Capítulo 20

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AURORA

Acordo no meio do cemitério, não sei que horas são, mas o celular está ao meu lado com um pouco de bateria. Lembro-me do que aconteceu. Da chamada com Laura. Da pessoa pressionando a faca em meu pescoço. Da dor, tristeza e do choro da minha amiga. Do meu choro. Encolho-me à medida que me levanto, com meu corpo pesado e dolorido. Posso sentir o cheiro metálico do sangue e metal. Pego o celular, guardo-o no bolso.

Olho uma última vez para a lápide do meu pai, que está a poucos metros de distância. Minha visão cansada e vazia vaga pelos túmulos ao redor, conforme caminho sobre os pedregulhos do chão gélido em direção a saída, de volta para casa. O sol nascente se espreita em minha pele em tons de dourado, mas não percebo. Ou não me importo.

Entro em casa, passando pela sala

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Entro em casa, passando pela sala. Vejo meu irmão dormindo no sofá. Pessoas não são bonitas enquanto dormem. Mas, Caio, ele fica bonito mesmo durante o sono; seu rosto é suave e ensonado. No entanto, suas sobrancelhas se arqueiam, como se tendo um sonho. Ou um pesadelo. Com passos hesitantes, subo um degrau da escada rumo ao meu quarto, mas sem querer acabo fazendo um barulho, acordando-o.

— Aurora? — Caio murmura, sonolento — Seus olhos se arregalam quando me vê — Onde você estava? O que aconteceu?!

— Meu celular descarregou. — Digo com a voz neutra e distante. Mostro meu celular desligado.

Pânico. Vejo pânico nos olhos do meu irmão, mas não tenho coragem de falar o que aconteceu. Não tenho energia para falar. Apenas fico encarando o nada e sentindo o vazio

— Maninha, por favor — Ele suplica, se aproxima de mim e encara minha bochecha — Você está machucada!?

Caio não quer gritar para não acordar nossa mãe, porém sua calma está se esvaindo.

— Fique onde está. — Ele diz e sai do cômodo.

Depois de alguns minutos, volta com um saco de pedras gélidas. Gentilmente, pega minha mão e me guia para o sofá, enquanto coloca a compressa de gelo em minha bochecha e no pescoço, onde a faca foi pressionada.

Solto um chiado em resposta. Devo estar tão ruim quanto parece, pois meu irmão me olha com preocupação estampada em seu rosto. Ele não me pressiona, pois sabe que eu preciso de tempo para falar, para processar...

— Eu estraguei tudo. — Digo, por fim — Eu sempre estrago tudo.

Caio me abraça e tenta me acalmar.

— Você não estragou nada. — Ele diz firme conforme passa as mãos pelo meu ombro — Me conta o que aconteceu?

É mais uma afirmação do que uma pergunta. Penso no estado em que ele se encontra apenas por me ver assim. Será pior se ele souber o que de fato ocorreu. Não posso fazer isso com ele... Não depois de tudo. Eu causei isso, portanto enfrentarei a situação sozinha.

E eu estou tão cansada. Só quero dormir. Por um ano, se possível.

Caio me ajuda no trajeto para o quarto. Ele tenta conversar mais, para conseguir mais informações. Não dou brecha para o diálogo, mesmo que isso signifique vê-lo sofrer daquele jeito...

Me apoio na cama e meu irmão se deita ao meu lado. Por alguns minutos, ficamos assim. Ele deitado ao meu lado e fazendo carinho em meu cabelo, enquanto pequenas lágrimas despencam pelos meus olhos e molham meu rosto.

 Ele deitado ao meu lado e fazendo carinho em meu cabelo, enquanto pequenas lágrimas despencam pelos meus olhos e molham meu rosto

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Não estou no clima de ir à escola e acabar me esbarrando com Laura... Eu não vou aguentar. Não depois do que falei a ela, não depois de tudo, e muito menos trabalhar no Briar.

Caio, em algum momento, saiu do meu quarto. Ele ficou comigo o tempo todo, apenas acariciando meu cabelo e falando palavras de confortos. Depois disso, eu só chorei e dormi. Ele está preocupado e sei que não vai deixar essa situação passar despercebida.

Me levanto e tomo um banho para tirar o sangue e fuligem. Encaro meu reflexo no espelho. A cor que adquiri nas últimas semanas sumiu. Agora a pele está pálida, e o olhar vazio. Não consigo encarar minha imagem por muito tempo. Há sangue seco na lateral do pescoço. Entro na banheira e espero que a água lave a dor, tristeza e culpa do meu coração. Mas não o faz.

Cada minuto é agonizante e doloroso. Não sei quantos minutos se passaram. Estou apenas agindo no automático.

Não quero ver meu irmão, mas tenho fome o suficiente para descer até a cozinha. Meu estômago reclama à medida que desço as escadas. Suspiro ao encontrar Caio na bancada. Meu olhar o alcança rapidamente. Não digo nada enquanto pego uma torrada com geleia e como silenciosamente.

A torrada desce como cinzas pela minha garganta.

— Onde você foi ontem? — Ele pergunta baixo, da maneira que faz antes de explodir, quando mordo a torrada.

— Visitar o papai.

Surpresa e algo a mais brilham nos olhos do meu irmão.

— O que aconteceu lá?

Fico em silêncio por longos minutos.

— O que aconteceu? Me fala! — Continua, começando a ficar com raiva.

Não o culpo. Sei que ele não desistirá tão fácil.

— Conversei com ele... depois caí e me machuquei. Só isso.

— Você acha mesmo que eu vou acreditar nisso? — Caio cruza os braços em frente ao corpo e me encara. Não com julgamento... mas preocupação e medo. — Aurora, eu sou seu irmão! Te conheço tão bem quanto qualquer um nesse planeta. Sei quando está mentindo.

Encaro-o por um longo tempo, pensando se devo contar para ele. Nunca fomos de esconder coisas um do outro. Mas é perigoso demais...

— Não posso contar. — Murmuro baixo.

Mesmo que, no fundo, eu queira...

Mesmo que, no fundo, eu queira

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