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Os gritos de Beatriz chegaram aos ouvidos de Carminha, que acordou assustada. A seu lado, o lugar vazio indicava que Renato não havia voltado, e ela sentiu uma leve apreensão, a sensação indescritível da tragédia. Rapidamente, levantou-se da cama, vestiu o robe de seda e partiu em direção à voz. Encontrou Beatriz na sala, lutando com Vítor, que se esforçava para acalmá-la e fazer com que ela se sentasse.

- Tenha calma, Beatriz - dizia ele. - Vai acordar todo mundo.

- Solte-me, Vítor! - protestava Beatriz. - Preciso falar com ela agora.

- Posso saber o que é que está acontecendo? - interrompeu Carminha, espantada com o que lhe parecia uma briga entre os dois. 

Na mesma hora, Vítor soltou Beatriz, que se virou para a mãe com os olhos em chamas.

- Beatriz não está bem - falou ele. - Tem que descansar, mas não quer me dar ouvidos.

- Precisamos conversar - disse Beatriz secamente, ignorando as palavras e a preocupação do namorado.

- Há essa hora? - a retrucou, olhando para Vítor de esguelha, como a lhe perguntar o que estava acontecendo.

- Por que não me disse que eu era adotada quando lhe perguntei? 

A pergunta saiu tão direta que Carminha se engasgou e teve um acesso de tosse, mas Beatriz permaneceu impassível, sem qualquer sinal de preocupação.

- O que está dizendo? - balbuciou Carminha, entre uma tosse e outra. - Essa história de novo?

- Por favor, Bia, agora não - implorou Vítor, mas ela não lhe deu atenção.

- Não adianta mais mentir, mãe. Já sei de tudo.

- Tudo o que? Pelo amor de Deus, Beatriz, não me vá dizer que andou dando ouvidos a gente maluca, que inventa histórias mirabolantes.

- Minha irmã gêmea não é maluca nem saiu de uma história mirabolante. É bem real e, assim como eu, só agora descobriu que era adotada.

- Mas que irmã gêmea? - Carminha começou a andar pela sala, tentando, desesperadamente, conter o curso da revelação iminente. - Você não acredita mesmo nisso, acredita? Sei que há uma moça parecida com você por aí, mas isso não significa que ela seja sua irmã.

- Você sabia. Você a viu! Por que não me disse que a encontrou no zoológico e falou com ela?

- Não achei que fosse importante. É só uma desconhecida.

- Onde já se viu uma desconhecida que é a minha cara? - Carminha ia protestar, mas Beatriz não lhe deu chance. - Eu a vi, mãe. Falei com ela!

- Isso é impossível! Você não vê? Tem alguém tentando destruir a nossa felicidade.

- Pare com isso! - gritou Beatriz de repente. - Será que não percebe que não adianta mais mentir? Por que insiste em algo que eu sei que é mentira? Não é mais fácil falar a verdade?

- Por Deus, Carminha - suplicou Vítor -, se isso for verdade, por favor, diga logo ou Beatriz vai acabar tendo um ataque. Ela já passou mal, e sua pressão deve estar nas alturas. 

Carminha se deu por vencida. O estado da filha inspirava cuidados, e ela não queria que nada de mau lhe acontecesse ou ao bebê.

- Fiz tudo por você, Beatriz - começou ela entre lágrimas. - Amei-a e a amo como se você fosse minha filha verdadeira. E você é minha filha verdadeira. Você e Nícolas...

-  Nícolas também é adotado? - cortou ela com rispidez, e Carminha assentiu. - Por que não nos disse antes?

- Tive medo... Coloque-se no meu lugar. Eu estava insegura, temendo perder vocês. Já havia perdido três bebês, e foi quando seu pai surgiu com a idéia da adoção. No princípio foi difícil. Eu queria muito engravidar, mas não foi possível. Por mais tratamentos que fizesse, abortava naturalmente antes de concluído o terceiro mês de gestação. Você não pode imaginar como eu sofri.

Gêmeas - Não se separa o que a vida juntouOnde histórias criam vida. Descubra agora