Capítulo 26

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Ao notar Eduardo contemplando o teto da sala de estudo e Carla bufando do outro lado da mesa, enquanto todos aguardavam a chegada de Renan, Nicole decidiu quebrar o tédio que havia se instaurado e logo abordou sua nova parceira de investigação:

— Soube que você tomou minhas dores com a Cínthia.

— De nada.

Diante da postura taciturna de Carla, Nicole insistiu:

— Enfrentou a garota mais popular para defender alguém que mal conhece.

— Olha, para início de conversa, não me agrada nem um pouco a forma como você se porta. Não sei quais suas reais intenções, mas exibir o corpo apenas no intuito de chocar não opera em nada a favor das causas feministas que nos são tão caras. Caso não saiba, nossa luta para conquistar direitos básicos custou a vida de muitas ao longo dos séculos.

— Por que então fez isso? — Nicole protestou, diante do sermão.

— Simples. Também sou contra as pessoas serem punidas por causa de rótulos idiotas. Por trás desta sua atitude autodestrutiva pode ter alguém clamando por socorro, ao seu modo.

Carla via a súbita mudez de Nicole como sinal de que ela acusara o golpe. Assim, passou a dirigir um tom mais indulgente à garota-demônio:

— Vi você celebrando com seus amigos no Ipê Mall ontem à tarde.

— Sim. Eles também são meus amigos — ressaltou Nicole, incluindo Carla e Eduardo em seu círculo de amizade terreno, antes de arrematar. — Bem, alguns deles.

— Então significa que você me tem, no muito, como uma mera aliada de ocasião. Estou errada?

— Que bullshitada! Aposto que foi a Cínthia que colocou caraminhola na sua cabeça.

— Nem precisa. Só notar pelo timbre de sua voz. De mais a mais, é você que está se aproximando da garota-propaganda.

— Olha, Carla.... Quem disse que todos nós não podemos ser amigos?

— A sociedade, que oprime gente como eu.

— E permitir que sua vida seja ditada por essa tal "sociedade" é a sua melhor resposta?

Naquele instante, a porta se abria, com um vulto logo se enfiando no recinto, para alívio de Eduardo, que já se via em uma situação delicada entre a amiga de infância e a garota que despertava seus desejos incontidos.

— Olá, pessoal. Desculpem o atraso. Fiquei perdido na aula de redação.

— Ora, o retardatário finalmente chegou. Podemos finalmente começar, agora que o menino-anjo está entre nós!

— Por onde? — Eduardo retorquiu a questão levantada por Carla.

— Ora, bolas! Pelo nosso homem, é claro.

Ainda esbaforido com a corrida que fizera há pouco até a biblioteca, Renan franziu o cenho, antes de se manifestar:

— Você se refere à Rasputin?

— E quem mais? — Carla intuía, em tom impaciente.

Eduardo reagiu de lampejo:

— Lembro do Seu Nonô comentar em uma aula de história a respeito de um tal Rasputin. Era uma espécie de bruxo que gozava de prestígio com o último czar russo, mas com fama de satanista entre nobres e populares.

Percebendo os olhares sobre si, Nicole achou por bem externar algo a respeito:

— Que foi? Nunca vi este indivíduo mais morto. Deve ter ido para outro departamento.

Entre o Céu, a Terra e o InfernoOnde histórias criam vida. Descubra agora