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Carminha entrou em casa em total descontrole. A história de Graziela trouxera de volta à sua mente um passado que não gostava de recordar. Uma dúvida atroz a consumia, e ela ficava dizendo a si mesma que era impossível. A história de Graziela podia ser parecida com aquela à qual estava ligada, mas não era a sua. Não podia ser. 

Encontrou Renato recostado na cama, uma papelada do escritório espalhada sobre o lençol. Ele levantou os óculos de leitura quando ela entrou e abriu um sorriso, desmanchando-o em seguida, ao notar o ar de preocupação e dúvida que emoldurava as feições da mulher. 

- Aconteceu alguma coisa? - o indagou preocupado. 

Ela ficou olhando para ele com ar de mistério, até que se aproximou e perguntou sem rodeios: 

- Quando você foi buscar Beatriz lá naquela roça...

 Ao ouvir aquelas primeiras palavras, Renato deu um salto da cama, fazendo sinal para que ela se calasse, e correu para a porta do quarto, trancando-a, não sem antes se certificar de que ninguém estava por perto. 

- Ficou louca, Carminha? - a censurou num sussurro. - Quer que as crianças escutem? 

- Preciso esclarecer certas coisas - rebateu ela, no mesmo tom de murmúrio. - Tive uma conversa hoje com Graziela que me deixou estarrecida. 

- Que conversa? 

- Você sabia que ela teve duas filhas gêmeas, que foram tiradas dela no dia em que nasceram?Renato gelou. Nunca antes havia conversado com Carminha sobre os detalhes da adoção de Beatriz. 

Dissera-lhe apenas que recebera um telefonema e partira para buscar a criança no interior de Mato Grosso. 

- O que temos com isso, Carminha? 

- Espero que nada. Mas eu preciso me certificar. Quando você foi buscar Beatriz, chegou a ver os pais dela? 

O passado deslizou pela mente de Renato com a rapidez de um tufão, e ele apertou os lábios com força, como se quisesse espantar para longe aquelas lembranças indesejáveis. 

- Você sabe que não fui eu quem a buscou. 

- Mas você foi lá..

- Fui até Cuiabá e fiquei esperando no hotel. Levaram-me a menina lá. 

- Quem levou? 

- As pessoas que contatamos... As que - ele abaixou a voz e ciciou de forma quase inaudível: - nos venderam a criança. 

- Havia uma menina só? 

- É claro que havia só uma. Que idéia! 

- Qual era o nome da cidade onde foram buscar a criança? 

- E eu é que sei? Por que ia me preocupar com essas coisas? Nós pagamos por um bebê, e eu fui buscá-lo. 

- Você passou quase uma semana fora. Lembro-me que quase morri de tanta aflição. 

- Isso foi porque eu tive que esperar o bebê nascer. Acho que você se esqueceu de como foi o nosso trato com aquela gente. O combinado era que eles nos ligariam quando o parto estivesse próximo, para que eu aguardasse o nascimento e levasse a criança logo no seu primeiro dia de vida. Foi o que fiz. 

- Aquela gente pode ter roubado uma criança - arrematou ela com rispidez. 

-  Olhe, Carminha, o que nós fizemos pode não ter sido lá muito honesto, mas foi o único jeito na época. Você estava desesperada, já tinha feito três abortos. Entrar na fila de adoção ia demorar muito, e eu estava preocupado com a sua depressão. Conversamos, e você aceitou. Não fizemos mal a ninguém. 

Gêmeas - Não se separa o que a vida juntouOnde histórias criam vida. Descubra agora