Reencontros

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“Corram, corram” – gritava um homem com roupas coloridas enquanto levantava a sua espada para os soldados que invadiam sua tribo.
O vento era forte e as várias tendas coloridas pareciam que lutavam contra o vento assim como seus donos lutavam contra os soldados.
Numa tenda uma pequena menina com seus olhos negros como a noite sem luar chorava no colo de sua mãe, logo um soldado com olhos famintos entrou e sua mãe a entregou para sua irmã mais velha e gritou para fugirem, a menina viu o soldado se aproximando de sua mãe e ela tirou o seu punhal para se defender, não deixaria que a violentassem, mas o soldado foi mais rápido e cravou sua espada na bela cigana, sua longa saia verde começou a ficar vermelha pelo sangue que escorria e a pequena menina era arrastada pela irmã gravava aquelas cenas apavorantes em sua mente.
 
 
Anos depois...
 
Numa tenda com lenços escuros a velha cigana lia a mão de uma jovem: “Seu futuro se encontra no seu passado!”
A jovem moça respondia chateada: “Eu não entendo. Há anos você só me diz isso e isso não me diz nada!”
A velha cigana sorria: “Quando chegar a hora você saberá, menina”
E a jovem cigana saia sem respostas da tenda da velha cigana.
Caminhou pelo acampamento e encontrou sua irmã mais velha, Luiza.
Luiza: “Estava te procurando! Por onde andava?”
Jovem cigana: “Estava com a Carmensita”
L: “Ainda tentando entender aquela mensagem?” – sorriu e enrolou em seus dedos uma mecha dos cabelos negros de sua irmã – “Deixa isso pra lá. Não devemos querer apressar o destino, Eurielle”.
E logo a irmã mais velha indicou um caminho para a mais nova. Eurielle receosa perguntava para onde iam. Sabia que não era seguro sair dos limites do acampamento, mesmo agora em tempos de paz entre os povos vizinhos, os ciganos ainda eram mal vistos pelos outros.
L: “Não vamos sair da nossa tribo”
E caminharam para a enorme floresta que rodeava o acampamento cigano, iam para uma parte que poucos se atreviam ir, pois acreditavam que naquela parte habitavam maus espíritos.
L: “Preciso da sua ajuda!” – parou de caminhar e olhou nos olhos da irmã –“Encontrei um homem muito ferido no meio da floresta!”
Eurille conhecia muito bem Luiza e sabia que algo não estava certo: “Por que não o levou para o acampamento?”
L: “Sabe que Afonso* não esta e só regressará daqui alguns dias. Por favor, me ajude! É a melhor com as ervas e suas magias são muito boas para cura”
Eurielle olhou desconfiada, conhecia muito bem a irmã mais velha: “Luiza, o que esta acontecendo?”
Luiza abriu a porta de uma velha cabana abandona no meio da densa floresta e Eurielle se assustou, correu para fora puxando Luiza. Ali seus pesadelos pareciam ganhar vida.
Eurielle exaltada: “Perdeu o juízo, Luiza?! Sei que Afonso deixa você fazer o que quer, mas isso já é demais! Como pode trazer um gadgés*!”
 
Luiza segurava o braço da irmã para ela não fugir e a olhava séria: “Eurielle... é uma vida!” e abriu novamente a porta da cabana.
 
