Aquele domingo amanheceu envolto em uma aura especial. Beatriz acordou cedo e se vestiu para ir à missa, algo que não fazia há muito tempo. Colocou um vestido branco esvoaçante, que se amoldava perfeitamente à sua barriga de gestante, e sorriu para si mesma. Em poucos minutos, a campainha soou, e Vítor entrou ainda sonolento. A seu lado, o espírito de Lorena também se havia preparado para aquele momento. Era a primeira prece feita para ela a que compareceria com espontaneidade, feliz mesmo. Quando desencarnara, Gilson mandara rezar missa de sétimo dia e de mês, mas ela pouco aproveitara das orações. Agora era diferente. Estava ansiosa para receber, novamente, aquela enxurrada de luz que descera sobre ela no dia em que Beatriz fizera sua pequena prece.
Além deles, apenas Gilson compareceu à igreja. Beatriz convidou os pais, mas eles se recusaram a ir, para seu desapontamento. Lorena entrou na igreja ao lado do filho, entre lágrimas de arrependimento e satisfação. Observou as flores brancas no altar e comoveu-se com a Ave Maria de Bach tão bem executada ao órgão, imponente no mezanino de onde derramava seus acordes vibrantes.
Quando o padre proferiu seu discurso, Lorena se deliciou com a nova torrente de luzes e cores que inundou o ambiente. Tocada por aquele arco-íris de bênçãos, chorou, sentindo em seu coração uma paz e uma quietude que há muito não experimentava. Olhou de soslaio para o filho e Beatriz, que pareciam contritos, envolvidos na oração. Gilson, do outro lado, permanecia de cabeça baixa, e ela notou que seus pensamentos se voltavam para ela com um misto de saudade e culpa.
Quase no final da missa, ela se aproximou do marido, que tinha lágrimas nos olhos.
Gentilmente, colocou a mão sobre a testa dele e soprou ao seu ouvido:
- Não se lamente. Não foi culpa sua. Hoje compreendo.
Gilson não ouviu as suas palavras, mas foi tocado por uma emoção sem igual, e as lágrimas em seus olhos se transformaram em cascatas, fazendo escorrer pelo seu rosto o peso da dor de todos aqueles anos. Pela primeira vez em muito tempo, Lorena o abraçou com carinho. Vitor se aproximou, surpreso com a reação de Gilson. Não sabia o quanto ele sofria a perda da mulher.
- Pai - sussurrou ele, envolvendo Gilson num abraço. - Não fique assim. Já passou.
Mas Gilson, por mais que desejasse parar de chorar, sentia a presença de Lorena a seu lado e captava-lhe as sensações, misturando, às suas, as emoções sentidas da mulher. Lorena o abraçou novamente, causando-lhe ainda mais tristeza, até que ela, percebendo que lhe fazia mais mal do que bem, afastou-se decepcionada.
- Não se preocupe com isso - ela ouviu uma voz lhe dizer.- Gilson está angustiado, e a sua presença traz à sua memória inconsciente coisas que ele jamais gostaria de ter vivido para não ter que lembrar.
Assustada, Lorena se voltou bruscamente, dando de cara com um espírito esvanecente, envolto numa espécie de halo luminoso.
- Quem é você? - indagou temerosa. - Sinto que já o conheço, embora não me lembre bem de onde.
- Isso não tem importância. Importante mesmo é que você resolveu aceitar ajuda.
- Não pedi a sua ajuda.
Havia um tom de agressividade em sua voz que ela não conseguiu conter, mas isso não intimidou o espírito, que retrucou com um sorriso bondoso:
- Essa entonação de voz não combina com o ambiente, não acha? Nem combina mais com você.
- Por que diz isso?
- Deixe de lado a rebeldia, Lorena. Se você não tivesse se sentido tocada pela luz divina, não estaria aqui.―
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Gêmeas - Não se separa o que a vida juntou
EspiritualLivro escrito pela autora Mônica de Castro, apegada ao espiritismo e foi nesse mundo onde conhece Leonel, um espírito que mostra a ela história que teve com seu amor ainda em vida. Acreditando ou não em espiritismo eu peço que se permita ler essa n...