Capítulo 32

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Jack: Eu estou muito envolvido agora. Você pula, eu pulo, lembra? Eu não posso virar as costas sem
saber se você vai ficar bem... isso é tudo que eu desejo.Rose: Eu estou bem... eu vou ficar bem... de
verdade.
(Titanic)

Finalmente, a sexta-feira chegou! Nunca vi uma semana passar tão devagar quanto esta! Plenas férias e não tem
nada pra fazer nesta cidade! Já vi todos os filmes em cartaz, com essa chuva ininterrupta não dá pra ir pro clube,
não passa nada que presta na televisão... só me restou mesmo ficar torcendo pra sexta chegar logo.
Ontem, pelo menos, eu fui ao shopping com a Gabi. Ela queria comprar uma roupa nova pra ir à festa da sala
hoje. Muito interessante o poder que uma paixão tem sobre uma pessoa. A Gabi comprando roupa nova! Diz ela
que isso não tem nada a ver com o Cláudio, mas essa é a única explicação pelo interesse súbito dela por moda.
Depois do shopping, eu tinha salão marcado e perguntei se ela queria ir comigo. E não é que ela topou?
Enquanto eu fiz as unhas, ela cortou o cabelo. Finalmente, resolveu igualar as pontas, e o jeito que a cabeleireira
arrumou realmente valorizou o rosto da Gabi.
A Natália também ficou nos preparativos pra essa festa a semana inteira. Só que ela não foi modesta como a
Gabi... ela fez o pai dela comprar uma roupa caríssima da M. Officer exclusivamente pra ela se exibir pro Mateus.
Ela apareceu lá em casa, com a sacolinha, toda sorridente. Colocou a roupa e me fez falar 263 vezes que ela estava
muito bem no modelo e que o Mateus com certeza ia achá-la a mais bonita da noite.
Inclusive eu, que até um mês atrás não queria nem ouvir falar nessa festa, comecei a ficar animada. Depois
daquela briga toda com a Vanessa por causa do lugar, eu realmente achava que a festa ia acabar sendo no pátio do
colégio mesmo, o que não teria graça nenhuma, já que, além de ser pequeno, não pode ter música alta por causa
da vizinhança. Mas o Lucas, um menino que senta lá na frente, acabou oferecendo a casa da avó dele. Parece que a
tal casa está sendo vendida e por isso está completamente vazia, o que nos deu um grande espaço para decorar e
convidar quem a gente quisesse. Cada aluno teve que vender (ou pagar) cinco convites (eu só usei dois, os que eu
dei pra Natália), e com esse dinheiro pudemos comprar bebidas e comidas.
Minha única tristeza é que as notas iam sair no mesmo dia, o que eu sabia que com certeza ia me deixar sem
astral nenhum na hora da festa.
Deu oito da manhã e eu já estava de pé. Os boletins iam ser entregues a partir das dez, mas nove e meia eu já
estava lá. A secretaria ainda nem estava aberta e eu me sentei na frente do colégio pra esperar. Alguns poucos
alunos já estavam esperando também.
Eu estava pensativa, olhando pro chão, e não reparei que alguém estava vindo em minha direção. Quando ouvi
meu nome, tomei o maior susto, e mais ainda quando vi quem era.
“Oi, Fani, posso conversar com você um pouquinho?”
Eu olhei para a cara dele sem a menor vontade de falar sim, mas sem a menor coragem de dizer não.
Completamente sem graça, balancei a cabeça afirmativamente e arredei um pouquinho pro lado, achando muito
constrangedora aquela situação.
Como essa vida é irônica... tudo o que eu mais queria um tempo atrás estava acontecendo naquele momento. E o
engraçado é que naquele momento eu não queria aquilo mais: o Marquinho se sentar ao meu lado e pedir para
conversar comigo.
Eu fiquei esperando ele falar, segurando minha bolsa bem firme na minha frente como se fosse um escudo ou
algo assim. Reparei que ele também estava meio sem jeito, então eu falei: “tudo bem?”, só pra ver se ele falava
logo o que queria e acabava com aquele suplício de uma vez. Funcionou.
“Fani, eu queria te falar que você foi a minha melhor aluna esse ano. A mais interessada, a que fez perguntas
mais inteligentes e que tirou as melhores notas. Não sei se você tem interesse em fazer vestibular na área de
biológicas, mas eu acho que você deveria”, ele falou bem sério, olhando pra mim.
