Capítulo 49

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— Tem certeza de que fazer isso, filha? — meu pai questionou enquanto estacionava em uma vaga próximo ao hospital São Marcos.

— Não. — Esfreguei minhas mãos suadas uma na outra e fechei os olhos, tentando não deixar aquele medo me paralisar.

— Podemos voltar, se quiser — ele propôs.

Neguei com a cabeça.

— Não — respondi enfática. — Eu tenho que fazer isso.

Naquele instante eu sentia como se minha vida fosse uma montanha-russa em constante queda, um completo e escuro deserto. Era difícil manter a esperança ou enxergar uma saída no momento mais sombrio da minha vida. A pior parte era ter a consciência de que eu só estava passando por tudo aquilo porque foi minha escolha entrar naquela “aventura”, contando que no final tudo acabaria bem e eu terminaria segura.

Terrível engano...

Tal como o rei Davi que se envolveu com a mulher de outro homem, eu fui perdoada dos meus pecados, mas não poupada das consequências. O perdão do Senhor tornava tudo mais suportável, mas não diminuía minha dor e vergonha.

Havia noites nas quais meu desespero era tão grande que eu desejava nunca ter nascido. Eu queria fugir, me esconder em uma caverna até que tudo passasse. Mas essa não era a minha realidade. Ao invés, eu estava exposta em mar aberto, à deriva, enquanto as ondas violentas chicoteavam e tentavam destruir meu barquinho.

"O Senhor é aquele quem faz as ondas"* lembrei-me de uma canção que eu ouvia com frequência e de uma frase que vi "Oh, Senhor,  sinto suas mãos me esmagando, mas que bom que são as suas mãos"*.

Tudo estava acontecendo rápido demais. Ao contrário das minhas ilusões de menina, meu marido, o dono do morro, não se tornou um príncipe encantado cristão, me dando uma vida princesa como prometeu. Antes, ele, assim como um porco recém-lavado, voltou ao chiqueiro do pecado e conseguiu se esquecer rapidamente de todas as promessas de vida honesta longe do crime quando assaltou aquela joalheiria. Ele foi preso há cerca de uma semana por esse ato.

Nos primeiros dias eu não me permiti pensar naquele assunto. Não deixava meus pais comentarem e nem mesmo ligarem a televisão nos noticiários. Mas, bastava que o nome "James" soasse em minha cabeça e raiva fervilhava dentro de mim.

Como ele pôde fazer aquilo? Como pôde não pensar na vergonha que traria a nossa família? Ou ao futuro que daria ao nosso bebê? Aonde aquele imbecil estava com a cabeça? Por que não poderia resolver seus problemas como um ser-humano normal?

Todas aquelas questões me faziam adoecer e,  na solidão do meu quarto, tudo o que eu fazia era me derramar perante Deus, clamando e implorando que redimisse a alma daquele miserável e me ajudasse a ter misericórdia, pois, sinceramente, no ápice da minha ira, desejei o pior a James e não me orgulhava disso.

Meu único meio de não odiá-lo, era tentar não remoer os erros dele, mas foi inevitável quando recebi uma ligação de Jason Bond, o irmão de James, dando a terrível notícia de sua mãe sofrera um AVC hemorrágico muito grave ao descobrir o que sucedera ao seu filho mais velho. Dona Joana não estava nada bem.

Em decorrência desse quadro clínico, meu cunhado me pediu para visitar a senhora, se assim fosse possível.

Aceitar o convite foi mais difícil do que parecia. Além de não desejar fazer nada relacionado ao meu marido e não me sentir segura em fazer qualquer coisa fora da casa dos meus pais, eu também temia reencontrar Jason e encará-lo sozinha depois de ter feito tudo ao contrário de seus conselhos para ficar longe de seu irmão.

Demorei a me decidir e, só após uma conversa com mamãe, entendi que não havia nada para temer, pois os parentes de Céu sempre demonstraram muito carinho por mim e também não tinham culpa dos erros dele. Ademais, eu também precisava encarar meus próprios erros.

O dono do morro da Luz e a missionária cristãOnde histórias criam vida. Descubra agora