CAPÍTULO 4

928 151 51
                                    


A água quente estava batendo na nuca de Abbe há algum tempo Sua atenção estava fixa no ralo, no som que a água fazia quando passava por ele. 

As pernas não aguentavam o próprio peso. Então ficou sentada sobre elas, na banheira, como se seu corpo fosse grande e pesado demais para o seu espírito.

Era exatamente um vegetal, desde que acordara do sono profundo, depois de engolir três comprimidos, a mando da mulher de cabelos pretos.

_ Precisa de ajuda, senhorita? _ A mulher de repente bateu na porta do banheiro, que estava aberta.

Abbe não respondeu, mas sabia que estava na hora de se levantar. E assim o fez, apoiando-se no mármore suado da parede. Desligou o chuveiro. Alcançou a toalha no box  e a enrolou no corpo. Ainda havia um pequeno resquício da maquiagem em torno dos olhos. Percebeu quando passou pelo espelho sobre a pia.

No quarto, a mulher a ajudou a vestir uma roupa confortável. Penteou cuidadosamente seus cabelos. Removeu a maquiagem do seu rosto.

_ Está pronta para comer? _ Ela perguntou quando terminou. Abbe percebeu a bandeja com um ensopado e um copo de suco na mesa ao lado.

Concordou maquinalmente, mas a mulher mal se aproximou e Abbe já se sentiu enjoar. Cobriu a boca e respirou quando a ânsia começou.

_ Tudo bem.  Pode tentar quando quiser, meu bem _ A mulher a alentou, sorrindo docemente.

Abbe sentou-se na cabeceira da cama, a coluna levemente inclinada. O vazio em sua mente já começava a fazer ecos, quando a mulher de repente disse, com empolgação:

_ Fui autorizada a levá-la a um passeio, Srta Branne.

Apesar da súbita excitação na voz da mulher, a garota não conseguiu reagir. Não estava em condições de decodificar o que ela dizia.

A mulher parecia não entender o estado dormente da refém, pois abriu a cortina alegremente. Abbe cobriu os olhos quando o sol atravessou o vidro da janela.

_ O sol a incomoda? _ Perguntou, meio surpresa.

Abbe não respondeu. Então, a mulher voltou a fechar a cortina.

_ Ah! Já passou da hora de eu dizer meu nome, não é mesmo? _ A mulher riu discretamente, balançando a cabeça para o lapso. _ Sou Holly Andie Folly. Mas pode me chamar de Holly. Não senhora Folly. Não faça isso, por favor.

Ela olhou para Abbe envergonhada, como se tivesse dito alguma piada. Certamente esperava que a moça risse da estranha rima do seu nome.

Mas não foi o que aconteceu. Abbe instintivamente lembrou-se de Holly Golightly do filme Bonequinha de Luxo. Lembrou-se também da feição inspirada da Srª Gebitte do começo ao fim do filme sempre que assistiam, o que a fez sorrir dentro da mente. 

_ Como eu estava dizendo... _ A mulher voltou a falar, começando a dobrar umas roupas. _ Estou autorizada a levá-la a um passeio no nosso jardim. Sei que ainda não está confortável com a novidade, mas o quanto antes sair deste quarto, melhor será para a senhorita.

Holly se aproximou. Segurou as mãos dela com afeto. Então Abbe aceitou se levantar e a seguir para a fora do quarto. A casa era enorme. Poucos móveis, as paredes brancas como num hospital. Um estilo que evidentemente destoava dos móveis clássicos do quarto. Mas logo passaram por um longo corredor de teto e paredes de vidro, e o excesso de luz solar em seu rosto afastou magicamente a primeira impressão.

Abbe ainda não tinha atravessado a grande porta de vidro para fora quando sentiu o cheiro úmido de floresta. Respirou com um pouco de alívio quando pisou a grama úmida.

Canção para o Anjo I (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora