capitulo 14

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Dodó: Toby, você é o meu melhor amigo. Toby: E você é o meu também, Dodó. Dodó: E nós vamos
ser amigos para sempre, não vamos?Toby: É. Para sempre.
(O cão e a raposa)

Cheguei na aula hoje e a primeira coisa que eu vi foi que o Leo continuava sentado perto da Vanessa. Senti uma
coisa meio ruim por dentro, realmente eu gostava de tê-lo por perto... fiquei lembrando do dia em que a gente se
conheceu.
Era meu terceiro dia no colégio novo. A única pessoa que conversava comigo na sala era a Gabi, mas ainda não
éramos propriamente “amigas”, apenas simpatizávamos uma com a outra. Era o primeiro horário, e lembro
perfeitamente que a Irmã Imaculada estava explicando sobre o cronograma anual e eu estava desenhando umas
florzinhas no caderno, lamentando o fato de não terem me colocado na sala da Natália, que – além dela que eu já
conhecia – parecia ter muito mais gente legal e menos “panelinhas” como na sala em que eu fiquei.
Foi quando, quinze minutos depois da aula começar, bateram na porta e, em seguida, um menino que não tinha
vindo nos dois primeiros dias de aula, com o cabelo todo atrapalhado, parecendo que tinha vindo pro colégio de
moto ou algo assim, colocou só a cabeça pra dentro da sala e falou: “Dá licença, Irmã?”, com um sorrisinho meio
sem-vergonha.
Ela nem parou de falar, só fez sinal para que ele entrasse, e eu pensei que fosse normal todo mundo entrar na
hora em que bem entendesse... mas, para minha surpresa, um minuto depois chegou um outro menino e ela passou
o maior sermão nele sobre como alunos atrasados atrapalham a aula por desviar a atenção da sala inteira e falou
que ele ia ter que esperar o próximo horário para entrar. Eu fiquei meio admirada pela diferença do tratamento
dela em relação aos dois alunos, mas aos poucos eu fui percebendo que não só os professores, mas todo mundo
tratava aquele menino do cabelo atrapalhado (que depois eu descobri que era o normal do cabelo dele) meio
diferente, como se ninguém conseguisse brigar com ele por motivo algum.
No intervalo entre a primeira e a segunda aula, nesse mesmo dia, eu estava conversando com a Gabi, quando o
tal menino chegou por trás.
“Não vai me apresentar pra sua nova amiga, não, Gabi?”, ele perguntou.
“Como se você não fosse se apresentar de qualquer jeito...”, a Gabi falou. E, virando para mim, disse: “Leo –
Estefânia, Estefânia – Leo”.
Eu, na mesma hora, fiz uma careta quando ouvi aquele “Estefânia”, mas aí o Leo disse: “Esse nome é meio
grande, tem algum apelido?”.
“Fani!”, eu respondi aliviada.
Ele deu um sorriso bonitinho e falou: “Ah, combina bem mais com você! Muito prazer, Fani!”.
Foi amizade à primeira vista.
A partir daí, não nos desgrudamos. Eu, que não tinha nenhum amigo nesse novo colégio, de repente me vi com
dois: Gabi e Leo. Os melhores amigos que alguém poderia escolher.
E foi por isso que me deu essa tristeza ao constatar o afastamento dele... tipo, o Leo é superpopular, é amigo de
todo mundo, se dá bem com todos os grupos, mas eu me sentia meio que preferida, quem ele escolhia para sentar
junto, fazer os trabalhos, compartilhar o recreio, passar bilhetinhos... e agora estou me sentindo assim, um pouco...
traída.
Engraçado pensar isso, traição de amigo. Nós não temos nenhum contrato, compromisso, não somos sócios,
casados, namorados... nada. Apenas amigos. Mas ainda assim eu estou me sentindo um pouco passada pra trás,
trocada...
Foi isso que eu fiquei pensando durante a aula inteira, até que, no último horário, para o meu alívio e felicidade
completa, o Marquinho entrou na sala, todo bronzeadinho, mais lindo do que nunca! Eu não pensei em mais nada.
Ele fez a chamada, como sempre demorou um pouco mais do que o necessário naquela olhadinha na hora do
meu nome, e explicou que esteve ausente porque estava participando de um congresso de Microbiologia em
Fortaleza (está explicado aquele bronze todo!). Depois se levantou, começou a ensinar a matéria e eu babei a aula
inteira. Ele estava tão lindo com aquela calça branca, sandália de couro e blusa de listrinha... e além disso hoje ele ainda estava com uma tiarinha (deve ter comprado em Fortaleza) no cabelo, para não deixar a franja cair no olho...
simplesmente perfeito.
A aula acabou, eu dei um jeito de ser a última a sair da sala, junto com ele, fomos andando lado a lado até o
local onde a gente inevitavelmente tem que se separar (ele vai pra sala dos professores, e eu pra saída de alunos),
e aí ele virou pra mim e perguntou: “Quais são os planos para o fim de semana, Estefânia?”.
Eu engasguei, gaguejei e consegui falar que não sabia ainda, que talvez fosse ao cinema... aí eu estava crente
que ele iria me desejar “bom filme” e dar tchau, mas ele continuou: “Ah, você gosta de cinema? Que estilo?”.
Eu não podia falar pra ele que eu gostava de “filme de amorzinho”, né? Aí eu fiz uma cara de pensativa e disse:
“Ah... um pouco de tudo... ficção, comédia, arte...”, e aí ele abriu um sorriso e disse que, já que eu gostava de
filmes de arte, não poderia perder um filme que estava reprisando numa mostra de cinema iraniano.
“Filhos do paraíso”, ele disse o nome. “Não deixe de assistir. Quero saber o que você achou depois.”
Eu só consegui fazer que sim com a cabeça, ele sorriu e, aí sim, deu tchau e me deixou no corredor, que nem
uma boba, esperando que ele desaparecesse pra dentro da sala dos professores.
Cheguei em casa e liguei pra Gabi antes mesmo de almoçar. Falei que ela PRECISAVA ir ao cinema comigo no
domingo, já que eu sabia que ela estava indo pro sítio da família dela ficar sexta e sábado. Ela concordou,
perguntou se eu já tinha resolvido a nossa dúvida cruel entre assistir primeiro A sogra ou Amor em jogo, mas eu
falei para ela que não era nada disso... o filme que ela iria ver comigo era outro bem diferente: Filhos do paraíso!

Fazendo meu FilmeOnde histórias criam vida. Descubra agora