Nemo: Desculpe por não ter parado a... Gill: Não, eu é que devo desculpas. Eu estava tão ansioso para
sair, para sentir aquele mar, que estava disposto a colocar você em uma situação de perigo para chegar
lá. Nada vale isso.
(Procurando Nemo)Ufa! Liguei. Ele não estava em casa. Mas conversei com a moça que atendeu (irmã ou mãe, eu suponho),
perguntei onde eu poderia encontrá-lo e ela disse que ele está viajando, foi para um congresso de Biologia! Que
alívio! E eu fazendo mil suposições desastrosas, imaginando que ele tivesse sido mandado embora, ou pedido
demissão, ou morrido, alguma coisa desse tipo!
Eu ainda estava pensando nisso, com o telefone na mão, quando ele tocou. Tomei o maior susto, por um segundo
imaginei que seria o Marquinho que tivesse chegado em casa e estivesse retornando a minha ligação, mas aí
lembrei que eu não tinha me identificado e que ele não teria como saber que era eu quem tinha ligado pra ele.
Atendi meio com raiva por alguém ter tido a ousadia de me tirar dos meus devaneios.
Era o Leo.
Eu fiquei até feliz, tinha certeza de que ele ia me explicar o motivo de estar agindo de forma tão esquisita, se
aproximando da Vanessa e tudo, mas qual não foi a minha surpresa quando ele disse: “Fani, que história é essa de
você impedir a Gabi de emprestar o prédio dela pra nossa festa?”.
Eu fiquei muda com o susto e ele continuou: “Se você está com ciúmes por eu estar ficando amigo da Vanessa,
deveria descontar em mim, e não castigar a sala inteira!”.
Eu fiquei mais chocada ainda! Só consegui dizer: “o quê?!”.
“A Vanessa só quer o melhor pra todo mundo”, ele continuou. “Você não pode deixar que a sua implicância com
ela atrapalhe as outras pessoas!”
Eu fiquei uns três segundos tentando assimilar o que estava escutando, e, quando eu ia abrir a boca pra me
defender, ele disse: “Eu quero te falar, Fani, que o fato de eu estar convivendo mais com ela não vai me fazer
gostar menos de você. Mas eu tenho que ter outras amizades, você não acha? Se você for fazer intercâmbio no ano
que vem, com quem eu vou andar? Você quer que eu fique sozinho?”.
Eu poderia ter dito que ele estava distorcendo as coisas. Que eu não estava nem aí para ele, que, por mim, ele
poderia andar com quem bem entendesse, que podia até namorar aquela ridícula da Vanessa se ele quisesse e que
eu sabia muito bem que ele devia estar repetindo tintim por tintim as palavras dela, porque eu o conheço bem
demais pra saber que ele nunca suporia uma besteira como essa de eu ter ciúmes dele, e, mesmo que supusesse,
ele nunca me diria isso em voz alta. Eu quis dizer também que ele podia escolher entre todos os alunos (ou alunas)
da escola um novo melhor amigo, porque ele é tão legal e popular que ninguém consegue não gostar dele. E eu
quis perguntar se ele estava se esquecendo da Gabi, da Natália, do Rodrigo, da Priscila, de todos aqueles que são
da nossa turminha há tanto tempo e que ele parece nem considerar como amigos, por esquecer que eles existem e
por não levar em consideração o fato de que todos eles também não gostam da Vanessa. Mais do que tudo isso, eu
quis dizer pra ele que o fato de eu fazer intercâmbio não significa que não seremos mais amigos. Que distância
nenhuma iria diminuir uma amizade como a nossa.
Mas eu não falei nada disso. Eu simplesmente desliguei o telefone. Na cara dele. As lágrimas vieram com força
total e eu só tomei o cuidado de não chorar muito alto para a minha mãe não escutar. Mas aí o telefone começou a
tocar novamente. Claro que eu não ia atender, eu preferia morrer a deixar o Leo perceber que tinha me feito
chorar. De jeito nenhum! Tenho certeza de que ele iria correndo contar pra nova amiguinha dele...
