descompassado, Karen segurou nas bordas da banheira, e começou a tossir convulsivamente, expelindo a água que estava em sua garganta. Tossiu tanto que pensou que seus pulmões estourariam, então, pouco a pouco, foi recuperando os sentidos.
A água da banheira já estava gelada, e a pele de seus dedos estava enrugada. Olhou em volta, atordoada, e percebeu que ainda estava no banheiro da mansão, e que tudo não tinha passado de um sonho absurdo.
Essa não era a primeira vez que tinha um sonho como esse. Não sabia explicar de onde ele vinha, se eram frutos de sua imaginação, ou talvez reflexos de uma vida passada... só o que sabia é que nunca tinha visto seus personagens na vida real, mas era sempre o mesmo homem, e o mesmo garotinho.
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Caleidoscópio
RomanceKaren volta ao litoral, para tentar desvendar seu passado, e para isso, vai contar com a ajuda do puro e singelo amigo Felipe, mas não imagina que está abrindo uma verdadeira caixa de pandora que irá abalar a sociedade litorânea!