Classic

2.7K 132 121
                                    

Nico narrando
Minha irmã me levara para aquele estranho clube em NY, em plenos anos 1980, mais exatamente em 86, onde eu tinha meus 16 anos. O clube, segundo ela, era o dos vagabundos da sociedade. Não me surpreende. Uma garota que não gosta de ninguém e um garoto que gosta de garotos. Ela logo me deixou sozinho e foi atrás de suas amigas. Eu tive esperança de conseguir beijar alguém, mais especificamente beijar um garoto. Aquele lugar era cheio de pessoas assim, bebendo, dançando, declamando para um público, se pegando, ou conversando. Eu perambulei pelo local, fui nos três andares do lugar, decidi parar em um bar com alguns homens fumando e conversando entre si. Eles não deram nenhuma atenção à minha chegada. Fiquei sentado, peguei um dinheiro que havia levado e pedi a bebida mais leve disponível. O atendente me passou um copo do que parecia ser cerveja. Eu já havia provado um pouquinho uma vez, adorava o sabor amarguinho, mas eu era muito novo na época (segundo meu pai, mas na verdade eu já tinha 14), e apenas pegara um pouco roubado do copo do meu pai. Assim que provei, notei ser mais leve que cerveja, talvez chope. Mas o sabor era parecido. Continuei bebendo aos poucos, até alguém se sentar ao meu lado, virado para mim me encarando. Olhei para o lado e vi um rapaz belo, de mesma faixa etária que eu, olhos azuis, cabelos loiros, pele bronzeada e sardenta e roupas de marca. Parecia um legítimo burguês, mas sorria tão sincero que nem liguei para o estereótipo.

W:- olá, meu nome é William. Qual é o seu?

N:- Nico.

W:- apenas Nico?

N:- sim, não me pergunte o que meus pais tinham na cabeça.

W:- quantos anos tem?

N:- 16.

W:- eu tenho 17. Primeira vez aqui?

N:- é. Você frequenta esse lugar ou também nunca veio?

W:- venho de vez em quando, por insistência do meu pai. Veio aqui por conta própria ou acompanhado?

N:- minha irmã me trouxe. Meu pai até nos aceita, mas não foi o mesmo com minha mãe. Eles se divorciaram por terem opiniões muito diferentes acerca de nossas sexualidades.

W:- foi o mesmo com os meus. É triste ver pessoas se separando só porque nem todas entendem as diferentes formas de amar.

N:- realmente.

Ficamos em um silêncio confortável por alguns minutos, e Will começou a fazer carinho em minhas costas, depois em minha nuca, ombros e até no rosto. Eu apenas aproveitava suas carícias, afinal, eu geralmente não gostava que me tocassem, mas os toques dele não eram agressivos ou intrusos, eram afetivos. Me senti acalentado. Então ele fez algo que me surpreendeu, mas que nem por isso me desagradou: ele puxou minha cintura e me acomodou em seu colo. Eu não conseguia recusar ou recuar, eu me sentia bem com aquilo, parecia tão certo...

W:- me diga se em algum momento quiser que eu pare, ok?

N:- ok.