Corri para o banheiro e fiquei escutando aquele toque insistente. De repente, parou. A minha mãe começou a
me chamar, eu fingi que não estava ouvindo. Aí ela passou a me berrar, e eu me fazendo de surda. Depois de uns
15 berros, eu ouvi os passos dela e aí acho que ela percebeu que eu estava no banheiro, porque pegou o telefone
do meu quarto e falou: “Gabriela, acho que ela está tomando banho. A porta do banheiro está trancada e ela não
está me respondendo”.
Ao ouvir isso, eu abri a porta e peguei o telefone da mão da minha mãe, que me olhou primeiro com cara feia e
depois preocupada, ao notar a minha cara de choro. Eu levei o telefone (obrigada, inventor do telefone sem fio!)
pro banheiro e tranquei a porta novamente.
Nessas alturas, a Gabi já tinha desligado. Eu liguei de volta e foi só ouvir o “alô” dela que o choro recomeçou.
“Gabiiiii, o Leo brigou comiiiigo!!!! Ele deixou aquela bruxa fazer a cabeça dele e está pensando que nem ela!!
Ele não quer ser mais meu amigo!!!”
Enquanto eu tentava falar isso por entre as minhas lágrimas, a Gabi ficava o tempo todo mandando eu ter
calma, mas eu continuei: “Se ele está pensando que isso vai ficar assim, está muito enganado! Mesmo que eu não
faça intercâmbio, vou mudar de colégio no ano que vem para ficar bem longe dele! E se você quiser virar
amiguinha da Vanessa também, o que eu já saquei que é o seu maior desejo, fique à vontade! Pode emprestar seu
prédio ou o que você quiser pra ela, eu não estou nem aí!”.
Nisso a Gabi estava gritando do lado de lá, tentando falar alguma coisa, e, quando ela viu que não adiantava,
simplesmente desligou! Desligou na minha cara!! Aí é que eu chorei mesmo. Perdi dois amigos em um dia só!
A minha mãe começou a bater na porta, me mandando abrir, perguntando o que tinha acontecido, e eu só
conseguia falar: “Eu quero ficar sozinha, vá embora!”, mas ela não ia, continuava a me pedir para sair do banheiro
e aí, uns quinze minutos depois, uma voz diferente também pediu a mesma coisa. Eu parei de chorar um instante e
então reconheci a voz! Gabi!!
Levantei-me do chão (sim, eu estava sentada no chão), abri a porta correndo e a puxei pra dentro. Eu já ia
fechar a porta de novo, mas minha mãe foi mais rápida. Colocou o pé dentro do banheiro de modo que ou eu o
esmagava, ou a deixava entrar. Acho que eu não tinha escolha. Ela empurrou a porta, ficou olhando pra mim, eu
fiquei olhando pras duas e aí a choradeira veio vindo de novo e mais uma vez eu não consegui segurar.
Minha mãe fechou a porta, me abraçou, a Gabi fez a mesma coisa e ficamos nós três abraçadas no meio do
banheiro, até o meu choro diminuir um pouco. Então a minha mãe prendeu o meu cabelo em um rabo de cavalo,
molhou uma toalha e passou no meu rosto todo, eu fui me acalmando, e aí foi a Gabi que falou primeiro: “Será que
a gente podia conversar agora?”. Ao que a minha mãe emendou com um: “Será que eu posso saber o motivo do
choro primeiro?”.
Eu devo ter feito uma cara de quem ia começar de novo, porque ela de repente abriu a porta e disse: “Faz o
seguinte, vocês ficam aí trancadas e conversam o que querem conversar, e enquanto isso eu vou preparar um
lanche para nós. Aí, depois, se vocês quiserem satisfazer a minha curiosidade, eu vou ficar muito grata. Quem sabe
eu possa ajudar?”, e saiu, nos deixando sozinhas.
Eu fiquei com a cabeça baixa um tempo, aí olhei pra Gabi e ela pegou minha mão e me puxou pra fora do
banheiro. Fomos para o meu quarto, ela fechou a porta, sentou na minha cama e ficou esperando que eu falasse
alguma coisa.