Era isso então! Eu crente que ele ia falar algo a respeito dos telefonemas, da mulher dele ou coisa parecida...
Comecei a sorrir meio aliviada, já ia falar que não, que eu ia fazer vestibular pra Cinema, quando ele abriu a boca
de novo.
“Eu queria falar também que eu fiquei muito triste por causa de algumas coisas que aconteceram entre nós em
um aspecto mais pessoal... eu realmente não queria que algumas coisas tivessem sido do jeito que foram...”
Eu olhei pra ele com cara de dúvida, mesmo que estivesse morrendo de vergonha, e perguntei: “Coisas?”.
Ele deu um suspiro meio sem paciência, olhou para os lados e falou em um tom mais baixo: “Fani, eu realmente
acho você uma menina e tanto. Além de ser inteligente, é uma gatinha. E não é afetada como as meninas bonitas
de hoje em dia. Você se destaca. Realmente, eu fiquei interessado em você, apesar de, como você acabou
descobrindo, eu ser casado. Mas eu queria te falar que isso não teria acontecido se o meu casamento estivesse
100%. Eu e a Cristina estamos meio em crise...”.
Ele continuou a falar umas coisas sobre o casamento dele e veio me dando uma raiva por dentro! O que ele
estava achando? Que eu iria consolá-lo pelo fato do casamento dele estar indo mal? Pra começar, será que ele
achava que eu ia acreditar naquela história?
Ele começou a falar que estaria disposto a tentar, se eu quisesse e, de repente, começou a passar o dedo
devagarzinho na minha mão. Nessa hora foi como se eu tivesse levado um choque, não sei se pelo toque ou por ele
estar sugerindo que eu virasse amante dele!
Levantei-me depressa, e minha bolsa caiu, derrubando no chão tudo o que tinha dentro. Que situação
humilhante!
Comecei a catar as coisas, o Marquinho fez que ia ajudar, eu já ia falar que podia deixar, quando atrás de mim
uma pessoa ajoelhou e começou a pegar minhas moedas, que estavam todas espalhadas ao meu redor. Eu ia virar
pra falar que as moedas eram minhas, quando a tal pessoa falou no meu ouvido para que só eu ouvisse: “Esse cara
está te incomodando?”.
Tomei um susto quando ouvi aquela voz! E um alívio como eu nunca senti na vida!
“Leo!” Foi só isso que eu consegui falar.
Nós pegamos o resto das coisas rápido e levantamos. O Marquinho também já tinha levantado e estava olhando
pro Leo com uma expressão meio aborrecida. Ele fez que ia falar mais alguma coisa comigo, mas eu virei a cara
sem dizer nada e saí puxando o Leo.
Chegamos na esquina e o Leo me parou.
“Fani, espera, me fala o que aconteceu, você está branca! Quando cheguei vi o cara esfregando a mão na sua e
você levantando assustada, ele falou alguma coisa... chata pra você?”
Eu estava tão horrorizada com o Marquinho e tão aliviada ao mesmo tempo pelo Leo ter chegado na hora
certinha que não conseguia nem falar. O Leo viu que eu estava tremendo e me abraçou pra tentar me acalmar.
Começou a passar a mão no meu cabelo e ficou falando no meu ouvido: “Olha, se você não quiser falar, tudo bem,
mas acho que você não deve guardar isso pra você. Eu sei que você gostava desse cara e confesso que eu fiquei
feliz quando soube que ele era casado. Ele não tem o menor direito de te assediar, primeiro por causa do estado
civil dele, depois porque você é menor de idade! Se você quiser que eu o denuncie...”.
Eu estava quase começando a chorar, o Leo segurou os meus ombros, me pediu pra ter calma e continuou a
falar bem baixinho: “Fani, eu não vou fazer nada que você não queira. Mas não gosto de te ver triste e muito
menos que te façam de boba. Promete para mim que pelo menos você vai ficar bem longe dele?”.
Eu fiz que sim com a cabeça e aí fiquei olhando pro chão um tempinho, completamente envergonhada.
Ele sorriu, me abraçou de novo e me deu um beijinho na bochecha. E, subitamente, eu me lembrei de uma frase
da reportagem da Caprichosa, que eu tinha lido tantas vezes durante a semana.
“Acontece que, de repente, você começa a imaginar como seria se aquele beijinho que ele sempre te dá na
bochecha escorregasse um pouquinho mais para o lado...”

Fazendo meu FilmeOnde histórias criam vida. Descubra agora