Eurielle o olhou: “Olha esse uniforme, ele é um inimigo!” – puxou novamente o braço da irmã tentando tirá-la da cabana.
L: “Pare! Olhe pra esse pobre coitado! Eu estava fazendo oferenda para nossos protetores e escutei um som quando olhei esse homem estava desmaiado no chão com essa horrível ferida!”
Eurielle cuspiu as palavras com desprezo: “Não me importa! Não ajudarei esse gadgé!”
L: “Por favor, minha irmã! Não deixe esse ódio de nosso pai envenená-la. Graças a Afonso temos paz, não somos mais caçados. Isso acabou! Não podemos olhar para o passado quando temos todo um futuro pela frente.  Não tem porquê ter todo esse desprezo pela vida dos gadgés, Vida é vida! E ela é sagrada!” – segurou as mãos da irmã.
Luiza era a rainha cigana, esposa de Afonso o rei, o líder da tribo. Luiza era geniosa e bondosa, os ciganos costumavam falar que ela era a verdadeira líder do acampamento, pois Afonso era louco por ela e sempre a ouvia antes de tomar qualquer decisão.
Luiza sabia que seu pai como os mais velhos da tribo tinham um grande ódio pelos gadgés, que antigamente os perseguiram, escravizaram durante muito tempo. Agora o tempo era mais tranquilo, apesar do preconceito conseguiam conviver melhor com os outros povos, mas desde que respeitassem os limites dos seus acampamentos.
Assim como Eurielle, Luiza viu sua mãe ser assassinada, mas deixou as magoas numa parte onde não podiam semear coisas negativas em seu coração por mais que seu pai as ensinassem a odiar qualquer um não cigano, principalmente, soldados. Sabia que a irmã mais nova tinha um bom coração, mas a influencia de seu pai a cegava muitas vezes.
Eurielle era conhecida por ser muito boa com magias de cura e talento com ervas, com a dança.
Eurielle amava Luiza e respeitava sua bondade e força, caminhou devagar até o soldado que estava sangrando muito, dava para perceber que seu estado era grave. Ajoelhou-se ao lado dele e virou seu rosto quando ela olhou aquele rosto sentiu uma estranha sensação em seu peito, passou a mão de uma forma carinhosa no rosto pálido dele, mas logo retomou a consciência e com a ajuda de Luiza tiraram a blusa dele, ela observou como o corpo dele era forte, definido e tinha algumas cicatrizes, limpou o ferimento e preparou suas ervas. Luiza buscou algumas coisas no acampamento e logo havia velas, frutas, incensos e Eurielle cantando enquanto fazia sua magia. Passaram o dia lá, já era noite quando saíram da cabana.
Luiza percebeu que Eurielle estava muito calada e séria.
L: “Esta tudo bem, minha irmã?”
E: “Esta!”
L: “Acha que ele ficará bem?”
E: “Não sei, mas se ele passar dessa noite, sobreviverá”
L: “O que você tem?”
E: “Não sei se fiz o certo! Você viu aquele uniforme! Ele é nosso inimigo!”
L: “Eurielle, pare com isso! Não siga as ideias de papai! São outros tempos, bons tempos!” – sorriu.
E as duas foram para suas tendas, Eurielle não conseguiu dormiu aquela noite, algo no rosto daquele soldado mexeu com ela.
O dia amanheceu e procurou Luiza, não a encontrou pelo acampamento caminhou ate a velha cabana com certeza a irmã estaria lá. Encontrou Luiza nervosa e o homem estava tremendo.
Luiza sorriu quando viu a irmã: “Nossos guias te trouxeram!”
Eurielle viu que o homem estava muito quente fez compressas e espalhou algumas ervas pelo corpo dele, ascendeu suas velas, incensos e junto de Luiza oraram”
Depois de algumas horas a febre foi embora.
L: “Ele não pode ficar sozinho! Caso passe mal de novo precisará de cuidados” – olhou para a irmã.
E: “Não! Eu não vou ficar aqui!” – falou irritada – “E papai esta sempre de olho em mim! Eu não posso dormir fora da minha tenda!”
L: “Eu invento algo e papai pensará que esta comigo! Eu não posso me ausentar porque sem Afonso tudo fica em minhas mãos. Eu trarei algumas coisas para você passar a noite aqui!” – abraçou a irmã, sabia como convencer a menor – “Obrigada!”
E: “Por que esse homem é tão importante para você?”
Luiza o olhou com carinho e respondeu sincera: “Eu não sei... mas não quero que ele morra.”
Eurielle via a sinceridade da irmã, admirava a irmã, Luiza podia ser extremamente sensível e bondosa e ao mesmo tempo implacável e justa.
Luiza voltou com algumas cobertas, alimentos e se despediu da irmã. Sabia que Eurielle ficaria bem, ninguém andava por aquela parte.
 
