Epílogo

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Em uma gruta encravada sob a cordilheira que encerrava os domínios do Vestíbulo, o último dos nove círculos infernais, dois seres se reuniam com ares clandestinos.

Um deles trajava uma armadura cintilante, ostentando o brasão em forma de olho de uma das casas celestiais gravado no torso. A "Casa da Generosidade e da Vigília".

Já o outro, de vestes soturnas, interpelava o arcanjo:

— "A chama que se apaga em um momento concebe a luz que se propaga pelo firmamento".

— Deixes de charada e vás direto ao ponto, hierofante!

— Não creio que o destempero combine muito bem com a índole de uma entidade conhecida pela alcunha de "O Arcanjo Sereno".

Cassiel deteve a mão sobre o cabo da espada guardada em sua bainha, ao mesmo tempo em que seguia os movimentos viperinos do feiticeiro.

— Tenho que me preparar para uma audiência.

— Sobre o último incidente na Terra.

O ser celestial aquiesceu.

— Há riscos ao nosso plano?

— De modo algum, Tayagan. Recorda-te que foram minhas manobras anteriores dentro do Concílio que permitiu que avançássemos.

— E quanto a Azrael? — O bruxo insistia, em tom apreensivo.

— Ah...aquele é apenas mais um idiota útil. Mas por que me chamaste aqui, afinal?

— Soube que sua força-tarefa sofreu infortúnios na Terra. Neste tal "incidente".

— Nada que o tempo não seja capaz de remediar — respondeu Cassiel, imperturbável.

— Se há algo que bem aprendi em minha longeva existência é de que o tempo tanto pode se revelar a melhor das panaceias, quanto também o pior dos venenos.

— Outro dos célebres adágios de seu antigo tomo, Tayagan? Ou estaria conjurando algum sortilégio?

O velho bruxo sorriu diante da zombaria de seu insolente aliado da vez. No entanto, ao invés de confrontá-lo, preferiu seguir a sensatez que a ocasião exigia para seus propósitos maiores.

— Por infindáveis eras, viajei entre planos existenciais deste e de outros tecidos da realidade, me deparando com situações às quais sua mente obtusa jamais seria capaz de presumir.

— Estás me desafiando, Tayagan?

— De modo algum, meu caro. Apenas salientar que, diante da iminente investida do "Sumo Mal", os homens se tornam mais valiosos mortos do que vivos.

— Que falta de consideração com os humanos. Lembra-te que já foste um deles.

O bruxo, que demonstrava não ter se abalado com mais uma das farpas dirigidas por Cassiel, limitou-se a responder:

— Minha essência transcende as origens mortais.

— Como queiras, "Mestre dos Magos".

— O que?

— Uma piadinha humana. Como lembrete de tuas raízes.

— Não estou afeito a tais frivolidades.

— Pelo visto não foi só tua carne que o tempo consumiu. Levou também teu humor.

— A ironia que investe sobre mim parece estar nublando seus pensamentos quanto à importância dos humanos em nosso estratagema.

— Em absoluto, Tayagan. Os mortais...ou melhor, as almas deles constituem o motivo de termos unido forças, não é mesmo?

Entre o Céu, a Terra e o InfernoOnde histórias criam vida. Descubra agora