Castidade violada, amor em revoada

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Nico narrando
Olhei pelo vidro do carro de minha mãe, onde era possível enxergar o grande e antigo prédio onde eu seria catequizado até deixar de ser... essa aberração. Minhas malas estavam no banco traseiro e minha mãe cantarolava a música religiosa que tocava no rádio do carro.
Aquele era um colégio interno católico. Um dos mais antigos e sagrados do país. Eu ficaria sem acesso a celular, Internet, telefone e cheio de tarefas, e entre elas, muitas aulas e orações. Eu seria um noviço. Eu só queria me livrar daquela coisa asquerosa em mim. Eu olhei para o céu e pensei: "Senhor, eu estou tomando providências. Deixarei esse pecado para trás ou morrerei tentando".
Minha mãe estacionou o carro e me ajudou a pegar minhas malas. Fomos até o meu quarto, deixando tudo lá e indo para a diretoria do local, avisar sobre minha chegada. Eles nos receberam bem e me deram boas vindas calorosas. Me senti um pouco acolhido e pensei: "eles vão entender meu problema. Vão me ajudar. Graças!" Fui até a entrada do internato com minha mãe, e ela se despediu.

M:- ainda não entendi porque você quis tanto vir para cá, mas eu te apoio incondicionalmente, minha pequena benção. Quem me dera seu pai fosse menos desnaturado e te visse como um milagre que nos foi enviado. Vou sentir saudades.

N:- eu também mãe. Muito obrigado por ter vindo da Itália só para poder me ajudar.

M:- nada de "só", meu lindo! Por você eu faria muito mais. Fique com Deus, meu amor.

N:- vá com ele, mamma.

Ela beijou minha testa uma última vez antes de ir para o carro. Provavelmente, ficaríamos sem nos ver por vários meses, provavelmente um ano - o que claramente era muito, pois eu amava minha mãe. Era justamente por isso que eu estava aqui. Não quero que ela saiba que o filho já foi um pecador tão sujo. Ela logo deu partida no carro e sumiu da minha vista. Suspirei e voltei para meu quarto. Eu estava sozinho nele por enquanto, o que eu achava realmente ótimo, pois precisava de espaço e era bastante reservado. Desfiz minhas malas e arrumei minhas coisas. Coloquei na mesa de cabeceira da cama uma foto dos meus pais comigo e minha irmã. Encarei meu pai na foto. Ele... não era bem o que se desse para chamar de pai. Não lembrava das datas de aniversário, não conhecia direito seus filhos, não passava um tempinho que fosse conosco, não nos dava lições de vida ou broncas, presentes e carinho muito menos, era um fantasma dentro de sua própria casa. Lembro que minha mãe, Maria, contou que ele começou a ficar assim quando eu nasci. Pode não fazer tanto sentido, mas essa analogia me fazia sentir culpa por ele ser apenas meu progenitor, e não meu pai. Os problemas em casa se agravaram. Por algum motivo, meu pai meio que surto e não parou mais de trabalhar depois do meu nascimento. Ele e minha mãe discutiam muito, mas graças à mamãe, eles não levantavam muito a voz para não nos assustar. Ela tomou a sábia decisão de pedir o divórcio, mas por algum motivo, meu pai quis ficar comigo e com Bianca, minha irmã. Como ele tinha mais patrimônio do que mamãe, acabou vencendo o processo e ficou com nossa guarda total. A partir desse dia, ficamos a mercê do mundo. Eu devia ter uns 6 anos, mas já me sentia abandonado. Maria aparecia frequentemente em casa para cuidar de nós, mas meu pai, Hades, estava ensandecido demais com a separação recente, e disse para mamãe ficar longe, ameaçado colocar uma medida protetiva contra ela. Até hoje eu não entendi qual o problema daquele cara. Ele nem se dá ao trabalho de lembrar que tem filhos, pra que ficar com a nossa guarda? Enfim, Hades contratou uma babá extremamente religiosa, assim como minha mãe. Porém, a babá era evangélica, e minha mãe era católica. Aprendi a ser uma boa pessoa, contradizendo tudo o que a babá falava de uma forma gentil e adequando isso para as minhas ações. Mas isso não impediu que ela fizesse diferença na minha cabeça. Bianca a odiava e se tornou uma garota rebelde, e logo se juntou a um grupo de jovens garotas de uma fraternidade, me deixando completamente sozinho. Passei anos sem ver minha mãe, estudando que nem um maluco e ajudando causas humanitárias para tentar sufocar o aperto da falta de afeto que eu tinha no peito.
Mas as coisas ficaram complicadas quando eu fiz 14 anos. Eu... comecei a ver garotos e garotas de formas diferentes. A boca de um menino me parecia muito mais atraente que a de uma menina. Os contornos do corpo masculino me "despertavam", mas isso não acontecia com uma silhueta feminina. Com nojo, eu percebi o que isso significava, e imediatamente, me senti sujo e pecaminoso. Tudo o que minha babá falara daquele assunto martelou na minha cabeça, até o dia em que eu vi um anúncio de vagas abertas em um internato cristão. E foi assim que eu vim parar aqui.

SOLANGELO NOSSO DE CADA DIA!!Onde histórias criam vida. Descubra agora