Julho de 2015
— Deixe-me olhar um pouco melhor para você.
Rosa foi se aproximando de mim, me examinando e tocando meus ombros e rosto, quase os amassando no processo. Eu estava sem reação diante daquele reencontro inesperado.
— Olha só para você! — continuava ela. — Está tão bonita! Mais alta, mais madura, nem parece que esteve em co... — Pausou. — Desculpa!
— Não precisa se desculpar, professora — eu disse. — Fiz muita terapia para lidar com isso. — Dei um risinho, tentando soar descontraída e voltando, enfim, à realidade.
— Não sou mais sua professora... — respondeu em um tom não de repreensão ou rispidez, mas sim de lamentação. — Não precisa me chamar assim.
— Força do hábito, afinal, é como se eu tivesse concluído o Ensino Médio há poucos meses... — Não pude conter certa tristeza em minha entonação.
Ela ficou alguns segundos me analisando até cair em si:
— Quer dizer que você...
—Sim. — Assenti ainda triste. — Acordei no começo do ano.
Rosa me lançou uma encarada de pura compaixão. Ela se deitou no leito daquele quarto, que era em alguns níveis parecido com o que eu estava ainda na época do coma. Fez um sinal para que minha pessoa tomasse o assento em uma poltrona próxima, o que fiz prontamente.
— Eu sabia que você estava aqui — prosseguiu. — Fiz algumas visitas assim que soube do acidente..., mas é que pedi transferência lá da escola no começo de 2006. Depois, consegui arrumar um segundo emprego, dando aula em cursinhos preparatórios.
— Ah que coisa boa! — exclamei. — Você sempre foi muito didática. Deve ter tirado de letra dando aula em cursinho.
— Obrigada! — falou ela meio sem graça. — Só que isso também foi a minha perdição...
Olhei-a sem compreender o que queria dizer. Logo, emendou:
— Você sabe: eu me divorciei do, até então, meu marido em 2005...
— Pelo que me lembro, ele foi um crápula contigo! — soltei e logo me arrependi. — Ah! Desculpa...
— Não, você está certa. Ele foi isso mesmo ou até pior. — Deu uma risadinha. — Aconteceu de tudo naquele ano: meu divórcio e o acidente de vocês, que chocou não apenas a mim, acredite. Por isso, cheguei à conclusão que já tinha dado o meu tempo ali na Mooca, aí pedi transferência. Não muito depois, veio o trabalho no cursinho.
— E isso foi sua perdição por quê?
— Desenvolvi um hábito provavelmente devido à minha ansiedade... Comecei a fumar.
Só naquele momento, o letreiro do andar onde estávamos veio à tona, mais uma vez, na minha mente. Como um baque, creio que eu tenha entendido o motivo da minha querida professora estar ali.
— Oh meu Deus! — voltei a lamentar.
— Desde o meio do ano passado, comecei a tossir e a sentir fortes dores no peito. Um dia, expeli um pouco de sangue... Não deu outra: o diagnóstico foi câncer pulmonar.
— Eu... sinto muito... — A essas alturas, já estava me controlando para não chorar ali mesmo. — É... benigno?
Um fiozinho de esperança se apossou do meu ser. Porém, desde o segundo que pus os olhos em Ana Rosa, senti que viria bomba... E veio mesmo:
— Segundo os médicos, tenho menos de dois meses de vida, Beatriz.
Não me aguentei mais e derramei as minhas lágrimas, exprimindo todo o meu desespero.
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É pela amizade ou... A história das paulistANAs
RomanceMooca, São Paulo. Ana Beatriz, Ana Clara e Ana Flávia têm mais em comum do que apenas o primeiro nome, são também moradoras do mesmo prédio na capital paulista, colegas de escola na mesma turma e melhores amigas desde quase muito sempre. Infelizment...