16. A demissão

75 12 97
                                    

Gustavo mal podia esperar pela hora de falar novamente com Penny quando voltou ao Caldeirão Furado naquela noite. Não tinha conseguido conversar com o sr. Clearwater como queria, e isso, ao mesmo tempo que lhe causava alívio, o deixava preocupado por estar postergando tocar num assunto que um dia se tornaria inevitável.

Ao abrir a porta, teve a certeza de ter escutado um forte craque e, quando entrou, reparou que as suas coisas tinham sido reviradas. Correu para apanhar a mochila e cuidou de conferir se nada havia desaparecido: a câmera, suas roupas, a réplica do diário, o seu lunascópio, o frasco que usava para carregar a poção do acônito quando precisava... aparentemente estava tudo ali. Não havia mais ninguém no quarto, embora o seu colega tivesse deixado mais um monte de quinquilharias espalhadas pelo chão.

Meio atordoado, ele se sentou na cama, pegou a sua réplica do diário e começou a folhear as páginas em branco. Resolveu abri-lo na primeira página; pegou uma pena e molhou-a cuidadosamente no tinteiro. Antes que começasse a escrever, ele percebeu um pingo de tinta aparecer no topo da página e, em seguida, sumir como se tivesse sido sugado pelo papel. Esperou por um instante e, finalmente, aconteceu uma coisa: um brilho intenso de tinta apareceu no papel durante um segundo e, em seguida, como se estivesse surgindo do nada, a tinta começou a brotar momentaneamente na página, fazendo surgir palavras que Gustavo nunca escrevera.

Tão logo o Sol iluminou o lago Texcoco, no imenso Vale do México, os dois maiores líderes do Novo Mundo colocaram-se frente a frente nas terras recém-descobertas da América. Era 8 de novembro de 1519, um ano Ce-Acatl, no qual, de acordo com profecias antigas, os astecas acreditavam na tradição do regresso de Quetzalcóatl. De um lado, Hernán Cortez personificava a figura do conquistador europeu como ninguém. Do outro, o todo-poderoso imperador asteca Montezuma permanecia impassível, acreditando que os conquistadores espanhóis eram possivelmente enviados dos deuses”.

Não era a caligrafia de Penny. Definitivamente o seu diário havia sido trocado, e ele agora conseguia ver as anotações de outras pessoas. Filtrando-se novamente à página, reparou nas novas palavras que começaram a aparecer reluzentes:

Apesar da expectativa de um encontro amigável, a tensão era tão óbvia quanto inevitável. Espanhóis e astecas trocavam olhares, até que Montezuma desceu de sua pequena tenda e foi em direção aos invasores. Cortez repetiu o gesto. Saltou do cavalo e seguiu ao encontro do imperador. A tensão aumentava a cada passo. Olhos nos olhos, eles esboçaram saudações de respeito mútuo, mas não trocaram mais do que poucas palavras”.

Sem condições de entender o que havia acontecido, ele fechou o diário e foi dormir, pensando em avisar sobre o ocorrido a Penny assim que a encontrasse novamente.

No dia seguinte, à hora do almoço, ela finalmente veio explicar de onde vieram aqueles inscritos misteriosos, parecendo muito preocupada:

— O meu pai se apoderou do diário — ela disse, com uma expressão de culpa. — Está usando-o como um diário de pesquisas; ele disse que depois vai me dar outro, eu já tentei explicar, mas ele anda fascinado pelo México antigo. Disse até que vai escrever um livro, passou a noite inteira fazendo anotações; eu não sei o que fazer…

— Se o diário está com o seu pai, então não tem problema — tranquilizou-a Gustavo. — Sinceramente fico até feliz que ele tenha gostado de um presente meu.

— Eu pensei em pegá-lo de volta, mas eu nunca tinha visto o meu pai ficar tão entretido com uma coisa como está agora... Ele nem veio trabalhar hoje, e disse que vai fazer um pronunciamento no Ministério na próxima semana. Sabe, eu achei que ele ficou muito estranho de repente…

A Força Mais PoderosaOnde histórias criam vida. Descubra agora