Capítulo 18

633 172 59
                                    

AURORA

Caminho pelas ruas íngremes de Porto Real. Está no fim da tarde, o sol se escondendo sob as nuvens. O céu ganha uma cor de vermelho-alaranjado, os pássaros voam para seus ninhos e as pessoas para suas casas depois de um longo dia de trabalho.

Suspiro profundamente, sentindo a brisa acariciar meu rosto e esvoaçando as longas ondulações castanhas do meu cabelo.

Paro em frente ao cemitério e demoro alguns minutos antes de entrar no lugar vazio, exceto pelas covas rasas. Sinto meu estômago se revirar dentro de mim, enquanto meus pés me guiam para o lugar agora conhecido. Não vim aqui desde o enterro do meu pai.

Michael, observo seu nome entalhado de prata. Deveria ter vindo em um outro horário, mas eu quero vê-lo. Sinto que preciso fazer isso. Logo, coloco a rosa em frente ao túmulo dele à medida que me sento no chão gélido. Fico apenas observando o lugar. Já faz um mês desde que ele foi enterrado.

Um mês...

— Pai. — Murmuro com a voz embargada. Meu peito despedaçado pela falta que ele faz — Queria que você estivesse aqui. Queria tanto. Eu penso em você todos os dias... Eu tenho tantas coisas a dizer. Queria que você conhecesse minha melhor amiga. Ela é tão linda e gentil. Você iria adorar conhecê-la.

Um pequeno sorriso brota em meus lábios mesmo em meio ao choro. Às palavras estão todas embaralhadas em meu peito.

Mas ainda assim...

— Tento tanto medo de esquecer a sua voz, seu rosto, quem você é.

Limpo uma lágrima que desce pelo meu rosto.

— Quero que você saiba que eu estou tentando. Tô tentando! — Passo o polegar pela minha bochecha úmida. Levo a mão ao peito. Em minha garganta há um nó. Minha visão começa a ficar embargada pelas lágrimas — Queríamos que tivéssemos mais tempo. Se você não tivesse ido trabalhar aquele dia... Você ainda estaria comigo. Tudo poderia ter sido diferente.

As palavras jorram de minha boca. Os pensamentos frenéticos em minha cabeça. Não consigo controlar o choro, que fica cada vez mais alto e angustiante.

Não adianta ficar pensando nisso. Eu sei. Mas é tão difícil. Mesmo que meu coração não concorde. Nada fará ele voltar. Aperto mais forte a mão contra o coração, como se de alguma forma aquilo vá diminuir a dor.

Sei que a dor nunca sumirá, não de fato, apenas vai ficar mais fácil de lidar.

Me afasto do túmulo e começo a soluçar, meu coração se aperta cada vez mais. Acho que ele nunca mais vai bater da mesma forma que antes, não quando falta uma parte. Uma parte essencial.

Se eu pudesse voltar no tempo... Eu aproveitaria aqueles momentos. Aqueles momentos em família. De quando conversávamos. Quando meu pai contava histórias para eu dormir.  Quando ele apenas ficava comigo, me apoiando e sempre dizendo que eu conseguiria.

Encaro a escuridão que espreita o céu acima. Olho a lua cheia, as estrelas, e a névoa. Reconheço imediatamente as constelações. Sei que meu pai está em algum lugar ali, me encarando de volta.

O tempo está passando, e o céu escurece mais e mais. Eu não quero sair daqui. Eu não quero sair de perto dele, mas eu está ficando tarde.

Levanto-me e encaro a lápide uma última vez. Com um suspiro trêmulo, me despeço de Michael e prometo visitá-lo mais vezes. Com a mão no peito dolorido, começo a caminhar para fora do cemitério.

Encaro uma vasta extensão de túmulos.
Há tantas pessoas perderam seus entes queridos... Eu não desejo essa dor para ninguém.

Será que um dia ficará mais fácil?

Não sei as respostas para as tantas perguntas em minha mente. Talvez nem todas as perguntas precisam de respostas.

Meus passos lentos e abafados alcançam a entrada. Continuo a caminhar. Estremeço minhas mãos finas e suaves aos meus braços, em uma tentativa de aquecê-los do frio gélido da noite.

Tão pensativa e imersa em meu mundo, não percebo uma figura caminhando atrás de mim.

Já faz um tempo desde que saí do cemitério, serão mais alguns minutos até minha casa. Começo a andar mais rápido, com meu coração parecendo que irá sair do peito a qualquer momento.

A pessoa logo atrás percebe e começa a andar mais rápido também. Encaro noite escura e tento não sentir medo. Tento, mas falho.

Se eu correr mais rápido...

Então, corro como nunca. Meus joelhos doendo e meu coração acelerado. Paro apenas por um minutos, apenas um, e é o suficiente. Não posso me defender do ataque antes mesmo de vê-lo, mas sei que é uma forma masculina que começa a segurar meus braços e colocar a mão em minha boca para que eu não possa gritar.

É alto e forte. Mas em meio a escuridão não consigo ver mais que isso.

Mordo, chuto e grito. Faço tudo para sair das mãos do sujeito, mas ele é forte e ágil demais...

 Faço tudo para sair das mãos do sujeito, mas ele é forte e ágil demais

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
RecomeçosOnde histórias criam vida. Descubra agora