Capítulo 22

149 26 664
                                    

Nós três tínhamos passado o resto daquela manhã e início de tarde juntas. Conversamos uma ou outra amenidade e chegamos a almoçar ainda no meu apartamento. Dessa vez, minha mãe não estava conosco. Não que a sua companhia fosse desagradável, muito pelo contrário, porém, aquela pizza de ontem quase que não desceu em nossos estômagos diante de tanto questionamento vindo dela.

Notei que Clara e Flávia estavam mais estranhas do que de "costume". Talvez essa visita que elas fizeram aos seus respectivos antigos apartamentos não tenha sido lá das melhores ideias...

Não indaguei e nem fiz qualquer insistência acerca do que sentiam. Era nítido que aquele comportamento atípico delas, desde que nos reencontramos, tinha a ver com uma possível mancha vermelha em seus passados. Além disso, elas não iriam me dizer nada, iriam ficar mudas ou dariam uma resposta evasiva qualquer, a mais clássica era:

" Beatriz, aconteceu tanta coisa..."

A ansiedade ainda iria me matar... Como promessa era dívida, eu havia lhes dito que agiria sem botar pressão.

A hora da fatídica despedida chega sempre. Lá estava eu dando tchau para as duas nas catracas da estação de metrô Bresser-Mooca. Tinha sim alguma melancolia nesses momentos em que nos separávamos – palavras não eram necessárias para descrever o que se passava na mente de cada uma. Mesmo com aquele jeito enigmático de ambas, residia nelas um sentimento de afeição por mim, assim como eu tinha por elas.

— Vamos nos falando, não? — indaguei sem esconder o meu receio.

— Lógico que sim! Que pergunta idiota, Beatriz! — retrucou Flávia, sempre delicada...

Quase fiz uma tréplica, falando algo como "Não fui eu que quis sumir da Mooca sem mais nem menos...", porém, isso soaria um tanto insensível de minha parte. Limitei-me a apenas uma ofensa:

— Cavala!

Rimos. Foi a vez de Clara seguir com aquela breve conversa antes do adeus:

— É... Ninguém precisa saber do que houve lá na casa da Juliana, não?

Juliana... Parece que nos esquecemos de sua pessoa depois que voltamos e passamos a noite e o dia juntas. De repente, a imagem da nossa antiga colega, ou melhor, integrante da nossa turma de escola do passado voltou com força em minha mente. Era tão nítida a figura dela no meu íntimo que não dava para dissociá-la daquele comportamento igualmente estranho, tal como o das duas moças à minha frente. Realmente, Clara, Flávia e Juliana estavam numa disputa para ver quem era a mais misteriosa e eu não sabia quem seria a vencedora.

— Não, ninguém precisa saber — respondi, tentando ignorar as teorias malucas que começavam a se formar na minha mente. — Aliás, muito obrigada por terem me acobertado durante a pizza de ontem...

— Ah! Por nada! — disse Flávia em um tom mais manso. — Na verdade, pensei um pouco sobre Juliana e estou morrendo de medo até agora...

— Medo? Por quê? — perguntei.

— Não sei... Vai que ela resolve nos meter um processo por invasão de domicílio?

Dei risada e falei:

— Nós a ajudamos com o desmaio e ela até nos serviu café. Só se fosse uma sem noção para pensar em processo depois de tudo.

As duas ficaram me olhando com um ar sugestivo. Captei aquilo na hora:

— Ah! Tudo bem... Ela pode ser sem noção...

— Não duvide do potencial de Juliana... — disse a mulher de traços asiáticos com certo desdém.

É pela amizade ou... A história das paulistANAsOnde histórias criam vida. Descubra agora