 
 
Eurielle não conseguia tirar os olhos do soldado, observou seu rosto nos menores detalhes, os cabelos escuros dele iguais os delas, o nariz bem desenhado, os lábios finos, ele devia ter a idade próxima a de Luiza.
Eurielle apesar de jovem segundo a tradição da sua tribo já tinha passado da idade de casar, mas fugia de todos os pretendentes que seu pai arranjava através de sua feitiçaria.
Olhou o movimento do peito dele que lentamente subia e descia, o abdômen tão marcado por músculos e cicatrizes e pela primeira vez em sua vida sentiu desejo. Balançou a cabeça como se negasse aquele pensamento, aquela sensação, ele era apenas um maldito soldado, um inimigo. Acabou dormindo enquanto olhava para ele.
 
A manha chegou com tímidos raios de sol e ela sentiu uma mão suavemente tocando em seu rosto, estava sonolenta, mas deu um pulo para trás e pegou seu punhal apontando para o inimigo que estava a olhando.
O soldado a olhava parecendo confuso.
Ele estava sentado e falava calmamente, mas dava para perceber que sentia dor e sua ferida sangrava: “Não precisa ter medo! Não irei machuca-la!”
A jovem cigana respondeu firme no idioma dele: “Não tenho medo de você!”
Ele sorriu e ela sentiu seu coração acelerar.
Soldado: “Foi você? Foi você que me trouxe para cá e cuidou de mim, né?” – falava com um belo sorriso tentando esconder a dor. Ele tirou a mão de cima do ferimento e ela viu que a ferida estava aberta, provavelmente pelo esforço que ele fez em se sentar e ele desmaiou.
 
...
O soldado em seus sonhos escutava um canto que parecia chamá-lo e a dor passava. Acordou com o sol em seu rosto e percebeu que estava numa velha cabana ainda estava amanhecendo, sentiu uma grande dor na barriga onde levou a facada. Sentou-se com dificuldade e pode olhar melhor ao redor, havia frutas, flores, ervas, incensos e... no meio de panos muito coloridos dormia uma bela mulher. Estranhou e compreendeu que ela provavelmente tinha cuidado do seu ferimento que estava limpo.
Ele a olhou curioso nunca tinha visto uma cigana, pelo que sabia não era um povo muito amistoso ou confiável. Mas ela era tão linda, tinha os cabelos tão escuros parecia ser muito jovem. Ficou a observando por alguns minutos encantado com os traços delicados e a serenidade que dormia.
Não conseguiu se conter, não pensava e quando viu fazia carinho no belo rosto dela e quando ela acordou, abriu aqueles olhos o ar dele fugiu, sentiu que algo também acordava dentro dele, seu coração parecia parar.
Não queria assustá-la, mas ela se afastou rapidamente. Não pode evitar de olhá–la ela era linda, a boca vermelha dela mostrando a sua respiração intensificada pelo susto, os fartos seios que subiam e desciam com rapidez e aqueles olhos que pareciam queimar.
Seu coração que parecia ter parado começou a bater muito rápido e sentiu uma forte emoção passando pelo seu corpo e desmaiou.
 
...
Eurielle estava assustada, ele poderia perde o braço por tocar numa mulher cigana, as leis de sua tribo eram severas. Mas ele tinha algo... quando ela o viu desacordado sentiu algo estranho em seu peito e quando ele estava ali sentando a olhando, ela sentiu seu peito explodir, sua respiração acelerou, seu coração parecia querer sair... ela não entendeu.
 

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