Não estava mentindo, a mulher à minha frente era um espetáculo!
Que saudades de ver aquela pele negra e aqueles olhos escuros como a noite e brilhosos. As diferenças eram que Clara tinha obviamente crescido e estava mais elegante – aquela saia que ia até o joelho combinada com a camiseta e o avental branco que vestia lhe conferiam um ar de altivez. Entretanto, o que estava realmente diferente nela era o cabelo... liso, contrastando com os cachos volumosos de outrora.
Ela também parecia me analisar. Não sei qual era o seu grau de surpresa porque eu fui a primeira a quebrar aquele silêncio pós-espanto:
— Podemos conversar?
Ela ainda estava em transe, mas parece que minha voz soou como um gatilho para voltar à realidade.
— Bem... Eu tenho uma cliente para atender...
— Ah doutora! — era a recepcionista falando. O choque de rever a minha amiga de infância foi tão grande que, por um momento, esqueci que havia outra pessoa naquele ambiente. — A cliente das duas e meia ligou não faz nem cinco minutos cancelando o procedimento que você iria fazer nela. Ela até quis remarcar, mas lembrei que você sairá de férias logo. Então, deixamos em aberto a data em que ela poderá vir.
A resposta dada pela recepcionista, após a quase recusa de Clara, me deu a impressão de que ela nos escutava. Cheguei a pensar que seria muita intromissão da parte da funcionária, porém nem troquei meia dúzia de palavras com a minha velha conhecida. Além disso, se alguém poderia ser chamada de intrometida ali, seria eu mesma a detentora do título, pois não trabalhava ali.
Dei um sorriso, um tanto convencida, e repeti o meu convite:
— Então podemos conversar?
Minha cara deveria estar engraçada. Por um instante, achei que Ana Clara iria cair na gargalhada, porém ela se limitou a sorrir sem mostrar os dentes e anuiu. Disse:
— Tudo bem. Deseja ir a algum lugar em específico?
— Acredito que a ocasião aqui pede algo como um restaurante, mas soube que você acabou de retornar do almoço...
— Tem uma lanchonete aqui perto — ela me cortou, tentando prever a minha linha de raciocínio. — Podemos ir lá.
Assenti. Clara avisou à recepcionista que ficaria o resto daquele dia fora da clínica. Saímos daquele lugar e nos direcionamos para a tal lanchonete, que não ficava longe dali.
O estabelecimento em questão não era um lugar luxuoso, mas não era do tipo que um órgão da vigilância sanitária daria uma multa e pediria o fechamento. Era simples, com algumas mesas e cadeiras postas, um balcão com alguns atendentes e uns garçons que iam atender os clientes e trazer os pedidos.
Sentamo-nos em uma das mesas. Rapidamente, um dos funcionários veio querendo saber o que pediríamos. Não sei se foi a ansiedade de reencontrar Clara desde o momento que recebi aquela notícia do Edgar, mas só fui me dar conta de que tinha comido quase nada quando estava naquela lanchonete. Não hesitei em pedir um sanduíche de bauru e um refrigerante. Já a outra mulher, por sua vez, se limitou a somente um suco de maracujá. Aparentemente, havia mais alguém nervoso com o reencontro...
Ficamos olhando uma para outra. Eu sabia que ela não tomaria a iniciativa de puxar o assunto, então isso ficou ao meu cargo:
— E então... Como vão as coisas?
Não respondeu. Clara era tímida, não muda ou sem educação, porém reservada. Estranhei a (falta de) reação dela. Tentei ler em seu olhar o que estava se passando, parecia angustiada. Interpretei a sua feição como pude:
![](https://img.wattpad.com/cover/274323155-288-k833490.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
É pela amizade ou... A história das paulistANAs
RomanceMooca, São Paulo. Ana Beatriz, Ana Clara e Ana Flávia têm mais em comum do que apenas o primeiro nome, são também moradoras do mesmo prédio na capital paulista, colegas de escola na mesma turma e melhores amigas desde quase muito sempre. Infelizment...