capitulo 42

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Brian: Sabia que a aparência das pessoas muda conforme você as conhece? Como uma pessoa
atraente, se você não gosta dela, se torna feia? Ao passo que alguém que você talvez nem tenha
notado, para quem não olharia mais de uma vez, se você ama essa pessoa, ela pode se tornar a coisa
mais linda que você já viu?
(Feito cães e gatos)

Assim que cheguei em casa, liguei para as meninas. Tanto a Gabi quanto a Natália falaram a mesma coisa, que
foi um progresso e tanto e que era pra eu continuar por perto no dia seguinte, não deixar que ele se afastasse
novamente.
Pensando nisso, cheguei atrasada de novo e tornei a me sentar ao lado dele. A professora estava entregando as
provas. Quando chegou a minha vez, me deu o maior medo de ter tirado zero, levantei tão depressa que até
tropecei na minha mochila! O Leo perguntou se eu estava bem, eu balancei a cabeça dizendo que sim – na verdade
eu tinha batido o joelho na carteira, mas, como o Leo se preocupou, a dor valeu a pena – peguei a prova e nem
acreditei! 40! Ou seja, eu só ia precisar tirar 20 na outra prova, que valeria 55!
Eu ainda estava olhando a minha prova, completamente aliviada, quando a professora falou o nome do Leo e ele
se levantou para apanhar a dele. Ele voltou meio cabisbaixo, eu olhei para ver quanto ele tinha tirado e estava
escrito 25. Não era muito ruim, mas certamente ele teria que estudar um pouco mais se quisesse tirar os 35 que ia
precisar pra passar...
Não perdi tempo.
“Leo, você quer estudar comigo? Não que eu ache que você precise da minha ajuda, mas é que é mais produtivo
estudar junto, além de ser menos chato...”, eu sugeri, no fundo sem a menor esperança.
Ele me olhou, olhou da prova dele para a minha, e para a minha grande surpresa falou: “Se você quiser
mesmo... quando você pode?”.
Eu abri o maior sorriso. Apesar de saber que a minha mãe não ia gostar nada dessa história, falei que podia ser
na hora que ele quisesse! Sugeri que o estudo fosse na minha casa, mas ele falou que seria melhor na casa dele,
porque qualquer dúvida a gente poderia perguntar para o Luciano – um dos irmãos dele que é dois anos mais velho
do que a gente e está fazendo vestibular.
“E também porque a mamãe todo dia pergunta de você!”, ele completou, me deixando feliz da vida por saber
que pelo menos a mãe dele continuava gostando de mim.
Sendo assim, acordei toda animada na manhã seguinte. A aula foi normal, perguntei para o Leo se estava de pé
e ele falou que sim, às 15 horas.
Nem almocei direito. Fui correndo tomar banho, ajeitei o cabelo de um modo que não parecesse que eu tinha
passado um tempão arrumando – embora eu tivesse –, coloquei um vestidinho jeans, passei meu perfume que tem
cheirinho de neném e fui.
Minha mãe perguntou se eu queria que ela me levasse, mas eu disse que iria a pé mesmo (pra gastar um pouco
da ansiedade no caminho). Ao contrário do que eu pensei, ela não reclamou do estudo na casa do Leo, já que eu
tinha tirado nota boa na primeira prova e tinha dito que era pra ajudá-lo, porque pelo visto eu estava sabendo mais
a matéria...
Chegando ao prédio dele, que fica a uns vinte minutos de caminhada do meu, pedi para o porteiro me anunciar.
Na mesma hora, o Leo pediu que eu subisse. Entrei completamente tensa no elevador, dei mais umas 317 olhadas
no espelho durante os 53 segundos que demoram pra chegar no décimo andar, onde ele mora, respirei bem fundo
e toquei a campainha.
A mãe dele atendeu toda sorridente, como sempre.
“Fani, minha querida!”, ela falou, me abraçando. “Nossa, quanto tempo! Eu estava perguntando para o Leo se
você tinha arrumado algum namorado ciumento que não deixava você vir aqui visitar a gente, porque não é
possível! Que sumiço!”
“Antes fosse, dona Maria Carmem, antes fosse...”, eu pensei.
