Um dia antes...
A alegre cigana pegava a pequena trouxa de roupa que fez, estava nervosa, mas feliz. O destino ao lado dele seria bom.
Estava tão feliz que não percebeu a sombra que rodeava a sua tenda.
Quanto o lenço de sua tenda foi bruscamente levantado sentiu um vento gelado percorrer seu corpo... parecia que estava no meio do campo de batalha, sentia as gotas geladas da tempestade, escutava o som das espadas, olhou para o chão e viu o rio de sangue escorrindo sob seus pés...
"Aonde pensa que vai?" - aquela voz a trouxe de volta a realidade e se virou.
Eurielle respondeu firme, mas dava para notar o medo em sua voz: "Estou indo embora, meu pai!"
O velho com forte cheiro de bebida se aproximou dela e deu um tapa, a pequena cigana caiu no chão e sentiu o gosto de sangue em sua boca. Levantou-se um pouco confusa pela forte bofetada.
E: "Me perdoe! Mas nada irá me deter! Eu amo Ofun e ele me espera!"
V: "Sua maldita! Você ira se casar com um cigano!"
E: "Não! Não irei!"
V: "Nem que eu tenha que acorrenta-la! Você não sujara meu sangue!"
Eurielle se tremia e respondeu firme: "Eu já sujei!"
V: "O quê?"
E: "Isso mesmo que ouviu! Eu me entreguei ao homem que amo e não há vergonha nisso! Eu e Ofun nos amamos e ficaremos juntos! Agora me deixe passar!"
Eurielle pegou sua trouxa e caminhou até a saída da tenda.
Seu pai a puxou pelos longos cabelos e lhe deu outro tapa.
V: "Sua vagabunda! E deitou com um gadje, com um inimigo!"
O velho deu outro tapa na jovem cigana que estava atordoada caída no chão e ele chutou sua barriga. Pelos longos cabelos a arrastou até o meio da tribo, a xingando e lhe dando mais bofetadas. O belo rosto começava a ficar inchado, coberto pelo intenso vermelho de seu sangue.
Os ciganos olhavam horrorizados aquela cena, mas não podiam se meter, ele era o chefe da família e Eurielle pertencia a ele.
O velho enquanto segurava os cabelos da filha mais nova gritava: "Eu a renego, maldita!" – cuspiu no rosto dela.
Luiza quando escutou os gritos do pai, correu e tentou abrir caminho na pequena multidão que se aglomerava horrorizada, tentou interferir, mas Afondo a segurou.
Luiza chorava, se debatia e gritava nos braços do marido: "Me solte, me solte, Afonso! Ele vai mata-la!! Pai, não faça isso!"
Afonso não concordava com a cena, mas era a lei e não podia intervir.
O belo vestido da cigana estava todo sujo de lágrimas, terra e sangue.
Afonso ordenou: "Pronto, meu sogro! Já a renegou! Agora ela será expulsa! Por favor, vamos parar por aqui!"
Eurielle tentava se levantar, cambaleava, estava muito ferida e suspirou: "Ofun"
O velho escutou: "Como ousa chamar por aquele maldito?"
Eurielle olhou os olhos do pai e ali o reconhecia, o passado voltava...
Flashback
Ela os observava e seu coração doía, amava os dois homens que lutavam um contra o outro. Ela viu o soldado com uniforme vermelho se aproximar, sabia o que ele ia fazer, ia ferir um dos homens covardemente pelas costas e então ela avançou e enfiou sua espada no coração do soldado que a olhou surpreso e com ódio...
FIM
Sentiu as gostas geladas da chuva em seu rosto, apesar de não chover na tribo naquele momento.
O velho olhando em seus olhos tirou sua adaga e cravou no peito da cigana que caiu no chão e logo uma poça de sangue se formou, Eurielle via um rio vermelho se formar e fechou os olhos.
Velho: "Sangue por sangue! Agora esta pago!" – cuspiu no corpo da pequena cigana
Luiza se soltou e correu desesperada para tentar parar o sangramento.
........
O espírito de Pedro chorava ao ver aquela barbárie cena.
Infelizmente alguns de nós não estamos prontos para livrar nossos corações dos sentimentos inferiores. O soldado assassinado por Eurielle em outra vida, morreu com profundo ódio e apesar de aceitar recebê-la como filha não conseguiu romper os laços de ódio que mantinha e desperdiçava ali a chance de evoluir, de amar aquele que pensava ser seu inimigo.
........
Vocês ouviram o que foi dito: 'Ame o seu próximo e odeie o seu inimigo'.
Mas eu digo: Amem os seus inimigos e orem por aqueles que os perseguem, para que vocês venham a ser filhos de seu Pai que está nos céus. Porque ele faz raiar o seu sol sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos.
Pensam que merecem elogios só por amarem os que vos amam? Isso até as pessoas más o fazem!
E se fizerem bem somente aos que vos fazem bem, o que tem isso de extraordinário? Até os pecadores procedem assim.
E se emprestarem dinheiro só a quem vos puder pagar, que bondade há nisso? Até os mais perversos emprestam aos da sua espécie para depois receberem tudo de volta.
Amem os vossos inimigos! Tratem-nos bem! Emprestem e não se preocupem se não vos pagarem, porque assim a recompensa que receberem do céu será grande e estarão a proceder verdadeiramente como filhos do Altíssimo. Porque é bondoso também com os ingratos e os perversos. Sejam compassivos como o vosso Pai é compassivo.
Mateus 5:43-45
Notas FinaisCapítulo associado ao capítulo 13, do livro Irmãos Vermelhos.
*O Caixão – a carta 08 do baralho cigano procura destacar o fim de um ciclo, o desapego, o renascimento. Não propriamente a morte física.
É a carta da finalização e do recomeço. As transformações que têm que acontecer e acontecem independente da nossa vontade. Nos mostra que as fórmulas, os planos, os projetos, os pensamentos, os sentimentos atuais não funcionam e nos incitam a um novo ciclo de renovação profunda.
Um ciclo morre para outro nascer.
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Maktub
RomansaA palavra Maktub, do árabe, significa "destino", e pode ser interpretado como "estava escrito" ou melhor, "tinha que acontecer". Eurielle ainda carrega muitas cicatrizes em sua alma, será que dessa vez com a benção do véu do esquecimento ela saberá...