capitulo 21

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Jane: Tem poucas coisas mais tristes nessa vida do que ver alguém indo embora depois de te
deixar, e assistir a distância entre os seus corpos se expandir até não existir nada... além de
espaço vazio e silêncio.
(Alguém como você)

O fato é que eu não consegui pensar mais em nada depois da aula. Fui pra casa, almocei, não fiz os meus
deveres nem fui pra academia. Ao invés disso, fiquei juntando o meu nome todo com o do Marquinho, para ver
como ficariam os nomes dos nossos filhos, li o meu horóscopo e o dele, assisti a dois filmes de amorzinho no DVD,
liguei para a Gabi umas vinte vezes para ela me narrar detalhadamente a cena do final da aula (apesar de eu saber
cada minuto de cor, sempre é mais gostoso a gente escutar pela boca de outra pessoa) e eu poder ficar revivendo
aqueles sentimentos...
O dia acabou e eu não fiz nada além disso. No fim, a Gabi até pediui encarecidamente para eu deixar que ela
estudasse, já que pelo visto eu não precisava. Aí eu falei pra ela que precisava sim, mas que as provas eram só na
outra semana, que eu teria muito tempo para isso e que ela estava se preocupando antes da hora. Ela falou a
mesma coisa que minha mãe sempre fala, que estudar na véspera não adianta nada, mas eu não concordo, acho
que, quanto mais fresco o estudo está, mais fácil é de lembrar na hora da prova.
No sábado, eu acordei ainda nas nuvens, mas nem deu tempo de sonhar muito, pois fiquei o dia inteiro em um
churrasco da minha família (aniversário de uma tia-avó) em um sítio meio afastado da cidade, pros lados de
Itabirito. Chegamos tarde e eu fui dormir logo porque no dia seguinte, em pleno domingo, eu e a Gabi teríamos que
ir ao colégio para participar de um trabalho de Geografia e ganhar uns pontos extras. O trabalho não era
obrigatório, o professor – muito gente boa – é que resolveu ajudar, já que muitos alunos estavam “dependurados”,
precisando de nota. Não era o caso da gente, mas sempre é bom ganhar uns pontinhos a mais, aí fica uma matéria
a menos pra se preocupar nas provas finais.
O trabalho era bem fácil, só ficar na porta do colégio, em duplas, entrevistando pessoas que passavam, uma
espécie de censo demográfico. Apesar disso, pouca gente compareceu, talvez pelo dia lindo de sol que estava
fazendo.
Eu e a Gabi estávamos planejando acabar aquilo logo e ir para o clube, quando, de repente, nós vimos o
Marquinho descendo de um táxi, todo esportivo (bermuda e camiseta brancas, tênis cinza, boné azul-marinho).
Ele foi entrando no colégio sem nem notar a nossa presença. Eu percebi que ele estava falando ao celular e a
Gabi me cutucou. Ela fez sinal para a gente chegar mais perto, e então, com a desculpa de ir ao bebedouro,
entramos também no colégio e ficamos conversando ali pertinho dele, sem dizer nada com nada, apenas tentando
ouvir o que ele estava falando ao telefone.
Ele não reparou a gente, a princípio, de tão entretido que estava na conversa. Ele estava dizendo algo assim:
“Sim, já estou com tudo, vou te esperar aqui na frente da escola, estou saindo, você está chegando? Ótimo. Beijão,
tchau!”.
Quando ele nos viu, ficou meio sem graça, guardou o celular no bolso, perguntou o que a gente estava fazendo
no colégio em um domingo bonito daqueles. Eu, pra variar, fiquei apenas sorrindo, mas a Gabi explicou e ainda
perguntou o que ele estava fazendo ali em pleno domingo.
Ele falou que tinha ido só buscar a agenda que havia esquecido lá na sexta, pois precisava de um endereço que
estava anotado nela. Deu tchauzinho com a mão, saiu novamente do colégio, mas foi interceptado por duas colegas
nossas, que perguntaram se podiam fazer a entrevista do trabalho de Geografia com ele.
Nessas alturas, eu e a Gabi já estávamos lá fora também e ficamos atrás dele, bem pertinho, pra não perder
nenhuma palavra.
“Nome: Marco Antônio. Idade: 26 anos. Profissão: Biólogo e Professor. Estado Civil: Casado.”
A Gabi até engasgou. Eu fiquei gelada, meu coração quase parou, fiquei sem ar e, mesmo assim, notei que ele
virou, nos viu e olhou para o chão meio sem graça. Aí ele virou novamente para as meninas que o estavam
entrevistando e falou: “Olha só, estou realmente com muita pressa, vamos ter que deixar isso pra depois”.
Nesse momento – como se não bastasse o que eu tinha acabado de ouvir – parou um carro cinza na frente do
colégio com uma loura bem bonita na direção. Ela acenou para o Marquinho e ele, sem se despedir de ninguém,
entrou no carro. Ela então, sem cerimônia nenhuma, deu um beijão nele na frente de todo mundo. Na boca...
Em seguida ela arrancou, e o que sobrou de mim ficou ali, olhando para o meio da rua, até o carro deles sumir
de vista.

Fazendo meu FilmeOnde histórias criam vida. Descubra agora