“Ah, muito estudo, né...”, eu falei, enquanto ela me levava para a sala, “e eu não sei se a senhora está sabendo
que eu vou fazer intercâmbio, então estou tendo que participar de uns encontros de orientação, olhar uniforme,
distintivo, cartãozinho, visto, passagem... ih, um monte de burocracia!”
A gente ficou falando sobre isso um tempo, ela começou a contar das viagens que já tinha feito para o exterior e
foi quando o Leo apareceu, com o cabelo meio molhado, uma blusa cinza e a sua típica calça jeans surrada.
É tão estranho como uma pessoa fica diferente aos nossos olhos quando o sentimento da gente muda... eu já vi o
Leo milhões de vezes, mas de repente ele ficou muito mais bonito! É certo que eu sempre o achei uma gracinha, o
sorriso dele é um dos mais charmosos que eu já vi, mas de uma hora pra outra parece que ele ficou iluminado.
“Mamãe,” ele falou enquanto entrava na sala, “eu e a Fani temos que estudar. Melhor você deixar pra colocar a
conversa em dia numa outra hora. Vamos ficar na copa, não faz muito barulho na cozinha, por favor...”
Acho tão bonitinho o jeito que o Leo chama a mãe dele... “mamãe”. Parece que ele é um menininho! A mamãe
dele falou que a gente não precisava se preocupar, que ela só ia à cozinha para terminar o lanche que estava
fazendo para a gente (nham!) e que o Luciano deveria chegar por volta das quatro e meia, mas que fora isso a
gente ia ter silêncio total.
“Depois que a gente terminar de estudar eu quero te mostrar uma coisa”, ele falou casualmente, mas minha
curiosidade na mesma hora deu sinal.
“Que coisa, Leo? Você sempre faz isso, né? Adora me deixar curiosa!”
Ele riu, falou que não era nada de mais, mas que era melhor estudarmos primeiro.
Pegamos os cadernos, eu olhei a prova dele para ver o que ele tinha errado, e começamos a refazer todos os
exercícios já dados. Depois ele criou uns exercícios para mim e eu criei outros pra ele, fizemos tudo, corrigimos...
exatamente como costumávamos fazer antigamente.
A única diferença era que antes eu não tinha consciência do calor exalando do corpo dele ao lado do meu... nem
do cheirinho suave de banho quando ele passava a mão pelo cabelo... nem do ligeiro choque nos meus dedos a
cada vez que a mão dele sem querer encostava na minha.
O irmão dele chegou às cinco horas. Estávamos tão concentrados que só reparamos quando ele falou “oi”
parado bem na nossa frente.
Nesse instante, a dona Maria Carmem entrou na copa, falou que era bom que a gente fizesse um intervalo e que
ela ia servir um lanchinho.
“Mamãe, enquanto você arruma a mesa”, o Leo falou, enquanto a gente guardava o nosso material, “eu vou
mostrar uma coisa pra Fani, rapidinho.”
Eu nunca tinha entrado no quarto do Leo, apesar de já ter ido à casa dele várias vezes. A primeira foi no dia do
aniversário dele, quando eu resolvi fazer uma festa surpresa e para isso tive que ligar para a dona Maria Carmem
e perguntar – na maior cara de pau – se poderia ser lá, já que seria o lugar mais fácil de surpreendê-lo. Foi a
primeira vez que eu conversei com ela, eu estava morrendo de vergonha de pedir tal coisa, mas ela me deixou à
vontade no mesmo instante, adorou minha ideia e disse que a torta era por conta dela! O Leo realmente ficou
surpreso ao ver aquele tanto de gente entrando na casa dele cantando parabéns. E a mãe dele ficou
superagradecida por alguém ter organizado uma festinha tão diferente pro caçulinha dela. A partir desse dia, ela
começou a me tratar como se eu fosse a nora dos seus sonhos. Engraçado é que antes eu achava a maior graça
disso...