Ele beijava meu rosto com suavidade e calma, da mesma forma como passeava uma das mãos pela minha silhueta, enquanto a outra se apossava de minha cintura. Vendo que eu não pedia para parar, ele começou a ser mais ousado. Deu um aperto em minha coxa, desceu os beijos para meu cangote e os encrementou com algumas lambidas e mordidinhas. Suspirei apreciando aquela leve pegação. Will também parecia apreciar bastante o que fazia. Decidi que não adiantava somente ele se mexer naquilo tudo, então arranhei de leve, sem machucar e ainda por cima da roupa, a extensão de suas costas com uma das mãos, enquanto passava a outra por seus ombros. Will soltou uma risadinha marota com meu ato. Enfim ele fez o que eu quis fazer a noite toda: tomou meus lábios nos seus. Iniciamos apenas com um selar, até que ele lambeu meus lábios pedindo para aprofundar. Cedi, e nunca me senti tão bem quanto naquele momento. Ter a língua dele dentro da minha boca era tão bom, parecia que éramos feitos para estarmos alí. Foi nesse momento que minha ficha caiu e minha culpa por ser gay morreu: se Deus realmente não me amasse como minha mãe dissera na última vez que nos vimos, não teria como aquilo ser tão certo, mas eu tinha nascido assim e nada poderia me fazer mudar. A concepção social sobre religião cristã dita que Deus nos odeia, mas se odiasse, primeiramente, ele nos mandaria para o inferno logo que nascemos, mas espera, se realmente não nos amasse, nós nem nasceríamos, mas aqui estou eu, beijando outro homem e me sentindo estupidamente bem com isso. Ora, "Deus nos odeia”, juro, eu queria conhecer a pessoa que concebeu que Deus sente ódio, porque sinceramente, a "cura gay” devia ser convertida em "cura ódio”, porque tem muita gente precisando.
Findamos o beijo ofegando, e eu comecei a sorrir que nem um idiota. Will não questionou porque eu estava com aquele sorriso no rosto, ele só beijou o canto da minha boca e apreciou meu sorriso por alguns instantes. Descobri mais tarde que ele entendeu porque eu sorri, ele sabia que eu estava livre da culpa. Continuamos nos beijando por algum tempo, até que as coisas esquentaram. Eu tinha uma noção até que boa de sexo gay, já que meu pai me incentivou a pesquisar. Portanto, não questionei quando Will nos trancou dentro de uma cabine no banheiro masculino ou quando tirou um preservativo da carteira. O uso daquelas coisas era bem vago, quase ninguém sabia o que era e pra que servia. Quando fizemos mesmo, doeu, mas essa dor passou depois de um tempo e virou um prazer absoluto. Quando acabou eu mal acreditava no que tinha feito, não por achar errado, mas o contrário. Nossas bocas tinham trabalhado tão bem, nossos corpos tinham um encaixe tão milimétrico... Eu tenho quase certeza que me apaixonei por ele logo de cara. Eu achei que isso fosse mentira mas eu literalmente senti na pele, é real, ou pelo menos, foi pra mim.

W:- Nico...?

N:- hum?

W:- eu posso estar sendo muito apressado, e tudo bem se você negar, mas... Quer namorar comigo?

N:- quero.

Eu cheguei à conclusão de que querer é poder, então nesse caso eu queria e podia, ninguém iria me dizer o contrário e se dissesse, eu não ia ouvir. Nem minha mãe e suas bíblias e terços, nem a sociedade conservadora, nem a igreja que acha que sabe mas não sabe de nada, ninguém.

***

B:- onde você estava?!

N:- no banheiro...

Isso não era mentira. Eu estava no banheiro, mas eu não precisava dizer o que estava fazendo.

B:- e quem é esse?!

Ela apontou para o Will, que estava andando abraçado comigo devido à dor na minha bunda que ele mesmo causou. E também porque namorados andam por aí agarradinhos o tempo todo. Então... Contar ou não contar? Acho que não muda muito.

N:- é meu namorado, Will.

B:- Nico, ele é um cara mais velho e você conheceu ele hoje!

W:- na verdade, eu sou cinco meses mais velho que seu irmão.

B:- não importa!

N:- Bianca, eu não ia sair namorando qualquer um ok? E ele ofereceu carona pra gente. Você e papai são os únicos que acham que eu não tenho maturidade.

W:- e minhas intenções com seu irmão são as melhores possíveis, juro!

B:- ok, eu não posso mexer nas suas decisões, de qualquer forma, mas eu ainda não vou com a tua cara, Will.

Ele realmente nos levou pra casa, mas não sem antes garantir uma troca de telefones e um amasso bem dado de despedida. Bianca fez um som de vômito forçado no banco de trás e nós rimos da reação dela. Will combinou de ligar às nove da manhã do dia seguinte e lógico que eu iria sitiar o telefone de casa à partir das sete.

Eu não fazia ideia de que aquele garoto casaria comigo quatro anos depois disso, bem na porta dos anos 90.

Espero que tenha ficado fofo, porque eu achei fofo. Atééé!

SOLANGELO NOSSO DE CADA DIA!!Onde histórias criam vida. Descubra agora