Capítulo 27

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PV. Carla

— Ao menos aquele infeliz lembrou-se da filha. — Lúcia me olha com uma cara estranha, sinto um arrepio, algo me diz que o que tem a me dizer, não vou gostar de ouvir.

— Creio que não seja exatamente isso que aconteceu.

— Agora estou confusa.

— Raymond deixou em testamento tudo que adquiriu em todos esses anos para Ana.

— E o que tem de ruim nisso?

— Ele não só deixou, ele também fez uma exigência para que ela recebesse o que é de direito dela, caso não aceite, tudo fica para mim.

— Não deve ser nada mirabolante, imagino. — Mais uma vez faz uma cara estranha, começo a não gostar de todo esse suspense.

— Ana recusou a cumprir a exigência do pai.

Analiso Lúcia por um tempo, e pelo desgosto em seu rosto imagino que Raymond, não pediu para que a minha menina investisse em algo que fizesse o dinheiro render, muito menos exigiu qual faculdade cursar, para Ana chegar a recusar. Em todas as opções que passam e minha mente, nenhuma delas é o que a mulher a minha frente diz, conseguindo me deixar totalmente atordoada.

— Ele exigiu que Anastácia estivesse casada e tenha um filho.

— Aquele desgraçado, não bastasse tudo que nos fez passar, ainda teve a capacidade de tentar manipular a vida da filha mesmo depois de morto.

— Carla, tenha calma, fiquei igual a você quando soube me revoltei e cheguei à conclusão de que nunca conheci o homem ao qual foi casada por alguns anos, logo depois, tentei me colocar no lugar dele e, de certa forma entendi o que queria, ele não esperava morrer tão cedo, considerando o que o próprio Raymond fez, ele tentou usar dinheiro para que Ana não cometesse o mesmo erro.

— Entendeu? Como você pode dizer isso?

— Entendi quando a outra parte da exigência é de que metade de tudo deveria estar no nome da criança.

— Fez isso porque não conheceu a filha que tinha, pensou que ela fosse igual a ele.

— Mas Ana recusou, ela não vai aceitar.

— Se veio aqui para que tente convencê-la, eu não o farei.

— Jamais, assim como você, também achei descabida, o que ele fez.

— Entendo, não quero parecer grossa, mas o que veio fazer aqui?

— Te convencer a se tratar.

— Não posso.

— Carla, pensa um pouco, Ana precisa da mãe, ela é ainda muito nova, enfrentando uma barra dessas, o pai morreu não que ele estando aqui, fizesse tanta diferença na vida dela, isso eu já entendi, mas você? Você é o mundo dela, a vida dela.

— Não posso deixar minha filha desamparada.

— Para de pensar negativo, você só fala como se fosse morrer.

— Porque eu estou morrendo.

— Não, você está se entregando, sem ao menos tentar, sem lutar, olha para sua filha, veja o quanto ela está sofrendo, tentando ser forte, sua filha desabou no meu colo hoje, e não, ela não chorou pelo que o pai fez, mas por toda a carga que ela vem carregando sozinha.

— Não seio o que fazer.

— Tenho uma proposta para você. — Analiso seu rosto, Lúcia parece uma boa pessoa, mas se vier com uma proposta, igual à que Raymond fez, vai sair da minha casa agora.

— Que seria?

— Já te disse que não tive filhos, prometo cuidar de Ana, se algo acontecer com você, mas para isso, você precisa aceitar o tratamento.

— Porque está fazendo isso?

— Porque eu posso e quero.

— Espero não ter segundas intenções nesta história.

— A única intenção que tem, é o sentimento de ter tentado, de Anastácia saber que a mãe vai lutar por ela, e quem sabe ganhar uma grande amiga, ou se preferir continuar pensando negativamente, de que quando partir Ana não estará sozinha no mundo, pode escolher não me importo.

Começo a rir e ela também, quem diria que a essa altura da minha vida, a mulher do meu ex-marido apareceria em um cavalo branco para tentar salvar a mim e a minha filha da solidão.

Ana desce as escadas me olha rindo para Lúcia e não diz nada, apenas avisa que vai sair, quando a questiono aonde vai ela diz que na casa dos Grey, não digo nada, quando ela voltar, preciso conversar e saber o que está acontecendo.

Sei coisas sobre a família Grey, que Ana precisa saber, ela passa pela porta, e Lúcia me encara.

— Grey? A família Grey?

— A própria, eu trabalhava para eles, mas devido a doença tive que parar, Ana era garçonete em uma lanchonete a mesma que Kate trabalha e onde minha filha faz bicos aos finais de semana para ajudar mais na renda, como o meu trabalho gerava a renda maior de casa ela ficou no meu lugar e começou a trabalhar para eles.

— Entendo, porque você fala com desgosto?

— Eu gosto deles, mas meu coração de mãe diz que tem algo a mais nesta história, não sei o que está acontecendo, lá no fundo tenho certeza que minha menina sairá machucada.

— Não entendi.

— Uma longa história.

Após horas conversando com Lúcia, ela me contou toda história dela com Raymond, e percebi que ele não nos deixou para ficar com ela, e sim porque quis, ela não teve culpa do que ele nos fez passar.

Lúcia me parece uma pessoa boa e muito honesta, apesar de conhecê-la hoje, percebo que é muito sozinha, não perguntei porque não teve filhos, não sei se foi opção ou por simplesmente não querer, o que não é da minha conta, mas vendo como ela se refere a Ana vejo carinho, e que ela teria sido uma excelente mãe.

A companhia dela me agrada, ela é engraçada e divertida, me fez esquecer um pouco tudo que vem acontecendo, percebo que nossa conversa foi boa para ela também.

— Aceita algo para beber? — Pergunto.

— Não, obrigada! Preciso ir, posso voltar amanhã? — Pergunta muito educada.

— Claro, será muito bem vinda.

— Obrigada, minha casa é grande demais para uma pessoa sozinha.

— Imagino que sim, me lembro bem o tamanho dela, cá para nós um exagero. — Ela sorri do que digo.

— Concordo plenamente, mas como dizia minha falecida mãe, tudo pode mudar nessa vida, hora estamos sozinhos, hora a casa pode estar repleta de pessoas amigas, quem sabe todo aquele tamanho não tenha um propósito que ainda vou descobrir.

— Sua mãe tinha razão, nunca é tarte para se viver o amor.

— Sim, em suas diversas formas, esqueci de perguntar, como você faz para ir ao hospital? — Não sei o motivo da pergunta, mas respondo.

— Vou de ônibus, porque?

— Só uma dúvida que surgiu aqui é bem afastado, não sei se você se lembra mas minha casa é bem próxima.

— Lembro sim.

— Então, até amanhã Carla, manda um beijo para Ana, e amanhã eu busco você para irmos ao hospital ver sobre o seu tratamento.

— Ainda não me decidi se vou fazer.

— Eu já, não vou deixar você ser egoísta com Ana e recusar esse tratamento. — Diz se afastando. — Até amanhã.

Diz saindo não me dando a chance de responder ou questionar.


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