Como eu não disse nada, ela começou: “Fani, o que eu estava tentando te falar ao telefone era que o Leo
também me ligou, logo depois que ligou pra você, e disse as mesmas bobeiras. Dos ciúmes com que ele acha que
você está, do fato de ter que ficar sozinho depois que você viajar e tal. Sabe o que eu fiz? Passei o maior sermão
nele!”, ela disse, com cara de brava. “Falei que ele, como suposto melhor amigo, deveria era te dar força nesse
momento, te consolar se você não passar na prova do intercâmbio ou te incentivar se você for mesmo viajar! E o
que ele está fazendo ao invés disso? Está se afastando, mudando de turma, te deixando confusa, sem suporte
emocional... falei pra ele, inclusive, que desse jeito não seria um intercâmbio que acabaria com a amizade de
vocês, e sim a atitude dele, os ciúmes DELE! Porque, se acaso você não percebeu, se tem alguém com ciúmes
nessa história, essa pessoa é o Leo! Desde que você começou a falar que tinha a possibilidade de viajar, ele está
diferente, não reparou? Morrendo de medo de você – bem longe da vista dele – arrumar outros amigos, paqueras,
namorado e esquecer que ele existe... E foi isso tudo o que eu disse pra ele e que estava querendo te explicar ao
telefone!”
Eu fiquei tentando assimilar aquilo, a Gabi tinha falado pro Leo tudo o que eu queria falar, mas ainda assim
alguma coisa estava me incomodando, e aí eu saquei que era o fato dela continuar batendo nessa tecla de que o
Leo gosta de mim; se não fosse assim por que o motivo dos ciúmes?
Eu ia abrindo a boca, mas ela falou antes.
“Fani, eu queria também te pedir desculpas pela minha atitude naquele dia, por ter oferecido o salão de festas
pra Vanessa e tal...”, ela falou sem olhar pra mim, visivelmente constrangida. “Eu acho que eu também fiquei um
pouquinho enciumada, não pelo seu intercâmbio, mas por achar que você queria realmente começar a andar com
ela e pudesse descobrir que eu não sou tão legal assim como você acha... sabe, antes de você mudar pro colégio,
eu andava meio com todo mundo e com ninguém ao mesmo tempo, não tinha uma amiga de verdade pra
compartilhar os segredos, passar bilhetinhos e fazer a aula ficar mais legal...”
Ela abaixou o olhar um pouco e continuou, completamente sem graça: “Então, antes de você aparecer, eu não
sabia o que estava perdendo, mas agora eu sei, e foi por isso que eu agi daquele jeito, não queria ficar de fora, não
queria perder sua amizade mesmo que para isso eu precisasse de me tornar amiga da Vanessa também... e é por
isso que eu entendo um pouco o Leo... acho que ele está fazendo isso inconscientemente pra te punir, pra te dar
uma lição, como se quisesse te dizer: ‘olha, você pode viajar, fazer outros amigos, mas eu também posso, tá
vendo?’”.
A Gabi tem mesmo que fazer vestibular pra Psicologia! Caramba, eu não ia pensar essas coisas nunca! Eu
simplesmente achei que os dois tivessem enlouquecido por estarem querendo andar com a Vanessa, nunca pensei
que era meu suposto intercâmbio que fosse o culpado de tudo isso!
Eu sorri pra Gabi, dei um abraço nela, e nós duas ficamos assim, até que minha mãe entrou no quarto e disse
que o lanche estava pronto. A gente foi correndo pra mesa, afinal, minha mãe fazer lanche é um evento que só
acontece uma vez na vida!
Realmente, parece que essa história de intercâmbio está mudando muita gente...
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Fazendo meu Filme
RomanceFazendo meu filme nos apresenta o fascinante universo de uma menina cheia de expectativas, que vive a dúvida entre continuar sua rotina, com seus amigos, familiares, estudos e seu inesperado novo amor, ou se aventurar em um outro país e mergulhar nu...