Passamos pela sala, entramos no corredor e chegamos ao quarto dele. Eu fiquei olhando tudo, tentando
absorver cada detalhe para lembrar mais tarde. O Leo até que era bem organizado, bem mais do que eu! O meu
quarto tem coisa pra tudo quanto é lado, livros no chão, DVDs em cima do computador, roupas a serem
guardadas... no dele tudo estava no lugar certinho. A cama no meio, os armários fechados, uma escrivaninha
impecável, e em uma quina do quarto eu vi o que ele estava querendo me mostrar.
“Este aqui é o meu equipamento!”, ele me mostrou, todo sorridente. “É aqui que eu faço os meus CDs, escolho
as músicas, mixo... me divirto!”
Era realmente um equipamento profissional. Tinha duas caixas de som enormes, dois CD-players, uma radiola
antiga, um computador ligado em um programa de mixar músicas e uns 800 CDs. Sem brincadeira.
“Nossa, Leo! Nunca vi tanto CD na vida!”, eu falei, realmente horrorizada. “Como você se lembra de todos
eles?”
Ele riu, passou a mão pelos CDs, tirou um papel de uma gavetinha e me entregou. Era uma lista – em ordem
alfabética – com o nome de todos os CDs que estavam ali. Realmente ele era organizado. E apaixonado por aquele
hobby dele.
Ele estava começando a me mostrar uma coisa no computador, quando a mãe dele chegou na porta do quarto.
“Leo, depois você mostra isso pra Fani, meu filho! Vai lá lanchar! Seu irmão vai comer a torta inteira!”
Ela não precisou falar duas vezes.
Durante o lanche, o Luciano me perguntou o que eu ia fazer no Réveillon. Eu disse que não ia viajar, já que eu ia
ter que fazer uma grande viagem poucas semanas depois... quando eu ia perguntar para onde eles iriam, meu pai
ligou, falando que estava saindo do trabalho e que ia passar para me buscar. Olhei no relógio e vi que já eram
quase seis e meia. Concordei, sem a menor vontade de voltar para casa.
Terminamos de lanchar depressa, o Leo copiou numa folha os últimos exercícios que tinha criado para mim para
que eu pudesse terminar em casa, e a mãe dele falou que era pra eu voltar lá antes de viajar, em um dia em que a
gente pudesse ficar só conversando em vez de estudar.
Peguei minha mochila, me despedi do irmão e da mãe dele, e o Leo falou que ia me levar lá embaixo.
Entramos no elevador ainda conversando sobre a prova. De repente, o assunto sumiu e um silêncio constrangedor entrou no lugar. Senti o meu coração começar a disparar, olhei para o chão com medo do Leo
perceber o que estava se passando dentro de mim, subi o olhar de novo rapidinho e vi que ele estava me
reparando.
“Fani, eu queria te falar...”
Nessa hora, o elevador parou no terceiro andar. Um casal entrou com um neném em um carrinho e também uma
menininha que devia ter uns três anos. Ela falou: “Oi, Leo!”.
O Leo na mesma hora brincou com o cabelo dela, abaixou e perguntou se ela estava levando a Barbie (que
estava na mão dela) para passear. A menininha começou a conversar com ele, a mãe dela sorriu, olhou para mim e
falou: “A Claudinha adora o Leo! Ele tem o maior jeito com crianças!”.
Eu fiquei sorrindo de volta pra ela, sem falar nada, digerindo aquela nova informação e feliz por algum motivo.
Acho que por constatar que o Leo conseguia me surpreender mais e mais a cada minuto.
O elevador chegou ao térreo. Saímos, o Leo deu tchau para os vizinhos, fomos para a portaria e meu pai já
estava lá, meio impaciente, estacionado em fila dupla.
“E aí, Leozão, vai passar de ano ou não?”, meu pai perguntou, enquanto o Leo chegava na janela para
cumprimentá-lo.
“Espero que sim!”, o Leo respondeu sorrindo. “A Fani me ensinou um monte de coisas hoje, acho que vai dar pra
passar!”
Eu ia responder que não tinha ensinado nada, mas um carro começou a buzinar atrás do meu pai e ele mandou
que eu entrasse depressa.
Virei para o Leo, ele me deu um beijinho na bochecha, segurou a porta do carro para eu entrar e falou: “Até
amanhã”.
“Até amanhã...”, eu respondi decepcionada, completamente curiosa para saber o que ele não tinha me dito no
elevador...

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